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Estado de Minas

Genival Lacerda foi um intérprete versátil, muito além do personagem

Com a receita de 'música, alegria, humorismo', o Rei da Munganga foi um dos artistas que mais fez o povo brasileiro feliz


07/01/2021 16:41 - atualizado 07/01/2021 17:03

Genival Lacerda morreu aos 89 anos, de complicações da COVID-19(foto: Rafael Barreto/Divulgação)
Genival Lacerda morreu aos 89 anos, de complicações da COVID-19 (foto: Rafael Barreto/Divulgação)

Chapéu coco, camisas coloridas, sandálias sob encomenda, lenço no pescoço, calça bem engomada, sorriso largo, olhar malicioso, a pança, a dança. Com a interpretação maliciosa para a Severina Xique-Xique criada pelo compositor João Gonçalves, Genival Lacerda conquistou popularidade no Brasil nos anos 1970.

 

Era presença constante em programas de auditório da tevê, em shows em praças públicas, na programação das rádios AM. Mas o talento do cantor ia muito além do personagem que criou para divulgar suas músicas. Intérprete versátil – além das variações do forró (baião, xote, rojão), gravou sambas e choros –, imprimiu marca pessoal nas letras dos parceiros.

 

“O meu suingue, o meu balanço, o meu jogo de cena, a criatividade é minha. Sempre criei as minhas coisas, sempre fiz do meu jeito”, dizia. Era um “homem-espetáculo”, como definiu o produtor João Borges em disco que Genival lançou em 1969, destacando a capacidade do cantor de “conquistar facilmente qualquer plateia, onde quer que esteja”.

 

Concunhado de Jackson do Pandeiro, Genival contava que aprendeu muito observando os ensaios de Sebastiana na casa de sua família, em Campina Grande (PB) e chegou a gravar, nos anos 1990, um álbum com o repertório do ritmista. Filiada a Jackson, a ginga de Genival o fazia cantar cada estrofe de uma forma diferente, cada refrão de uma maneira surpreendente.

 

Nas repetições da frase “É na boutique dela” das mais de 30 regravações de Severina, por exemplo, sempre havia um toque pessoal, um “caco”, um sorriso maroto. Ele dizia que suas músicas tinham um duplo sentido sadio, não ofendiam a opinião pública. “Quem faz pornoxaxado é a mãe!”, esbrajevava.

 

Obstinado, Genival escutou muitas negativas no início da carreira. Perambulou por estúdios de rádios de Pernambuco e escritórios de gravadoras do Rio de Janeiro por mais de dez anos, em busca de uma oportunidade. No começo dos anos 1970, um executivo do mercado fonográfico chegou a dizer que não contrataria “Seu Vavá” (apelido do cantor) porque um “sujeito barrigudo e feio” iria envergonhar a gravadora. Genival não se abateu.

 

Além de Severina Xique-Xique, conseguiu outros sucessos radiofônicos (Radinho de pilha, Quem dera, Mate o véio mate, O homem que tinha três pontinhos) e se aventurou fora da música. Lançou um disco de piadas com o ator paraense Lúcio Mauro, que o chamava de “o geniozinho da alegria da música nordestina, um comediante sem professor”. Na capa deste LP, uma definição que ajuda a resumir a carreira do “Rei da Munganga”, uma de suas alcunhas: “Música, alegria, humorismo.”

 

“Quem é que não sente saudade do tempo que foi tão feliz?”, cantou Genival, em um de seus sucessos. Quem dera que o Brasil valorizasse devidamente a trajetória de um dos intérpretes que mais fez o povo feliz. E que conseguiu fazer na vida o que cantou, no final dos anos 1960, quando ainda não havia conhecido a Severina que mudaria a sua história: “Sou cantor famoso/ Meu diploma é o gogó/ Eu encaro o sanfoneiro/ Sou o dono do forró.”

 

*Carlos Marcelo é jornalista e autor, com Rosualdo Rodrigues, do livro O fole roncou! Uma história do forró (Zahar, 2012) 

 

 

 


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