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Estado de Minas DE PERNAMBUCO PARA O MUNDO

Exposição celebra legado de Ariano Suassuna e 50 anos do Movimento Armorial

CCBB recebe mostra com obras do autor do 'Auto da Compadecida', de Francisco Brennand e de Samico, destacando a estética que juntou erudito e popular


22/12/2021 00:40 - atualizado 22/12/2021 07:01

Escultura da Onça Caetana, com corpo amarelo, quatro patas e asas pretas, personagem de Ariano Suassuna
Onça Caetana, personagem de Ariano Suassuna, recepciona os visitantes no Centro Cultural Banco do Brasil (foto: ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A PRESS)

Movimento Armorial pretende realizar uma arte brasileira erudita a partir das raízes populares da nossa cultura.” Ariano Suassuna (1927-2014) publicou, em 1974, o texto com a base teórica do movimento que havia lançado quatro anos antes no Recife, durante o concerto “Três séculos de música nordestina – do Barroco ao Armorial”. Já naquele evento, realizado na Igreja de São Pedro dos Clérigos, ele promovia a interação: o encontro não era só de música, mas também artes plásticas e literatura.

“Ariano era uma pessoa séria, mas sempre manteve a leveza. Este mundo tão polarizado é completamente diferente da proposta dele, que sempre quis juntar o erudito e o popular, nunca fazer a separação”, afirma Denise Mattar, curadora da exposição “Movimento Armorial 50 anos”, que será aberta nesta quarta-feira (22/12), no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em Belo Horizonte.

A curadora Denise Mattar está ao centro da sala do CCBB-BH cercada de banners alusivos ao movimento armorial, ao alto
A curadora Denise Mattar diz que legado de Ariano Suassuna vai de encontro à polarização do mundo contemporâneo (foto: ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A PRESS)

TRAJETÓRIAS 

A mostra percorre tanto a trajetória do dramaturgo, romancista, poeta, professor e advogado paraibano quanto dos artistas de diferentes expressões que, como ele, compartilharam da ideia de um Brasil que pudesse olhar (e se orgulhar) de si mesmo. Como o mestre defendia, a exposição, para além das artes plásticas, terá extensão na música e na literatura, com uma série de eventos no próprio CCBB.

A exposição, prevista para 2020 com o objetivo de celebrar o cinquentenário do movimento, foi adiada em decorrência da pandemia e acabou se tornando cartão de boas-vindas para 2022. É colorida, leve, lúdica e, ao mesmo tempo, mantém a densidade de tudo o que seu criador preconizava.

Um personagem recorrente na obra dele recebe o visitante no terceiro andar do prédio. Desenhada pelo próprio Ariano, a onça Caetana, de grandes dimensões, confeccionada pelo bonequeiro mineiro Agnaldo Pinho para a mostra, ocupa a entrada.

A partir da primeira sala, somos apresentados aos quatro núcleos expositivos, que tiveram como consultores o artista plástico Manuel Dantas Suassuna, filho de Ariano, e o escritor e professor Carlos Newton Júnior, especialista em sua obra.

"Fiquei pensando como incluiria o Brennand. Ele e Ariano eram amicíssimos, e o Brennand, muito debochado, dizia que não era armorial, mas sexual"

Denise Mattar, curadora



O primeiro núcleo, “Ariano Suassuna, vida e obra”, destaca a cronologia, livros e manuscritos do autor. Traz ainda uma seção com bancos para que o público possa assistir aos trechos de suas conhecidas aulas-espetáculo.

Destaca-se ainda o alfabeto sertanejo, que Ariano criou a partir de pesquisa sobre os ferros do Cariri. “É interessante, porque o ferro de marcar (gado) é marca de posse e ele transforma isso em marca de autoria”, comenta Denise Mattar.

Com véu azul e túnica colorida, figurino original usado por Regina Duarte no filme 'A compadecida'
Francisco Brennand desenhou o figurino usado por Regina Duarte no filme 'A Compadecida', lançado em 1969 (foto: ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A PRESS)

O segundo núcleo, “Armorial fase experimental”, mergulha no ambiente cultural de 50 anos atrás, destacando artistas que estiveram na primeira fase. “Ariano falava que o Armorial existia antes do movimento”, acrescenta a curadora.

Esta seção reúne trabalhos de autores muito conhecidos. Os três instrumentos do movimento – a rabeca, a viola nordestina e o pífano – são apresentados em uma pauta desenhada pelo próprio Ariano. Vale lembrar que ele se apresentava, na época, ao lado da Orquestra Armorial e, posteriormente, do Quinteto Armorial. Suas performances acabaram sendo a gênese das aulas-espetáculo que executou a partir dos anos 1990.

A seção traz à luz vertentes menos conhecidas de dois grandes artistas pernambucanos muito próximos a Ariano: Samico (1928-2013) e Francisco Brennand (1927-2019). “Samico foi muito importante dentro do Armorial, pois ele já era (adepto, antes de o movimento ser lançado) e continuou sendo por toda a carreira”, afirma Denise Mattar.

