(none) || (none)
Publicidade

Estado de Minas GEOPOLÍTICA

Um mundo político fragmentado

A multiplicação do número de estados é um notável processo de transformação da rede política global que não deixa ninguém diferente e tende a preocupar


21/03/2022 06:00

Tanques russos na Ucrânia
'Atualmente, aguardamos uma postura mais incisiva do Ocidente na invasão da Rússia contra a Ucrânia, mas não há posicionamento claro quanto a um apoio armado direto aos ucranianos' (foto: Daniel Leal/AFP)

Depois do desaparecimento da União Soviética, em 1991, o mundo bipolar cedeu lugar à dominação do Ocidente, principalmente, dos Estados Unidos. Porém a "Nova Ordem Mundial" dos anos de 1990 foi confrontada com uma multiplicação dos Estados e a recrudescência dos conflitos regionais e a internacionalização do terrorismo, a partir do século XXI, após os atentados de 11 de setembro de 2001, em Nova Iorque.  

A diversidade de Estados

As terras emersas do planeta são completamente cobertas por Estados (simplificadamente, são comunidades humanas que vivem em um território e possuem um poder político), exceto na Antártida. Os Estados são diferentes em tamanho e população. Há Estados enormes que parecem continentes, como Canadá e a China. Em contraste, existem microestados, na maioria das vezes, são ilhas, especialmente, no Oceano Pacífico.
 
Os Estados às vezes são assembleias de populações de diferentes idiomas, como a Suíça. Outros como a Rússia, têm muitas minorias. Quando vários Estados estão unidos, como os Estados Unidos ou o Brasil, são um Estado Federal. Mas alguns povos espalhados por vários países, como os curdos, no Oriente Médio, não têm um Estado. 

A multiplicação dos Estados

Há no mundo cerca de 200 Estados (193 compõem a Organização das Nações Unidas-ONU), em contraponto a apenas 78 que existiam, em 1945.  Os mais antigos estão concentrados na Europa.  São os Estados-nação, habitados por um povo unido por vastas tradições, pela linguagem e pelo desejo de viver juntos, que foram construídos ao longo de uma longa história, como a  França e a Inglaterra.

A maioria dos novos estados dos séculos XIX e XX procuraram se formar nesse modelo, todavia muitos esbarraram nas reivindicações das minorias nacionais que exigiam autonomia ou Independência. O choque de nacionalismo às vezes encontra um resultado pacífico, como a divisão da Tchecoslováquia, em República Tcheca e Eslováquia, mas, frequentemente, como na ex-Iugoslávia ou na África, leva à sangrentos conflitos.

O número de fronteiras aumentou de forma expressiva, no século XX, mas a sua natureza se diversificou, notadamente, pelo agrupamento dos Estados em blocos regionais, que se tornaram mais expressivos pela globalização econômica acelerada nos anos 90.   

Quando os Estados se unem, as fronteiras tendem a se confundir, por exemplo entre os Estados da União Europeia. Por outro lado, algumas fronteiras correspondem à linha de conflitos e formam verdadeiras barreiras militarizadas, como desenrola em Chipre ou entre as duas Coreias.  

Em algumas regiões, a cooperação transfronteiriça ativa está se desenvolvendo e as redes de transporte estão cada vez mais integradas. Quando a diferença de riqueza é muito significativa entre dois países, os imigrantes ilegais tentam atravessar em direção à mais próspera.  Em algumas delas, as fábricas estão se instalando, aproveitando a mão de obra mais barata, como se verifica na fronteira entre os Estados Unidos e o México, com a difusão das maquiladoras, as industrias de montagem com a produção destinada aos EUA. 

O recuo das fronteiras e Estados através da globalização

A partir do final da década de 1980, inicialmente, no mundo anglo-saxão, e depois em outros lugares, o tema da globalização começou a se firmar, inseparável da ideologia neoliberal. Esse fenômeno significa, entre outras coisas o "triunfo" do capitalismo e do mercado, a abolição das fronteiras das mercadorias e do capital e a subordinação da política à economia. 

Entretanto, para muitos observadores, significa também o enfraquecimento das nações e Estados, que seriam cada vez menos capazes de definir o quadro da vida coletiva, seja em termos , seja em termos políticos, seja em termos econômicos, seja em sociais e culturais. 

Para exemplificar esse cenário, os países que aderiram à União Europeia, em 2004, na sua grande maioria ex-nações  socialistas, tinham a obrigatoriedade de proteger as suas fronteiras.  Assim a Polônia, que se encontra na linha da frente a leste, teve que instalar um posto fronteiriço a cada 25 km de acordo com a com as normas europeias nos 1.170 km, que a separa da Rússia, Bielorrússia e Ucrânia, tendo que contratar mais de mil guardas de fronteira. 

