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Estado de Minas Chá com Leveza

Significado oculto de namastê

O que fica para nós, entre tantos namastês, anarriês e arigatôs, é o gesto de boa vontade em relação ao diferente


23/08/2020 08:25 - atualizado 23/08/2020 08:31

(foto: PNGkit)
(foto: PNGkit)


– Anamastê! – ela me cumprimentou no portão de casa. Parada na rampa da garagem, teve ainda o cuidado de fazer o gesto de oração ao volante, com as mãos postas na altura do coração.

Intimamente, achei graça ao vê-la inventar o neologismo para me agradar, incluindo um a inexistente antes de ‘namastê’. Valorizei o seu esforço de tentar usar um vocabulário com o qual não tem familiaridade, na intenção de me deixar feliz.

Até há pouco tempo, eu também não sabia o real sentido dessa palavra. Talvez eu ainda não tenha o alcance de entender o conceito em toda a sua inteireza. No dicionário, namastê significa dizer que ‘meu Deus interior saúda o seu Deus interior’.

Adotei essa delicada saudação ao me referir a pessoas já acostumadas ao termo, pertencentes à mesma egrégora, outro substantivo que me era desconhecido. Admito que, antes de criar o canal do YouTube Chá Com Leveza, eu também ironizava o tal namastê, que me soava estranho, quase cômico. 

Pura birra. Não sabia, nem queria saber desses assuntos ‘holísticos’. Também tinha raiva de quem sabia sobre ensinamentos dos ‘gurus’ da ‘Nova Era’ que aliás, segundo os ‘entendidos’, já deixou de ser nova. Prova disso seria a pandemia, que se materializou em escala planetária.

‘Crendices’ à parte, marquei de propósito alguns dos termos citados nesse parágrafo. De tão batidos, deixaram de ser ditos até pelos espiritualistas.

Melhor voltar ao namastê, sem entrar no mérito da discussão acima. Quero apenas contar que compreendo a confusão da minha amiga. Até alguns anos atrás, morria de preguiça quando alguém usava esse cumprimento, em geral acompanhado de um olhar calmo e bondoso.

Acelerada como sempre, tinha vontade de sair correndo. Dava a impressão de que o interlocutor vivia fora da realidade, em outro planeta ou em uma quinta dimensão.

Nas primeiras lições de meditação e ioga, tive dificuldades para seguir as instruções do professor, que finalizava a aula cantando o mantra aum (om). Impaciente, cheguei a encurtar a pronúncia do tal som do universo, que me parecia arrastado demais. Era impossível manter o mesmo fôlego da turma, já adiantada no processo de inspirar e expirar profundamente: Ommmmmmmmm.

Uma curiosidade é que o efeito do mantra equivale ao grito de gol da torcida, durante um jogo de futebol. Aquele “gooooool” que ecoa nos estádios, dito ao mesmo tempo por milhares de pessoas nas arquibancadas, ajuda a externar a alegria diante da conquista do time e também a liberar a tensão represada dos torcedores. As vaias cumprem igual função, mas em menor grau de intensidade.

Resumindo, comemorar o gol em uníssono dá uma emoção diferente do que assistir sozinho à mesma partida pela televisão. É quase uma unanimidade.
 
Vamos voltar à garagem de casa. Enfrentei o mesmo constrangimento da minha conhecida ao cobrir um evento internacional de negócios em BH. Repórter de economia aqui no jornal Estado de Minas, fui encarregada pelo editor do caderno de investigar o propósito da vinda de uma comitiva de empresários japoneses ao Brasil.

No horário marcado, compareci à entrevista. Fazendo uma reverência, o líder do grupo curvou-se diante de mim, em sinal de respeito. Os outros senhores seguiram o mesmo ritual, abaixando ligeiramente a cabeça na minha presença.

Cheguei a ficar alguns segundos sem reação, até perceber que deveria corresponder à mesura. “Arigatô! Arigatô!”, disse eu, tentando me comunicar com os executivos da terra do Sol Nascente. Não fazia a menor ideia de que, em japonês, ‘arigatô’ quer dizer obrigado.

Se acharam engraçado, os homens de terno foram bem discretos, confirmando as tradições da cultura nipônica. Devem ter disfarçado sorrisinhos frente à jornalista brasileira, que continuava agradecendo, sem motivo. Como se não bastasse, ela incorporou uma gueixa ou, quem sabe, a figura de alguma imperatriz japonesa. Dobrou o joelho direito, cruzando-o por trás da perna oposta, ensaiando recuar um passo para trás.

A manobra lembrou um anarriê, um dos componentes das danças de quadrilha nas festas juninas. Talvez venha daí o anamastê, mistura de anarriê com namastê. Isso não vem ao caso. Só depois ela percebeu a gafe.

Em sua defesa, devo argumentar que, na ocasião do Fórum das Américas, em 1997, os celulares não haviam se popularizado no Brasil. Nem mesmo o Google existia e, se por acaso houvesse internet, provavelmente o sinal não iria pegar direito.

É provável que a origem do anamastê nunca seja apurada. O que fica para nós, entre tantos namastês, anarriês e arigatôs, é o gesto de boa vontade em relação ao diferente.

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