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Estado de Minas EM DIA COM A PSICANÁLISE

Não podemos nos fundir com os filhos. Desejar outras coisas é preciso

Quando pensamos que estamos planejados e nosso destino está certo, vem um vento chamado desejo e nos leva pra outros mundos


01/11/2020 04:00 - atualizado 01/11/2020 07:29


O que fazer quando o desejo interfere em nossos planos e faz como o anjinho Malaquias: tira tudo do lugar? Para quem não conhece a lenda, este anjinho nasceu com as asas no bumbum e, por isso, é estabanado, voa de cabeça pra baixo e tem dificuldade motora. Quando as crianças fazem “arte”, derramam, quebram copos ou derrubam coisas, dizemos que passou por ali o anjinho Malaquias. O que tornava o vexame, a vergonha, em algo mais leve e até divertido.

As crianças quando fazem algo assim ficam muito envergonhadas e constrangidas, pois os adultos são tudo o que elas têm. As sustentam, amparam, cuidam e alimentam. Só de pensar em perder o amor do adulto que cuida delas e tornarem-se estorvos entram em ansiedade e temor do desamparo.

E o desamparo deixa rastros. É uma das marcas que carregamos no corpo. A saber, as marcas do afeto impressas no corpo e no psíquico é que nos trazem para a cultura a partir da introdução da linguagem. Antes disso, somos corpo natural. É o afeto, a voz, o calor, o olhar deste outro que, afetando nosso corpo, humaniza-o.

Para adentrar no mundo humano, na cultura, é preciso um outro que fale conosco e atenda às nossas necessidades. Quando saciados, continuamos querendo a presença deste outro, demandando um sinal de amor. O amor garante que estaremos seguros e a presença do outro se faz muito importante. E faz de sua ausência uma espera. Nosso primeiro amor...

Assim também a constituição de cada um interfere neste processo. Uns serão mais sensíveis que os outros, uns serão mais covardes, transformando tudo em medo, ansiedade, adoecendo por isso. Outros mais agressivos, demandando com força a presença incondicional deste afeto.

Muitas vezes, os adultos pais – geralmente, os que realmente cuidam – ficam muito cansados de ter um bebê inteiramente dependente deles e não há como fugir. A exaustão, muitas vezes, leva este cuidador a não ter tanto prazer. Esgotado, se irrita e, depois, virá a culpa castigá-lo, porque é só pra isso que serve a culpa. Sofrerá porque percebe que mesmo que por alguns minutos rejeitou a cria. Quem nunca?

Seria a rejeição o pior mal que podemos sofrer em nossa estada no mundo?  Com certeza não! Faz muito mais mal o excesso. A falta nos faz esperar e devanear fundando o reino da fantasia, nosso consolo na solidão.

O excesso é pior que a falta. Quando a disponibilidade é demasiada e nos faz inteiramente presença, ficamos pesados e esmagamos as crias. Deixamos pouco ou nenhum espaço para se tornarem sujeitos de sua vida, interferimos sem parar e queremos proteger e agradar. E não educar. Sinal de culpa e encobrimento, não amor de verdade.

A incerteza deste amor, o fato dele vacilar nas horas de cansaço e de desejo de ter de volta o espaço de liberdade individual perdido com o cuidado do bebê parecem ser um pecado. É como se depois de pais devemos ser eternos e constantes doadores sem vacilo, sem egoísmo.

Ora, isso é mito. Continuamos humanos e, às vezes, queremos pedir “altas”, como nas brincadeiras de pegador. Isso é normal e desejável. Não podemos nos fundir com os filhos; desejar outras coisas é mais do que importante, é fundamental, é preciso.

O anjinho Malaquias costuma também visitar adultos. Quando pensamos que estamos organizados, planejados e nosso destino está certo, vem um vento chamado desejo e nos leva pra outros mundos. Quem somos nós para controlar o futuro e até mesmo o presente? O real nos pega de jeito e nos prova por a mais b que, embora possamos civilizar nossos gozos, jamais poderemos viver sem faltas e, delas, vêm o desejo novo. E não vamos esquecer que a vida sem desejo não vale a pena.  Sem desejo a vida é deserto e depressão. Então, viva o desejo, mesmo que ele nos mude de ares: voemos!

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