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Estado de Minas DIVERSIDADE

A conexão entre a fé, a natureza e a diversidade religiosa na favela

'Me coloquei a refletir, sentada numa pedra, como a vista do mirante realmente é fascinante: em um único lugar, podemos ter uma visão ampla e abrangente de BH'


03/04/2023 10:00 - atualizado 03/04/2023 15:02

Vista do Mirante do Belvedere
(foto: Patrícia Alencar/Reprodução)
No outro dia, durante minha caminhada matinal, parei para pegar fôlego e respirar no mirante do Belvedere. Foi nesse momento que fui pega por uma mistura de emoções. A vista do mirante sempre foi exuberante, mas dessa vez estava ainda mais especial. O cheiro de verde estava forte, pois a trilha havia sido podada recentemente, as folhas e capins estavam espalhados pelo chão. Foi nesse contexto que vi várias mulheres, algumas moradoras da favela Morro do Papagaio, manifestando sua fé de diferentes maneiras. Algumas oravam, outras cantavam, outras gritavam, algumas estavam de joelhos, algumas com a bíblia ou terço na mão, outras simplesmente contemplavam a serra. Essas mulheres simples conectadas com Deus me emocionaram profundamente. Foi como se eu estivesse testemunhando um momento de transcendência. Aquele lugar mágico, com cheiro de natureza e a presença dessas mulheres tão devotas criou uma atmosfera de paz e serenidade. 

Me coloquei a refletir, sentada numa pedra, como a vista do mirante realmente é fascinante: em um único lugar, podemos ter uma visão ampla e abrangente da cidade, com suas diferentes paisagens e realidades. Pude ver, de um lado, os imponentes edifícios do bairro Belvedere, que representam o luxo de uma classe privilegiada. De outro lado, a favela Morro do Papagaio, que é um exemplo da exclusão. Essa paisagem contrastante é um reflexo da desigualdade social que permeia nossa sociedade. De outro lado, pude ver os icônicos estádios de futebol da cidade, a Arena do Galo, o Estádio do Mineirão e a Arena Independência, que representam a paixão do povo mineiro pelo esporte. E, ao fundo, a Serra do Curral, que é um dos mais belos símbolos da cidade de Belo Horizonte. 

Nessa vista panorâmica, pude ver, também, a diversidade religiosa da cidade e, sobretudo, da favela representada pelas mulheres que estavam alinhadas com o sagrado no mirante. Elas podem ter vindo de religiões diferentes, mas todas elas compartilhavam a crença na importância da natureza para se aproximarem do divino. Na favela, a diversidade de religiões é um reflexo da capilaridade e amplitude destes territórios compostas por pessoas de diferentes crenças, culturas e origens. É comum, nas favelas, encontrar uma grande variedade de denominações religiosas, como as religiões de matriz africana, como o candomblé e a umbanda, a religião católica e a religião evangélica, e outras manifestações religiosas menos conhecidas.

As religiões, muitas vezes, desempenham um papel social importante, oferecendo suporte emocional e espiritual às pessoas em momentos de dificuldade e, nas favelas, isso se acentua: os templos, muitas vezes, se tornam centros de convivência e solidariedade, onde as pessoas podem encontrar apoio e conforto em meio aos infortúnios da vida. Devo ressaltar que a diversidade religiosa também provoca conflitos e intolerâncias. As diferentes paisagens, religiões e classes nos mostram as realidades e os desafios da sociedade e como a fé pode se manifestar de diferentes formas e em lugares diversos. 

Mãe Menininha do Gantois, uma das mais importantes líderes religiosas do candomblé, costumava dizer que a fé é uma das principais forças que guiam a vida das pessoas, nos conecta com o divino e nos ajuda a superar desafios e adversidades. Já para o Padre António Vieira, no "Sermão da Sexagésima", a fé enfatiza a importância da pregação e da compreensão correta da Palavra de Deus para a fé verdadeira. Ele argumenta que a fé não pode ser simplesmente aceita sem questionamento, mas deve ser entendida intelectualmente e praticada ativamente.

Em um mundo cada vez mais polarizado, é fundamental que respeitemos a diversidade religiosa e compreendamos que a fé pode ser praticada de diferentes maneiras. A presença das mulheres no mirante do Belvedere, independentemente da religião que seguiam, mostrou que a conexão com o sagrado pode ser uma fonte de paz e serenidade em meio a realidades tão distintas. É importante lembrar que a fé não deve ser utilizada como um instrumento de discriminação ou exclusão, mas sim como uma forma de promover a solidariedade e a empatia entre as pessoas. Ao nos conectarmos com o divino, podemos encontrar a força necessária para enfrentar os desafios da vida, e essa é uma mensagem que vale para todos, independente de sua religião ou classe social. Portanto, acredito que devemos olhar para a fé como uma forma de união e respeito mútuo, e não como uma fonte de divisão ou conflito. 

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