(none) || (none)
Publicidade

Estado de Minas Distúrbios emocionais

Efeitos da pandemia na saúde mental

Distanciamento social prolongado, suspensão de atividades cotidianas, medo, perdas, desemprego e insegurança provocados pelo vírus são preocupantes


01/05/2022 09:00 - atualizado 01/05/2022 19:32

Ilustração
(foto: Pixabay)

Era um dia letivo normal, após a volta presencial das aulas na Escola de Referência em Ensino Médio Egeu Magalhães, localizada no Bairro Tamarineira, Zona Norte de Recife, Pernambuco.

Por volta das 15h30, após uma refeição, 26 alunos começaram a entrar em pânico, apresentando sintomas de ansiedade. Um a um, foram deitando no chão das salas, suando muito e apresentando tremores. Alguns chegaram a desmaiar. Todos choravam e tinham dificuldade para respirar.
 
A situação saiu totalmente do controle. A direção da escola precisou acionar o Serviço de Atendimento Médico de Urgência (Samu), que enviou ao local seis ambulâncias, entre elas uma UTI, e duas motos para atendimento prioritário. A Prefeitura do Recife informou que foi necessário mobilizar 16 profissionais para dar conta de tantos atendimentos simultâneos.
 
As consequências da pandemia na saúde mental são evidentes, mas não devem ser generalizadas. São quadros recorrentes de cansaço, esgotamento físico, mental, sentimento de desmotivação, de desesperança, podendo levar a desgaste, resultando em ansiedade e depressão.

Também é visível que pessoas que tiveram dificuldades no distanciamento encontrem barreiras pra reverter situações advindas do isolamento. São comportamentos observados por setores de assistência, em especial da saúde mental.
 
Alguns acreditam que vamos ainda nos surpreender com estatísticas mais severas que as disponíveis sobre 2020 e 2021. É preciso esperar mais tempo de estudos para saber a evolução dessas consequências. Por outro lado, a capacidade humana de adaptação é surpreendente, após avanços na imunização, com volta gradual de atividades diante de números relativamente mais baixos de casos.
 
Pesquisa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) constatou que os índices de depressão, ansiedade e estresse aumentaram durante a pandemia, assim como o número de pessoas que relataram sintomas relacionados a essas patologias.
 
A Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) também fez alertas sobre o aumento nos fatores de riscos de suicídios. Sem a possibilidade de mudar de ambiente para amenizar o estresse e, por vezes, até mesmo de adaptar a rotina a algo que ofereça satisfação real, as vulnerabilidades emocionais das pessoas aparecem. Os medos, as angústias e a raiva são comuns.
 
O número de casais que oficializaram a separação em cartórios bateu recorde em 2021. Levantamento do CNB (Colégio Notarial do Brasil) mostra que foram registrados 77.112 divórcios consensuais no ano passado. Os pedidos de divórcio apresentaram em 2021 aumento de 266 casos em relação ao primeiro ano da crise sanitária, em 2020, que teve 76.846 dissoluções matrimoniais formalizadas, o número é o maior da série histórica, desde 2007. Há dois anos, antes da pandemia, 75.033 casais oficializaram a separação.
 
Relatório parcial de um estudo realizado pela Fiocruz com mais de 800 profissionais de saúde, revelam que 65% apresentaram sintomas de estresse, sendo 33,8% classificados extremamente severos, 61,6% de ansiedade, 61,5% depressão.

Os dados sugerem que 1/3 de quem teve COVID-19 apresentou algum tipo de sequela, como transtorno neurológico ou mental. Com agravante para quem já tinha alguma manifestação preexistente e interrompeu o tratamento, ou por medo de expor em ambientes públicos ou porque ficou o serviço indisponível.

ACIRRAMENTO


Há um conjunto de aspectos sociais decorrentes da própria pandemia, mas também aspectos consequentes aos processos do seu enfrentamento. A partir da percepção em consultório particular, a psiquiatra Ana Marta Lobosque, que atuou na rede pública de saúde mental em Belo Horizonte por mais de 30 anos, adverte que sintomas atribuídos à pandemia não podem ser generalizados.

Mas pode-se perceber o acirramento entre algumas pessoas, dos dois sexos, com mais frequência entre os homens, adolescentes e adultos jovens, que já tinham dificuldade no âmbito do convívio social, nas amizades, namoros, escola. "São coisas já difíceis para essa faixa, encarar os embaraços, as brincadeiras, as críticas, que a convivência com as pessoas os coloca, principalmente com os pares da mesma idade."
 
Alguns desses perfis acabaram por cair "dentro do computador", capturados pela internet, jogos, redes de WhatsApp. Pessoas que não têm amigos, ou se afastaram dos poucos que tinham. Totalmente embalados numa sociabilidade pela rede social.

"Que é uma forma de sociabilidade, mas me parece insuficiente para vida que tem que ser vivida, para os desafios a serem enfrentados, pelo fato de que esses jovens têm ainda que estudar, encontrar uma forma de ganhar a vida, de sustento."
 
A psiquiatra esclarece que a pandemia não causou novas formas de sofrimento mental, novos diagnósticos, uma doença que vai ter um nome. "Não acho que sejam causas inesperadas, são coisas previsíveis. A dificuldade de conviver sempre é um desafio. Mas quando a pandemia nos obriga a ficar em casa, defendendo nossas vidas, é lógico que cria dificuldades, ficar trancado dentro de casa, às voltas só com coisas de sua cabeça. São questões familiares que se repetem muito. Remexendo as mesmas questões, conflitos entre filhos e pais, mulheres e maridos."
 
Um sofrimento acoplado à internet, que também apresenta um outro lado, a possibilidade de, mesmo impedido do contato físico, estar conversando com outras pessoas, porém criando uma ilusão de que a sociabilidade só existe em grupos de WhatsApp. "O isolamento da pandemia não criou nada que já não estivesse lá. Não é causa de nada, apenas trouxe à luz alguma dificuldade já existente", esclarece.
 
Por trás disso tudo, a emoção mais relevante é o medo. De adoecer, de morrer, de perder entes queridos. Intensificado pelo fato de ter perdido alguém ou ficar sabendo de pessoas morrendo, mesmo distantes, de perder emprego, ficar em situação de vulnerabilidade. Não conseguir planejar, de lidar com isolamento, não ter notícias de pessoas próximas.

"Quando o medo atinge níveis muito altos, passa a gerar quadros de ansiedade muito graves, levando a pessoa a certa paralisação. O medo até certo grau causa reação, em grande intensidade pode provocar paralisação", explica a psicóloga Vânia de Morais.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)