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Estado de Minas COLUNA

Aprovação da ''PEC de Bondades'' é licença para matar as regras fiscais

Ao decidir gastar por cima de mais gastos, Senado corrompeu a grande razão de sua própria existência


02/07/2022 04:00 - atualizado 02/07/2022 07:28

José Serra foi o único parlamentar a se insurgir contra a avalanche de agressões ao bom senso no trato do dinheiro público
José Serra foi o único parlamentar a se insurgir contra a avalanche de agressões ao bom senso no trato do dinheiro público (foto: EVARISTO SÁ/AFP)

Governos fracos podem muito. Governos fortes só podem aquilo em que acreditam. Vivemos um momento de completa debilitação da autoridade governamental, nas três esferas de poder. Qualquer pauta está aberta à transigência, à leniência e até à indecência, se preciso for para se chegar à acomodação dos interesses dos detentores de cargos. Neste sentido absolutamente corruptível, este governo pode muito, quase tudo, aliás. Premido pela realidade de uma inflação alta corroendo a capacidade de compra da população, os detentores do poder temem o julgamento das urnas em outubro.

E com toda razão. Os eleitores, se puderem, serão impiedosos, provocando uma intensa rodada de volta pra casa para membros do Executivo e do Legislativo federais. O povo, em última análise, não se engana sobre quem, além dos russos, lhe provoca inflação, desemprego e falta de comida no prato. São os maganos de Brasília. Mas estes mesmos são os que agora esboçam, como reação à futura crítica eleitoral, a aprovação, a toque de caixa, de uma “PEC de Bondades” – mais uma espécie de “licença para matar” (matar as regras fiscais do país).

Por meio dessa “PEC de Bondades”, que esta semana passou por 72 votos a 1 no Senado, em votação que desvirtuou o rito constitucional de emendas à Carta Magna, será possível despejar mais 42 bilhões de reais nos bolsos furados de brasileiros necessitados, a título de reforço de Auxílio Brasil (mais 200 reais/mês por pessoa), de Auxílio Gás (mais meio botijão por mês), de um auxílio caminhoneiro (mil reais/mês), de um auxílio taxista (a ser definido) e mais algumas outras “bondades”  com a verba que não existe, nem jamais foi arrecadada, para então poder ser gasta.

O único parlamentar a se insurgir contra a avalanche de agressões ao bom senso no trato do dinheiro público foi o senador José Serra. Ponto para um brasileiro que poderia acompanhar seus “cumpanheiro” de carnaval fora de época, votando uma falsa emergência para posar de bom moço junto ao eleitorado. Ao depositar seu voto solitário de alerta contra a decretação da morte da seriedade no trato da coisa pública, Serra engrandece sua biografia e quebra uma unanimidade burra que teria sido a votação sem um único “não” ao mais nojento pacote de gastança pré-eleitoral jamais aprovado na esculhambada história recente do Senado brasileiro.

Dessa controvertida história fazem parte simplesmente todos, governo e oposição, independentes e falsos pensantes, todos irmanados pelo credo do medo, ou seja, o receio-pânico de desagradar a um eleitorado que, como disse e reafirmo, mais vomitará do que endossará as decisões pusilânimes dos que administram os mais altos negócios do país apenas para arruinar a pátria esculachada.

Os mais pobres estão cada vez mais pobres? Isso o demonstram todos os levantamentos disponíveis. Mas por que continuam os pobres a empobrecer? Segundo os doutos senadores, deve ser porque faltaria aos pobres um complemento de 200 reais de auxílio. Será isso mesmo? Então por que não dobrar a meta e oferecer mais 400 reais? Por que limitar a bondade oficial? Ou por que limitar esse pacote ao próximo 31 de dezembro? Há quem faça a pergunta ao contrário: o que poderia o governo deixar de fazer e, com isso, melhorar a condição do povo? Muito mais do que 42 bilhões de reais (o tamanho do pacote de bondades) é gasto anualmente, todos os anos, com vantagens oferecidas ao andar de cima da nossa gloriosa sociedade de homens injustos.

São maganos ricos a não pagar um só tostão de imposto de renda (só nesse item, há mais do que 40 bilhões/ano de renúncia fiscal); há outros tantos a usufruir dos privilégios da não competição e há, principalmente, o que usufruímos, por décadas, no mais injusto sistema de extração de renda via juros (os mais altos do planeta). Uma mórbida especialidade nacional. Nada disso foi lembrado na votação do pacote de bondades.

Ao decidir gastar por cima de mais gastos, o Senado Federal corrompeu a grande razão de sua própria existência: a de ser o austero supervisor da República, o poder do bom senso e da experiência, a régua da moderação e, também, da coragem. Como atropelador geral da República, este Senado garantiu um lugar à parte na futura historiografia política da Casa. Nem por isso, os pobres, pelos quais os senadores supostamente agiram como agiram, terão ficado menos pobres. Muito contrário, ficamos todos nós mais pobres e mais órfãos de bons exemplos.
 


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