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Estado de Minas SUELI VASCONCELOS

O trabalho não é mais um rio longo e silencioso

A evolução das profissões tecnológicas, a facilidade de mudanças da era digital e a fragmentação dos empregos são os novos cenários no mundo do trabalho


01/05/2023 08:49 - atualizado 01/05/2023 09:03
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Data é marcada por protestos em todo o mundo
Data é marcada por protestos em todo o mundo (foto: Reprodução/Wikimedia commons)
Vivemos na era da fragmentação: fragmentamos relações pessoais; o tempo e o trabalho não seriam diferentes. A ideia do emprego vitalício, em que se projetava o futuro da geração X (nascidos entre 1960 a 1981) muda radicalmente no contexto das gerações Y ou millennials (nascidos entre 1982 a 1994) e Z ou pós-millennials (nascidos entre 1995 a 2010).

Para a geração X, que viveu o período que se seguiu à Segunda Grande Guerra, a segurança do emprego era a busca mais constante, sem muitos idealismos. Sobreviver aos tempos difíceis da reconstrução global pós-guerra, definiu muito da postura adotada a partir de meados do Século XX.

São trabalhadores que têm, entre outras características, o respeito ao quadro hierárquico tradicional e tendem a ser fiéis, permanecendo por longo tempo, às vezes por toda uma vida, em uma mesma empresa. É um grupo que deseja ser reconhecido pelo empregador pelo seu justo valor.

A exigência, o rigor e o esforço são palavras de ordem que os caracterizam, em um momento histórico em que a “força de trabalho” era mais recrutada que a qualificação nas tecnologias digitais dos tempos atuais.
Hoje, as habilidades tecnológicas determinam muito a permanência no emprego.

Os millennial, os nativos digitais, são os mais afetados por essa exigência. Entre eles, é comum a mudança de trabalho ao longo de um ano devido a essa dependência tecnológica e à própria postura perante o emprego.

Os workaholic do passado foram substituídos por um grupo mais narcisista e mimado, que anseia empregos bem sucedidos e qualidade de vida imediatos. Nem sempre isso é alcançado sem muito esforço, e eles não parecem tão dispostos a dedicar tanto só em nome da realização profissional, se isso não for acompanhado de um prazer associado.

Um aspecto marcante dessa geração é ser mais egocêntrica, estruturada, de acordo com muitos estudos, nos princípios do eu-eu-eu. Isso é considerado como uma das causas da efemeridade atual do mundo do trabalho. Eles são chamados de individualistas, socialmente conscientes, criativos, estressados, diversos e autênticos e, até 2025, eles representarão quase 30% da força de trabalho global.

Muitos buscam, na tentativa de conciliar seus desejos, maior flexibilidade e mobilidade na profissão para atingirem as metas de sucesso e bem-estar. Daí surgem os “Slashers”. O termo foi cunhado, em 2007, pela jornalista Marci Alboher, em um artigo no New York Times, para se referir à versatilidade do trabalho.

Corresponde a um grupo de jovens adultos, com idade entre 20 e 35 anos, que se distinguem, geralmente, por um alto nível de escolaridade e trabalham de forma independente, em múltiplas profissões ao mesmo tempo, diferentemente da geração anterior, mais aprisionada a uma única modalidade de trabalho.

Em comparação com os antecessores, esse grupo de indivíduos viajou mais e foi mais exposto a várias escolhas de vida e carreira. Graças à internet, ficou mais fácil fazer malabarismo com mais de um trabalho. Portanto, em vez de se concentrar em um emprego fixo para pagar as contas, eles esperam uma oportunidade, não apenas para atender as suas necessidades financeiras, mas também espirituais.

Todavia há aqueles que, devido aos baixos salários, menor qualificação e às incertezas dos trabalhos virtuais, desenvolvem sistemas variados para fugir das crises e se entregam a diversas funções. Criam dessa forma a escolha da pluriatividade por necessidade e não apenas por opção, como era o caso, originalmente.

A uberização crescente é uma demonstração dessa realidade. É o trabalhador just-in-time. No Brasil, em 2019, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), eram mais de 3,8 milhões de pessoas cuja renda dependia dos aplicativos.

É importante ressaltar que a qualificação para a função nem sempre implica longevidade do emprego. Bons profissionais são demitidos, em diversas áreas, para reduzir custos empresariais ou para que o empregador ajuste a folha de pagamento às novas realidades tecnológicas, menos onerosas e mais lucrativas. É o capitalismo, amargo na sua essência.

Outra constatação é que os mais jovens, pertencentes à geração Z, são os mais afetados pelo desemprego. Nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), segundo dados do Fórum Econômico Mundial, a taxa é quase duas vezes superior, em comparação com os demais grupos etários.

E o momento atual para essa geração trabalhadora, mais nova, não poderia ser pior. Esse grupo está começando a se formar nas faculdades, ou ainda concluindo o Ensino Médio, para depois dar início à procura por trabalhos e carreiras. Vai encontrar muitos desafios e obstáculos nesse percurso, englobado pela indústria 4.0 e todo aparato de tecnologias, que avançam em ritmo alucinante, substituindo, cada vez mais, a mão de obra.

O desemprego que atualmente afeta essa geração pode deixar cicatrizes complexas adiante. Os longos períodos sem trabalho, em uma fase em que, geralmente, ganham experiências e treinamento, poderá afetá-los por toda a vida, porque, sem esses requisitos, a capacidade de crescer na carreira pode ser muito reduzida.

Aumentam-se também os riscos de aceitarem empregos com salários mais baixos, o que os coloca
em um caminho de ganhos comparativamente menores no futuro.

Mas há pontos positivos para essa geração: são mais favoráveis à estabilidade no trabalho (menos exigentes com as funções, obrigatoriamente, apaixonantes de antes) e mais conscientes financeiramente do que outros (nos países desenvolvidos, eram crianças durante a crise de 2008, vivenciaram as dificuldades familiares e se tornaram mais cautelosos); é a primeira geração digital - crescerem sem qualquer memória de um tempo antes da internet- e isso pode significar que são pioneiros em carreiras
independentemente da localização, por isso podem criar outros fluxos de receita e novas maneiras de definir o trabalho. O amanhã dirá como vão se safar das adversidades.

No dia de hoje, 01 de maio, há 137 anos, ocorria em Chicago, nos Estados Unidos, uma greve generalizada, com mais de 400 mil servidores que exigiam jornada de 8 horas de trabalho. A forte resistência dos patrões prolonga o movimento. No dia 3 de maio, as tensões aumentam em frente às fábricas. A polícia ataca a multidão e o exército intervém, causando 6 mortes e muitos feridos. No dia seguinte, uma bomba foi
detonada (autor desconhecido), matando policiais e civis.

O evento inspirou, no dia 01 de maio de 1890, um encontro da Internacional Socialista, em Paris, quando adotaram a data como o feriado em homenagem aos direitos dos trabalhadores, agora conhecido como Dia Internacional do Trabalhador, comemorado em muitos países. Nos EUA, distintamente, a data é festejada na primeira segunda-feira de setembro.

Os trabalhadores daqueles tempos, mulheres e homens, exigiam uma tripla demanda: 8 horas de trabalho, 8 horas de sono, 8 horas de lazer. Hoje, não há muito o que celebrar. Um número crescente trabalhadores não têm 8 horas de sono tranquilas, nem 8 horas lazer, pois não possuem 8 horas de trabalho asseguradas.

O desemprego e as incertezas não alimentam os festejos. O rio longo e silencioso do passado está turbulento e amedrontador. Não se regozija com o medo.

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