A atriz Emma Mackey, de vestido, em paisagem montanhosa, em cena de 'Emily'

A atriz francesa Emma Mackey vive o papel-título em "Emily", sobre a vida da autora britânica do clássico "O morro dos ventos uivantes"

Imagem Filmes/Divulgação

Muito pouco se sabe sobre a vida de Emily Brontë (1818-1848). Assim como sua produção literária, são escassos os registros sobre a vida e a personalidade da autora de “O morro dos ventos uivantes”. Um dos poucos - e talvez mais verdadeiro - depoimento é o da irmã e também escritora britânica Charlotte Brontë (1816-1855). 

Ao assinar o prólogo de uma das edições do romance de Emily, Charlotte escreveu: “Embora seus sentimentos pelos que a cercavam fossem benevolentes, relações com eles ela nunca procurou, nem, com poucas exceções, as experimentou”.

A breve descrição de Charlotte fez com que Emily passasse para a posteridade como “exótica”, “antissocial” ou mesmo como “a mais estranha das três estranhas irmãs Brontë”, conforme escreveu o poeta Ted Hughes (1930-1998).



A escassez de detalhes acerca da biografia de Emily, no entanto, não foi empecilho para a atriz - e agora diretora - inglesa Frances O’Connor produzir um longa-metragem sobre a vida da romancista. Tendo Emma Mackey no papel da escritora, “Emily” estreia nesta quinta-feira (5/1) nos cinemas brasileiros.

Horrível e desprezível

O filme começa com os derradeiros momentos de Emily. À beira da morte precoce, aos 30 anos, vítima de tuberculose, ela precisa ouvir de Charlotte (Alexandra Dowling) que o recém-lançado “Morro dos ventos uivantes” é “um livro horrível. É desprezível, cheio de pessoas que só se preocupam com elas mesmas”, refletindo a relação conflituosa que as duas viveram.

A partir da crítica, Emily começa a recordar sua vida, e o espectador é levado aos morros descampados da pequena vila de Thornton, onde a escritora, quando jovem, costumava passar o tempo contando para si mesma histórias que lhe vinham à mente, enquanto observava o movimento da vila.

A chegada do pastor William Weightman (Oliver Jackson-Cohen) para ajudar o pai de Emily a gerir a igreja local faz com que a moça rapidamente revele sua inteligência e perspicácia, sobretudo para contestar os sermões de Weightman e tentar comprovar a hipocrisia do religioso.

“Qualquer um pode falar. Quero ver se ele é capaz de fazer”, ela diz, em certa ocasião para as irmãs, entusiasmadas com a eloquência do novo pároco.

Aos poucos, a resistência vai dando lugar à atração, que logo se torna paixão e, finalmente, amor. Paralelamente a esse turbilhão de sentimentos, Emily é incentivada pelo irmão, o pintor e poeta Branwell Brontë (Fionn Whitehead), a colocar todos esses sentimentos no papel.

Ficção

Embora Frances O’Connor tenha tomado a liberdade de inserir elementos e situações que não correspondem fielmente à realidade (não há registros de que Weightman tenha existido e, no filme, Emily acompanha a recepção bem-sucedida de “Morro dos ventos uivantes”, o que não ocorreu na vida real), a diretora não deixou de lado algumas das características associadas à romancista ao longo da história.

Observadora, calada a maior parte do tempo e andando sempre um passo atrás das irmãs Charlotte e Anne (Amelia Gething), Emily confirma sua personalidade antissocial em diferentes momentos, um deles quando afirma a uma das irmãs não gostar de conhecer gente nova.

No vilarejo, Emily é conhecida como “a estranha”. Até mesmo seu affair, o reverendo Weightman, destaca isso quando diz que ela é incapaz de perceber o que acontece no mundo por passar “a maior parte do seu tempo olhando para os próprios pés”.

Diante de tanta hostilidade - e, em alguns momentos, até certa dose de crueldade por parte dos personagens que convivem com ela -, a jovem escritora encontra consolo e alívio na figura do irmão.

Fama de estranha

Vivendo bêbado nos bares e se drogando com ópio, Branwell seria uma das últimas pessoas a quem qualquer um que sofre recorreria. No entanto, é dele que vêm os conselhos mais sóbrios para Emily. Quando a jovem, completamente abalada por descobrir que o vilarejo a conhecia como “estranha”, pergunta se há algo de errado com ela, o rapaz responde: “Todos são estranhos se você olhar por tempo suficiente”.

Não há indícios de que tal relação entre os irmãos realmente tenha ocorrido da forma como foi tratada no filme. No entanto, “Emily”, não chega aos cinemas com o intuito de criar uma documentação fidedigna da vida de Emily Brontë, e sim ressaltar o protagonismo feminino - a autonomia das mulheres para tomar decisões sem depender das convenções sociais - e romper com a ideia de que, para uma escritora conceber uma obra de mérito, é necessário suportar uma vida de sofrimentos.

Para isso, O'Connor não precisou recorrer a artifícios extravagantes na linguagem cinematográfica. A câmera estabilizada, as cores frias nos momentos melancólicos e quentes nas situações mais leves, e a trilha com canções que remetem às obras clássicas da época em que o filme é ambientado deixam evidente que a mensagem é que deve sobressair.

“EMILY”
(Reino Unido/EUA, 2022, 130min, de Frances O’Connor, com Emma Mackey, Oliver Jackson-Cohen, Fionn Whitehead e Alexandra Dowling). Classificação indicativa: 14 anos. Estreia nesta quinta-feira (5/1) no UNA Cine Belas Artes (13h50 e 18h10, no Cine Ponteio (18h20 e 20h40; a partir de 10/1 o horário passa a ser 16h30); e no Cinemark Pátio Savassi (14h50, 17h40 e 20h40).