A mostra reúne suas conhecidas gravuras, como também pinturas. “Samico dizia que só gostavam das gravuras dele, que ninguém falava das pinturas”, diz Denise. É interessante, porque ela conseguiu reunir gravuras que têm versões em pinturas – todas expostas lado a lado. “Pode-se dizer que é uma apresentação do Samico completamente inédita.”

Uma grande sala do CCBB destaca a obra mais popular de Ariano, “Auto da Compadecida” (1955). “Fiquei pensando como incluiria o Brennand. Ele e Ariano eram amicíssimos, e o Brennand, muito debochado, dizia que não era armorial, mas sexual”, conta Denise.

Em 1968, o artista desenhou os 48 figurinos que comporiam a primeira versão cinematográfica da história, “A Compadecida” (1969).

Dirigido por George Jonas e com Antônio Fagundes e Armando Bogus como Chicó e João Grilo, respectivamente, o filme foi rodado em Brejo da Madre de Deus, Pernambuco. A arquiteta Lina Bo Bardi foi a cenógrafa do longa, que utilizou os moradores locais como figurantes.

Além de apresentar os desenhos feitos por Brennand, essa seção destaca alguns figurinos. O de Nossa Senhora (a Compadecida, papel de Regina Duarte) é o único original. Os demais foram recriados a partir dos desenhos e do próprio filme, cujo trecho é transmitido na exposição.

AUTOBIOGRAFIA

O terceiro módulo da exposição, dedicado à segunda fase do movimento, destaca o Ariano artista plástico. A seção reúne iluminogravuras que ele criou na década de 1980 – as telas acabam formando uma autobiografia poética do autor.

Os dois conjuntos apresentados, de 1980 e 1985, foram reunidos pela curadoria por meio de cessões de colecionadores particulares. Há ainda três pinturas, as únicas feitas por Ariano, produzidas para um hotel criado nos anos 1980, no Recife.

O módulo ainda lança luzes sobre outros aspectos da trajetória de Ariano: gravura, cerâmica e tapeçaria de sua mulher, a artista Zélia Suassuna; imagens de diferentes “ilumiaras” – “ele cria esse conceito de um lugar mágico, espaço magnético, imantado, a partir de reinterpretações da Pedra do Ingá (monumento arqueológico em Ingá, no interior da Paraíba)”, explica a curadora –, além do trabalho do Balé Grial, que ele criou com a bailarina e coreógrafa Maria Paula Costa Rêgo.

Uma sala exibe adaptações para o cinema e a televisão de obras como “Farsa da boa preguiça”, “A pedra do reino” e o popular “O auto da Compadecida”, série e filme dirigidos por Guel Arraes.

Finalizando a exposição, a seção “Armorial – Referências” traz xilogravuras de mestres como J. Borges e Dila; a Cidade do Cordel, criada para a mostra por Pablo Borges, filho de J. Borges, e também figurinos de festas populares, como cavalo- marinho, reisado e o caboclo de lança, uma das principais figuras do maracatu.

MOVIMENTO ARMORIAL 50 ANOS

Abertura nesta quarta-feira (22/12), no Centro Cultural Banco do Brasil, Praça da Liberdade, 450, Funcionários, (31) 3431-9400. Visitação de quarta a segunda-feira, das 10h às 22h. Entrada franca. Ingressos devem ser retirados no site bb.com.br/cultura. Até 7 de março

Pintura mostra São Jorge montado no cavalo com sua lança na boca do dragão, deitado sob as patas do animal
Quadro de Miguel dos Santos: pinturas têm destaque no Movimento Armorial (foto: ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A PRESS)

Agenda presencial em janeiro

De 12 de janeiro a 25 de fevereiro, o CCBB vai receber apresentações musicais e eventos literários de artistas que têm conexão com o Movimento Armorial.

Serão 10 encontros, cinco dedicados a cada área. A música tem como curador Antônio Madureira, integrante seminal do movimento, arranjador e condutor da Orquestra Armorial. Entre as atrações, que estarão em cartaz no teatro da instituição, está Antônio Nóbrega em “Um recital para Ariano” (20 de janeiro).

Com curadoria de Carlos Newton Júnior, as “Conversas sobre a arte armorial” serão encontros, de 14 a 22 de janeiro, com pensadores e artistas que discutirão a interseção das artes no movimento.

Os debates abordarão literatura (com os críticos e ensaístas Alexei Bueno e André Seffrin), artes visuais (com Manuel Dantas Suassuna e o crítico Weydson Barros Leal), teatro (com o escritor, dramaturgo e compositor Bráulio Tavares e a atriz e diretora Inez Viana), música (com Nóbrega e a cantora Isaar França) e dança (com a bailarina e coreógrafa Maria Paula Costa Rêgo e o brincante e bailarino Pedro Salustiano, que participou de várias aulas-espetáculo de Ariano).


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