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Estado de Minas HISTÓRIA

O Irã antes da Revolução Islâmica (parte 2)

Uma curta experiência democrática interrompida pelos EUA e Reino Unido


28/06/2021 06:00 - atualizado 21/06/2021 13:14

Mossadegh, durante seu breve tempo no poder, gerou grandes problemas para os adversários(foto: Reprodução/www.oexplorador.com.br)
Mossadegh, durante seu breve tempo no poder, gerou grandes problemas para os adversários (foto: Reprodução/www.oexplorador.com.br)


“Nenhuma nação pode ir a lugar algum à sombra de uma ditadura.” 
Mohamed Mossadegh

A frase, cujas palavras poderiam estar em qualquer discurso dos líderes democráticos ocidentais, está atribuída ao ex-Primeiro-Ministro iraniano, Mohamed Mossadegh, que foi deposto por uma ação conjunta da CIA e dos britânicos, em 1953, que deu cabo à primeira e única experiência democrática iraniana. 

Mohamed Mossadegh foi sucessor, por um breve tempo, do Xá Mohammed Reza Pahlavi, que se tornara chefe do Irã, em 1941, após a saída do seu pai, cujas simpatias pela Alemanha de Hitler irritaram os aliados, em especial a Inglaterra. 

Mossadegh, durante seu breve tempo no poder, gerou grandes problemas para os adversários. Um, em especial, era sem precedentes para os rivais: ele era honesto, irrepreensivelmente honesto. Não poderia ser comprado como outros líderes (como o próprio Xá) para se submeter aos interesses ocidentais.
 

Evidentemente, essa característica colaborou para a nacionalização, em 1951, da Anglo-Iranian Oil Company (AIOC), ancestral da British Petroleum-BP, cuja concessão foi cedida ao seu fundador, em 1901, antes que alguém suspeitasse da importância que o petróleo viria a ter.  

Ele rejeitou a oferta da empresa de dividir a metade dos lucros da exploração do petróleo. Era um nacionalista feroz.  Em 1º de maio de 1951, votou pela nacionalização dos poços iranianos e pela expropriação da Anglo-Iranian.

A nacionalização interrompeu décadas de lucros estratosféricos aos ingleses.  Os contratos anteriores desfavoreciam os iranianos, que ficavam com uma pequena parcela dos lucros obtidos com o petróleo. 

Mossadegh expulsou os técnicos britânicos no processo. Mas a Grã-Bretanha teve o cuidado de não treinar técnicos iranianos e, sem esse conhecimento, o Irã não podia fazer com que o petróleo fluísse e fosse explorado regularmente, além de não ter petroleiros para transportar o óleo. 

Para a Inglaterra foi uma grande humilhação, principalmente após as perdas do domínio sobre a Índia, que se tornara independente em 1947. O conflito foi levado pelos britânicos aos organismos internacionais, primeiro à ONU e, em seguida, à Corte Internacional de Haia. 

Enquanto aguardavam uma decisão do tribunal, eles decretaram um embargo a todas as exportações de petróleo iraniano, ameaçaram retaliar e apreender “navios piratas" que transportassem "óleo vermelho", espalharam histórias falsas sobre a suposta senilidade e fanatismo de Mossadegh. Para complicar, o Irã não encontrou compradores para o petróleo.

Em 1952, o Irã rompeu diplomaticamente com a Inglaterra.  A reação internacional foi imediata: os mercados reagiram negativamente ao petróleo iraniano, causando uma grave crise no país e um conflito agudo entre o primeiro-ministro e o soberano, Reza Shah Pahlavi. 

No contexto da Guerra Fria, tal decisão tinha um efeito quase imediato sobre o ocidente. Se Harry Truman, apesar de temer uma expansão comunista no país, apoiou a decisão iraniana, a chegada de Eisenhower à Casa Branca impôs uma mudança de tática drástica. 

Mossadegh foi obrigado a renunciar ao cargo de primeiro-ministro, mas o povo se levantou a seu favor e ele reassumiu suas funções após quatro dias de tumultos sangrentos. A confiança não foi, entretanto, restaurada entre o soberano e seu primeiro-ministro. Um plano para assassiná-lo, liderado pelo Xá, soldados e ministro fracassou em março de 1953.

O Primeiro-ministro era, notadamente, anticomunista, mas os comunistas o apoiavam. 

O Partido Socialista Iraniano, Tudeh, se aproveitou desse cenário. Mossadegh, ingenuamente, insinuou o risco de uma aproximação com os soviéticos (que também não haviam gostado da ruptura do Irã com os ingleses por temer uma aproximação com os EUA), mesmo que esse não fosse o plano. Foi o bastante para que seu destino começasse a ser traçado. 

Em agosto de 1953, após um referendo que deu ao governo legitimidade para continuar as reformas, Mossadegh dissolveu o Parlamento iraniano e anunciou novas eleições.

Mas em 16 de agosto do mesmo ano, o Xá enviou seus guardas à casa do primeiro-ministro para prendê-lo. Surpresa! Os guardas de Mossadegh desarmaram os guardas do rei, obrigando-o a fugir do Irã para a Itália, às pressas. 

Nos dois dias seguintes, os habitantes de Teerã manifestaram em voz alta sua alegria e satisfação com o novo líder. As estátuas do Xá e de seu pai, o fundador da dinastia, foram derrubadas pela população esperançosa por mudanças. 

Entretanto, esse cenário teria curta duração. 

A CIA arquitetou sua queda junto ao MI6 britânico (tal feito foi confirmado em 2013, quando os documentos secretos da CIA foram divulgados), por meio de um golpe, baseado no “medo” da elite de Teerã com o Partido Socialista Tudeh.  Os arquitetos do golpe fizeram acreditar que o novo governo nacionalista abriria caminho para uma revolução comunista. 

No dia 19 de agosto de 1953, o primeiro-ministro foi derrubado. Os governos do Ocidente que defendem tanto a democracia, não a enxergam com o mesmo afinco quando essa experiência no estrangeiro contraria seus interesses econômicos e geopolíticos.

A residência do governo deposto foi bombardeada, Mossadegh conseguiu fugir por uma escada, foi preso, levado a julgamento, condenado à morte, mas cumpriu 3 anos em regime fechado.   Morreu 7 anos depois, em prisão domiciliar, devido a um câncer.  

O Xá retornou ao país e a AIOC, agora British Petroleum-BP, reassumiu seu antigo posto, mas dividindo os lucros com empresas petrolíferas norte-americanas ligadas à poderosa Standard Oil. Assim, fracassou a primeira tentativa de um país subdesenvolvido de assumir o controle sobre seus recursos!

Robert Fisk, no seu livro, A Grande Guerra pela Civilização, após entrevistar um dos britânicos envolvidos na queda da única democracia secular do Irã, afirma que as operações Ajax (EUA) e Bota (Reino Unido) foi um adiamento da história ao impedir a ascensão antecipada dos Aiatolás ao poder. 

O que veio a seguir com o novo “velho governo” foi marcado por atrocidades, que alimentaram os ressentimentos entre os iranianos, até a Revolução Islâmica, de 1979.

Mas essa história será contada na próxima semana...

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