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Estado de Minas LITERATURA

Sonho, pesadelo e mistério em 'Os planos', novo livro de Carlos Marcelo

No segundo romance, jornalista e escritor mistura drama e suspense ao narrar a história de cinco amigos de Brasília que se envolvem em plano para matar senador


31/08/2021 04:00 - atualizado 31/08/2021 21:29

Carlos Marcelo diz que o livro de Fernando Bonassi ''é um longo desabafo para o pai, que é o país''
Carlos Marcelo diz que o livro de Fernando Bonassi ''é um longo desabafo para o pai, que é o país'' (foto: Divulgação)

Carlos Marcelo, de 50 anos, e Fernando Bonassi, de 58, acertaram ao romper a regra do distanciamento para falar do Brasil urgente, contemporâneo. “Os planos” (Letramento), lançado esta semana, e “Degeneração” (Record), que chegou às livrarias em junho, são romances de geração. Revelam o profundo desalento, a desilusão e o impasse de personagens que foram jovens durante a redemocratização, sonharam com um país justo e colheram o fracasso. O livro de Carlos se passa durante o governo Temer. O de Bonassi, no dia anterior à eleição de Jair Bolsonaro à Presidência da República.
 

Sonho e pesadelo em Brasília

Em “Os planos”, cinco amigos, às voltas com um trauma do passado, compartilham a frustração dos sonhos de adolescência. Amavam Deep Purple, Som Imaginário e Lynyrd Skynyrd, mas a banda deles mal passou da garagem, enquanto Renatinho, o amigo da Cultura Inglesa, ouvia os punks e construía a poesia que fez dele porta-voz da juventude. Sim, o líder da Legião Urbana aparece nas páginas, mas como coadjuvante de luxo, diz Carlos Marcelo, que em 2009 lançou a biografia “Renato Russo: O filho da revolução”.

Ideias para o novo livro, aliás, surgiram quando Carlos entrevistou contemporâneos do músico para a biografia. Muitos deles nostálgicos da banda que poderia ter vingado, do mundo que poderiam ter construído. Renato faz só uma “ponta”, mas sua poesia libertária é contraponto ao desencanto dos protagonistas de “Os planos”, definido pelo jornalista Arthur Dapieve, no prefácio, como “um romance musical, político e geracional”. É o segundo romance do escritor. A estreia, “Presos no paraíso”, foi lançada no Brasil em 2017 e na França em 2019 pela editora Gallimard.

CINISMO 

Rugas, cabelos brancos, flacidez, amarga nostalgia e boa dose de cinismo foi o que restou ao suplente de senador Duílio, ao delegado Rangel, ao aposentado quase falido Hélio Pires, à ex-doidona Diana e a Tide, produtor musical apaixonado por Lps. Todos têm contas a prestar.

No Brasil de Michel Temer, o vice que virou presidente, sob holofotes onipresentes da Lava-Jato, o quinteto agora sonha em não acordar com a Polícia Federal batendo à porta. Os rapazes que amavam Gentle Giant e formaram a banda Plano Alto estão metidos em corrupção, assassinato, licitações suspeitas.

Mistério e suspense seguram o leitor até o fim, mas Carlos Marcelo diz que não escreveu um romance policial clássico. “Acho que é mais um drama policial”, afirma. Na verdade, trata-se de um livro sobre o fracasso. Aquela geração busca traçar seu caminho, já bem distante dos sonhos de juventude. Cada um  tem a sua meta, mas todos os planos se embaralham, surpreendendo ao final.

“A política pode ser o estopim para sentimentos como cobiça, tentação, desejo, disputa, traição. Infelizmente, a política no Brasil aguça esses sentimentos”, comenta Carlos. “O Brasil vive a sensação de impunidade generalizada, as pessoas se permitem atos extremos”, diz ele ao falar de seus personagens.

No primeiro momento, o quinteto protagonista domina as páginas; na segunda parte, coadjuvantes conquistam seu espaço, são contraponto à turma de coroas. A estagiária de jornalismo Djennifer e a bióloga Janine não se submetem ao machismo que abateu Diana. Denizard, o colunista, ainda tenta exercitar o faro jornalístico.

“Os planos” traz muito do repórter Carlos Marcelo, diretor de Redação do Estado de Minas. Esse paraibano que chegou a Brasília aos 15 anos ainda guarda o olhar de certo estranhamento – e fascínio – pela cidade. Aliás, ela é o sexto elemento do quinteto, com seu clima inóspito, o poeirão das cidades-satélites e tanta gente à margem do poder.

O destino daquela primeira geração de adolescentes de Brasília e a trama de “Os planos” não deixam de refletir o desastre ecológico causado pela violenta intervenção imposta ao cerrado pela construção da capital. “A natureza reagiu àquele experimento artificial”, comenta o autor. Os personagens mais parecem “experimentos” desta democracia à beira do colapso.

“Mas não importa/ Não faz mal/ Você ainda pensa/E é melhor do que nada/ Tudo que você consegue ser/ Ou nada”, diz a canção “Tudo que você podia ser”. Citada no livro, ela serve bem como a metáfora de Duílio, Rangel, Diana, Tide e Hélio.

Aliás, a música foi essencial para a escrita deste livro, diz Carlos. Há, mesmo, o lado A e o lado B da trama, como os velhos LPs adorados pelo escritor e jornalista. Ao final, o leitor tem à disposição uma playlist, que vai de Clube da Esquina a Carole King, Erasmo Carlos, Rita Lee, Steely Dan, Fleetwood Mac, Belchior, Os Mutantes e Neil Young, entre outros. Só faltou Renato Russo...


“OS PLANOS”

Carlos Marcelo
Letramento
286 páginas


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