
Nem tudo pode ser resolvido por cada país, entre dois países ou multilateralmente. O entorno das nações pode sempre ser confrontado com forças irregulares, cada vez mais naturais no mundo. E são elas, por mais estranho que pareça, que também confrontam a soberania.
Três desses desafios podem ser observados no Equador atualmente. Migração em massa, pandemia e abuso econômico dos oceanos. Todos têm causas e consequências sistêmicas que poderiam ser mais bem resolvidos se houvesse cooperação, regulação e solidariedade internacionais.
A captura total de peixes em mares e oceanos está mais ou menos estável no mundo desde os anos 1990. São cerca de 80 a 85 milhões de toneladas anuais. O que mudou de lá para cá foi a composição de países que dominam essa indústria. Por conta da necessidade de alimentar sua própria população e da decisão de investir maciçamente no setor, as economias de escala obtidas por companhias chinesas trouxeram para o país uma grande concentração na pesca industrial global.
O Equador nunca foi uma potência da pesca. Mas na região, Peru e Chile já tiveram uma fatia maior do mercado. Hoje ele está concentrado nas mãos de China e Indonésia. O Japão, que foi por muitos anos o líder da pesca legal e predatória, hoje tem uma indústria menor, mais voltada para seu próprio mercado. O fato é que uma parte da cadeia industrial do pescado é intensiva em mão de obra. Por isso, uma grande parte do bacalhau e do salmão pescados legalmente em águas dos EUA chegam aos supermercados americanos como produtos da China porque são processados na Ásia. Com esse ganho de escala, as empresas chinesas aproveitam e pescam também ao redor do mundo em águas internacionais.
Quem já consumiu bacalhau chinês no Brasil fique sabendo que isto já é considerado um desespero para portugueses e noruegueses. Os ganhos de escala da pesca chinesa ultrapassam o princípio que diz que a competição é bem-vinda. Mas, em geral, pesqueiros não gostam muito de leis.
Bom princípio é não ir pescar na Zona Econômica Exclusiva de um país sem ser convidado. Apesar de priorizar a proteção ecológica da região de Galápagos e de acabar não investindo em pesca de alto-mar sustentável, peixes e crustáceos ocupam o segundo lugar na lista de exportações do Equador. Logo atrás de petróleo e à frente de bananas. Desde o final da década de 1970, existe um número crescente de fazendas pesqueiras ao longo da costa equatoriana. Em 2018, o país recebeu do mundo mais de US$ 3 bilhões por seus camarões. Apesar de a pesca equatoriana se dar ao longo de sua costa, a maior parte da Zona Econômica Exclusiva marinha do país está mais distante para dentro do Oceano Pacífico, em torno das ilhas Galápagos.
A principal cidade portuária do país é Guayaquil. Com seus mais de 2 milhões de habitantes, foi duramente atingida logo no início da pandemia do coronavírus em março. O sistema de saúde da que é também a maior cidade equatoriana colapsou e corpos foram abandonados em praça pública. Em meio ao caos, o país foi capaz de tomar providências. De cidade símbolo do estrago que o coronavírus poderia causar, Guayaquil no momento tem conseguido dar a volta por cima. Passou a servir de exemplo não apenas sobre o que não fazer, mas também de algumas políticas acertadas para controlar e diminuir os efeitos da pandemia.
Uma pandemia que pegou o país tendo de lidar com grande chegada e trânsito de imigrantes vindos da Venezuela, mas também da Colômbia. Apesar de ser bem menor do que o Brasil e de nem ter fronteira com a Venezuela, o Equador recebe mais venezuelanos do que o Brasil. A crise venezuelana só se resolve com países dispostos a buscar a cooperação e a harmonia.
Afinal de contas, fora crise política, são sérias as projeções sobre o aumento das migrações para fora da América Central e do norte da América do Sul por conta dos efeitos das mudanças climáticas em países despreparados para enfrentá-las.
* Paulo Delgado, sociólogo
Com Henrique Delgado
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