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Estado de Minas COLUNA DO PAULO DELGADO

A força dos desconectados nas eleições durante a pandemia de COVID-19

Não é a polarização que caracteriza as disputas atuais, mas o movimento, a inércia e a dispersão


postado em 05/07/2020 04:00 / atualizado em 04/07/2020 22:32

As eleições, com tendência crescente de baixa participação, estão ainda mais esvaziadas neste ano(foto: MARK RALSTON/AFP - 12/5/20)
As eleições, com tendência crescente de baixa participação, estão ainda mais esvaziadas neste ano (foto: MARK RALSTON/AFP - 12/5/20)
A maior parte da população do mundo é de transeunte.  O contrário de pessoas impulsionadas por algum motor, ou que já desembarcaram em alguma ideia e ali permanecem. Na política não é diferente. Não é a polarização que caracteriza as disputas atuais, mas o movimento, a inércia e a dispersão. A polarização é um desejo confuso, acadêmico, fornece um imã para quem já foi atraído. Não para o povo, que na sua solidão de pedestre desconectado não encontra companhia que o ajude a confiar em desconhecido.

Dentro da acentuada dispersão, grupos políticos buscam atiçar o sectarismo de parcelas pequenas, mas com disposição de organização e enfrentamento. No período próximo da decisão eleitoral nos EUA a polarização, um conceito teórico que quer tirar da realidade o que ela não pode dar, é artificialmente estimulada.

Mas como não é mais o eleitor tradicional e tranquilo que decide, a polarização é sobre agendas que atiçam grupos disciplinados e barulhentos, causando estonteante confusão na maioria do eleitorado que não trata a política como produto de primeira necessidade.

O grupo que aposta no atiçamento bairrista e autoritário continua sua ascensão sem um rosto que o identifique. Ele aglutina focos de entusiasmo para tentar mexer na balança do eleitor desanimado.

Quando a novidade é a pauta ecológica/verde, sempre muito simpática, cada vez mais prestígio reúne simpatizantes dispersos. É outro tipo de dispersão que também aglutina transversalmente entusiasmo desconectado da política engajada.

As eleições, com tendência crescente de baixa participação, estão ainda mais esvaziadas neste ano de pandemia. Considere o que se passa nos Estados Unidos e na França – as pátrias das revoluções desde 1776 e 1789, respectivamente.

Nas eleições municipais francesas de dias atrás 60% dos eleitores não compareceram. Entre os jovens a situação é calamitosa para a democracia: 72% dos eleitores abaixo de 34 anos não foram votar. Os idosos, que votam mais que os jovens, com compreensível receio do COVID-19 foram em menor número do que historicamente.

Nos EUA, a tendência de declínio histórico de participação eleitoral é ainda mais acentuada. Em 1992, somente 10% dos eleitores não foram às urnas. Em 2012, 34% não votaram na eleição que deu o segundo mandato a Obama. Trump ganhou em meio a 35% de abstenção.

A dinâmica americana é mais peculiar por conta do colégio eleitoral – o que de fato conta – e estratégias são traçadas para ter sucesso no pleito majoritário com apoio adicional obtido no duro minoritário dos delegados estaduais.

Se havia a ideia de que 2020 teria grande participação, o vírus fez isso depender de quanto será ampliada a votação por correio. Mesmo assim é difícil reverter a tendência. Nas últimas eleições norte-americanas, 23% dos votos foram por correio. Espera-se que mais da metade seja por correio dessa vez. A questão é quanto do total de eleitores esse mais da metade representará.

Na sexta-feira boa parte dos americanos teve um dia de folga por conta do 4 de Julho, Dia da Independência que caiu no sábado. O presidente Trump foi para a Dakota do Sul levando uma esquadrilha da fumaça e fogos de artifício ao Monte Rushmore.

Esse tipo de celebração se faz no monumento que conta com os bustos de Washington, Jefferson, Ted Roosevelt e Lincoln esculpidos no cume do monte. A princípio, nada mais apropriado. A questão é o estilo. Até um ato que é para ser agregador e pacificador, pelos discursos e o nervosismo, se transforma em sectarismo autoritário.

A tradição de se soltar fogos ali foi cancelada por conta da alta chance de incêndios na floresta em que o monte está localizado. A região se chama Black Hills, ou Serra Negra, em parte porque a densa vegetação sempre pega fogo, ficando o pé das árvores escuros. Pode-se reclamar da regulação excessiva, pode-se buscar saídas para a segurança do evento, pode-se fazer um show de luzes. 

Mas a ideia foi provocar e botar fogo como uma tentativa de interpretar e canalizar a frustração acumulada nas pessoas para obter resultados políticos.

Segundo o Pew Research Center, 71% dos americanos sente raiva da situação do país. 66% sentem medo. Incendiar uma floresta para culpar o resto do mundo pelos problemas do país mais bem-sucedido do mundo não pode ser chamado de polarização. A onda é outra, e a radiação incoerente que projeta não combina com liberdade de manifestação ou de expressão.

Nos EUA, a família Trump tomou para si um dos dois únicos partidos existentes de fato. Daí vem essa linguagem sobre polarização porque nos EUA só dois partidos competem. Mas o que existe mesmo é dispersão, alimentada pela fritura constante da política que concentra entusiasmo em sectarismos e espalha desilusão e outros sentimentos negativos.
 
(Com Henrique Delgado)


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