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Estado de Minas OPINIÃO

O rápido aumento de nossa desordem

"O mundo é definitivamente desigual e as desigualdades estão aumentando. Não há mais uma força global impulsionando as economias retardatárias"


17/07/2023 04:00 - atualizado 17/07/2023 08:18
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Esta foto de arquivo tirada em 25 de outubro de 2017 mostra uma visão geral da Câmara dos Deputados no Congresso Nacional
"A Câmara dos Deputados acaba de aprovar uma Emenda Constitucional de reforma tributária, com mais dispositivos do que muitas Constituições inteiras pelo mundo" (foto: Evaristo Sá/AFP - 25/12/17)

Houve um breve momento na virada do século em que muita gente acreditou que o mundo caminhava para uma grande convergência entre as nações em termos de padrões de vida e de valores culturais. Passados poucos anos, podemos verificar que o que está realmente ocorrendo é o contrário.

A grande onda de globalização do século 20 foi movida por progressos tecnológicos que aproximavam os países e as pessoas indistintamente em termos de transporte, de comércio e de comunicação. As tecnologias dominantes daqui para o futuro parecem ser do tipo mais excludente, favorecendo os países mais avançados e limitando o caminho dos retardatários e, dentro destes, criando oportunidades para uma minoria, deixando de fora a imensa maioria das pessoas.

O mundo é definitivamente desigual e as desigualdades estão aumentando. Não há mais uma força global impulsionando as economias retardatárias e cada país doravante vai ter que contar apenas com suas próprias forças. Estas forças são a cultura e a política. Elas é que ordenam o ambiente social e econômico para reduzir a incerteza, sem o que não há investimento nem progresso.

O risco é uma condição na qual podemos derivar uma “distribuição de probabilidades de resultados” de forma que podemos nos segurar contra eles. Incerteza é uma condição na qual não podemos traçar esta curva de probabilidades. Países bem sucedidos são invariavelmente aqueles em que a cultura e a política conseguem converter a incerteza, se não em certeza, pelo menos em risco num domínio cada vez maior da atividade humana.

Este raciocínio explica bem o drama brasileiro. Nos últimos tempos, o sistema político tem oferecido à população um triste cardápio de lideranças, ou envelhecidas ou obtusas, condenadas a operar num ambiente em que o Parlamento e a cúpula do Judiciário funcionam como esferas autônomas, desconectadas entre si e da população.

Nós somos um país pobre e desigual e, apesar dos recursos que temos, nada indica que estamos em via de transformar esta realidade. O desenvolvimento de longa duração depende em todos os países da qualidade das instituições políticas.

Nossas instituições há tempos não propiciam segurança diante das incertezas, não distribuem os incentivos corretos e parecem estar em franco processo de degeneração. Entre os inúmeros exemplos de deformação institucional, vou destacar os dois mais recentes.

Câmara dos Deputados acaba de aprovar uma Emenda Constitucional de reforma tributária, com mais dispositivos do que muitas Constituições inteiras pelo mundo. Apesar de sua extensão e complexidade, a Emenda não foi sequer discutida e foi diretamente para a votação. Muitos parlamentares puderam votar pelo celular, nem sequer estavam presentes no Plenário. Há quem afirme que apenas três parlamentares conheciam o texto até sua aprovação.

Dizem que a reforma vai beneficiar o país, no entanto os fins não justificam os meios, ao menos na ordem democrática. Se uma Constituição pode ser alterada deste modo, não temos mais Constituição, feita para durar e dar segurança à vida social.

Na minha opinião, nossa Constituição morreu naquela madrugada. Não há maior incerteza do que esta: um país cuja Constituição pode ser reescrita a qualquer tempo, de qualquer forma.

No campo do Judiciário também há desordem. O juiz Luiz Roberto Barroso, um dos onze membros do Supremo Tribunal, compareceu a uma manifestação política da UNE e, de mangas de camisa e esquecido da toga, jactou-se com o público, entre outras coisas, de ter derrotado o bolsonarismo.

Que um juiz seja um ator político e vença eleições é um absurdo. Que um juiz do Supremo o faça com tanta clareza, chega a ser uma calamidade, ferindo de morte a confiança que a sociedade precisa ter na Justiça, sua última instância para proteger-se da injustiça.

Nada disto terá consequências para os responsáveis, porque as elites do Poder têm um forte pacto de solidariedade. O único consolo que resta é pensar que os brasileiros não merecem os homens que dirigem o seu destino e quem sabe um dia eles despertem para isto.

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