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Estado de Minas EM DIA COM A PSICANáLISE

Perdas retificadoras


postado em 04/08/2019 04:00 / atualizado em 02/08/2019 13:42


A vida sem perdas não teria graça nenhuma. Quantas vezes temos de perder o que temos para então dar valor? E daí falamos pra dentro: eu era feliz e não sabia. Algumas vezes até pronunciamos em palavras, quando deixamos o narcisismo de lado e aceitamos as consequências de nossos erros de avaliação do presente. Faz parte da condição humana errar, isto é certo. Mas perdoar já faz parte do sublime. Não é nada fácil!

Acredito que as pessoas que admitem erros tanto quanto as que os perdoam são mais felizes, porque o ressentimento, leitores, é um veneno que se toma querendo que o outro morra. Só faz mal para quem o sente e, por isso, sofre magoado, raivoso, vitimado pelo que os outros fizeram.

O problema mora aí. Não tem como passar pela vida sem sofrer as consequências dela mesma. Se estamos vivos, sabemos que viemos pela mão do outro e assim aqui estamos. Então, vamos celebrar a vida, mesmo tendo passado pelos seus erros. Não há pai, mãe, marido, esposa, irmão, amigo, chefe e empregado que não errem.

Gente invariavelmente erra, mente, odeia e fala coisas de que se arrepende e muitos erros mais. Como diz a música: navegar é preciso; viver não é preciso. O humano não é preciso, preciso é o relógio, o computador, as coordenadas de uma viagem marítima. O humano não. É variante, errante, tolo e sempre será. Na melhor das hipóteses.

Para viver melhor, precisamos encarar com maior tolerância os erros dos outros e os nossos. Não admitir os próprios erros não é nada bom. É um problema. A consequência da negação nos leva a repetir os mesmos erros, uma vez que não podemos reconhecê-los. Mas não é fácil. É difícil.

Ver o erro no outro é mole, mas tirar a trava que nos cega não é. Conhecemos o erro no outro porque somos como ele. Carne e osso, e também sabemos onde nos aperta o cinto ou o sinto com s mesmo...

Acabo de assistir a uma comédia francesa. Nem todos apreciam os filmes franceses, especialmente as comédias, mas gostei. Especialmente porque os atores são ótimos: Daniel Auteil, Gérard Depardieu, Sandrine Kiberlain e a bela Adriana Ugarte.

Muito interessante que tudo que vivia o amigo que se separou e vive um novo amor, o outro se colocava em seu lugar fantasiando tomar seu lugar e babando de inveja porque sua vida era a mesma de sempre. Sonhava com as aventuras que podia viver se tivesse a mesma coragem de largar tudo e se aventurar. Pois, foi imaginando cenas, férias, novo amor e deixou rolar mergulhando fundo na fantasia. E foi indo até que o amigo realizado, a quem julgava tão feliz, leva um tombo da vida. E percebe que fora tolo. Era também tarde para se arrepender e ter sua vida de volta.

E pôs-se o sonhador a sonhar também o mesmo desfecho para suas fantasias... Nada melhor do que ser despertado de seus devaneios, semi-delírios de ruína, pela esposa de sempre, querida, e a seu lado chamando para irem se deitar.

Foi aí que percebeu que não queria ir a lugar algum, pois ali era feliz, sua vida tinha sentido porque fazia o que amava. Agora, só faltava uma viagem para fazê-lo ainda mais feliz. E sem precisar perder tudo para saber que era feliz, aprendeu com o erro alheio. Esperto.

Sentiu-se muito aliviado quando, cortado o imaginário (como isso é bom para todos!), acordou para a sua vida. Embora tivesse altas fantasias libertárias, era ali, fiel às suas escolhas, que era seguramente satisfeito. Assim é. Às vezes, é preciso escolher mudar; outras, é preciso manter a escolha feita, e trabalhar nela a cada dia.

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