Os países e seus governos não são a mesma coisa. Nas democracias, os governos são aprovados apenas por uma parte da população, que nem mesmo é sempre majoritária. Confundir, portanto, o que pensa e faz um governo com o que é e pensa um país é um equívoco. Nas sociedades democráticas, os governos são transitórios e a luta política não deveria nunca chegar ao ponto de ferir os interesses mais permanentes da população.
Há muitas interpretações sobre a falta de crescimento do país, mas todas convergem em um ponto: o grande fechamento da economia brasileira para o exterior. A alternativa que temos para crescer e melhorar a vida dos brasileiros é justamente procurar acordos de livre comércio com os países e blocos que assim o desejarem.
Após tratativas que se arrastaram por 20 anos e vários governos, o Brasil finalmente firmou acordo comercial com a União Europeia, pelo qual 95% de nossas exportações para o bloco estarão livres de tarifas e outras restrições. Para entrar em vigor, o acordo precisa de ratificação pelos parlamentos nacionais de cada país europeu, contra o que se mobilizam as resistências dos seus setores econômicos mais atrasados. Infelizmente, essas mobilizações vêm contando com o apoio aberto de organizações ambientais brasileiras para derrubar o tratado.
Na última semana, um agressivo relatório patrocinado pelo Greenpeace para esse propósito foi divulgado na Europa, onde se somou a outras arengas disfarçadas de ciência. Afirma-se ali que o acordo de livre-comércio com a União Europeia é, na verdade, um acordo de destruição do clima e da floresta, que protege apenas setores produtivos predatórios e fortalece governos autoritários. Nada disso é verdade.
Segundo o Greenpeace, o acordo vai aumentar de tal modo as exportações do agro brasileiro para a União Europeia que será inevitável desmatar grandes extensões de florestas para acomodar o aumento necessário da produção. Acontece que isso nunca vai acontecer. O acordo contempla todo o comércio entre os blocos, e não apenas o setor agropecuário. Exportamos hoje para a União Europeia US$ 42 bilhões, dos quais apenas US$ 14 bilhões, um terço, provêm do agronegócio. Essas exportações são apenas uma fração dos US$ 180 bilhões de produtos agrícolas que os europeus importam e continuarão importando de outros países.
A soja não terá qualquer novo estímulo, pois já ingressa hoje no bloco sem tarifas alfandegárias. Se o objetivo é diminuir o cultivo da soja, o alvo foi mal escolhido, pois o destino de 72% da soja exportada pelo Brasil é a China, que é responsável por 40% das vendas externas do agro brasileiro. Em suma, não há qualquer relação de causa e efeito entre o acordo de comércio e a destruição da Amazônia ou a mudança climática. Na verdade é o contrário, pois foi a assinatura desse acordo que fez o governo brasileiro desistir de se retirar do acordo do clima de Paris, como era sua intenção.
Por fim, afirmar que o acordo fortalece governos autoritários é uma agressão gratuita aos países do Mercosul. Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil são países democráticos. Podemos até admitir que o atual presidente tem inclinações autoritárias, mas isso não é mais que um traço de sua personalidade. A república brasileira é democrática, segundo qualquer padrão que se escolher, e o governo é exercido dentro das limitações constitucionais da separação dos poderes e do estado de direito.
A ética do ambientalismo radical, às vezes, replica a lógica dos movimentos de esquerda do século 20: se os fins são nobres, todos os meios se justificam, inclusive afastar-se da verdade e ficar contra o próprio país.