Não se trata de reconstruir uma nova "cortina de ferro", mas se precaver contra a imigração ilegal. Asssim, bielorussos, russos e ucranianos (no cenário atual a exigência foi suspensa) teriam que ter visto para ir à Polônia e aos países bálticos, ex-repúblicas da URSS.   

Outro símbolo visível desse fenômeno é a multiplicação silenciosa de muros de separação feitos de aço ou concreto em diferentes lugares do planeta. Existem 17 muros internacionais, cobrindo 7500 km ou 3% das fronteiras atuais (2007). Mas se todos os projetos atuais fossem concluídos, o mundo teria 18.000 km de fronteiras fortificadas.

A dominação ocidental 

Desde 1991, o modelo ocidental não tem rival no mundo. Os princípios democráticos ganharam terreno, especialmente, na antiga Europa Oriental. Apenas alguns países asiáticos como China, com suas especificidades, Coreia do Norte, Vietnã e Cuba, ainda se referem à antiga ideologia. 

O "vencedor" da Guerra Fria, os Estados Unidos, são agora a única "superpotência", mas seu domínio é contestado. O sistema capitalista se impõe em todos as latitudes.  A globalização abre fronteiras, submetendo uma parcela crescente das atividades humanas à lei de mercado.

As novas organizações estatais globais

A extrema fragmentação do mundo em estados é compensada por várias organizações de Estados. A ONU, criada em 1945, reúne quase todos os Estados. Intervém na solução de conflitos, mas seu peso não é suficiente para criar uma nova ordem mundial. Muitas organizações dependem dela, como o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) ou à UNESCO.

Muitos Estados estão se unindo em escala regional nos campos militar, cultural ou econômico. A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) é uma Aliança militar que reúne 30 países, com uma participação expressiva dos europeus, sob o comando dos Estados Unidos.

União Europeia, com seus 27 estados membros, constitui uma entidade econômica comum, que continua a se expandir. Outras alianças econômicas, menos avançadas, operam em várias regiões do mundo.

As barreiras comerciais foram, gradualmente, removidas sob o impulso da Organização Mundial do Comércio (OMC), com a criação de vastas áreas de livre comércio.  As tecnologias de informação permitiram a globalização da comunicação e a transmissão de ideias. Vivemos a era da "infobesidade".  

Conflitos mortais 

Desde o final da década de 1980 as guerras se multiplicaram no Globo. Elas surgem, especialmente, na África e na Ásia, onde as fronteiras herdadas da descolonização são, muitas vezes, artificiais e contestadas por diferentes grupos étnicos.

Mesmo a Europa não foi poupada. Pela primeira vez, desde 1945, na região dos Balcãs, os nacionalismos despertaram com o desaparecimento do socialismo.  Sobre a bandeira da ONU, os Estados Unidos e seus aliados, intervieram para trazer a paz. Atualmente, aguardamos uma postura mais incisiva do Ocidente na invasão da Rússia contra a Ucrânia, mas não há posicionamento claro quanto a um apoio armado direto aos ucranianos.

Em 1991, a após a invasão do Kuwait pelo Iraque, os Estados Unidos intervieram à frente das forças da ONU para libertar este país. O Oriente médio é um barril de pólvora, especialmente, devido a seus recursos petrolíferos que estão no centro das principais questões. 
  
Obstáculos à paz 

O mundo assiste ao ressurgimento de conflitos e reivindicações que haviam sido congelados nos "blocos de gelo" da Guerra Fria, alertava Gorbachev, no seu discurso ao receber o prêmio Nobel da Paz (1990).  

Problemas completamente novos vêm se acumulando em um ritmo rápido, desde então. É possível listar muitos obstáculos e perigos no caminho para a paz duradoura: o ressurgimento do nacionalismo; separatismos e processos de desintegração em diferentes países e regiões do mundo; a crescente diferença no padrão de vida e qualidade de desenvolvimento socioeconômico entre os países ricos e pobres.

Daí a violência e a velocidade do fanatismo, dos movimentos de protesto em massa.  Isso proporciona um terreno fértil para o desenvolvimento do terrorismo, o surgimento e a manutenção de regimes ditatoriais, cujo comportamento das relações interestatais é imprevisível.  

Tradicionalmente, no decorrer da história humana, as comunidades ocuparam espaços fragmentados e disputados por diferentes interesses. Um deles é político. A fragmentação política isola problemas, mas tende a não os resolvê-los. O desafio atual é a busca de uma solução pacífica para essa diversidade. Não valem mais soluções de curto prazo, para problemas de longo prazo.  

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)