Pode ser uma composição de Beethoven, Bach, Villa-Lobos ou Chiquinha Gonzaga. Wolfgang Amadeus Mozart ou Mozart Batista Santos Júnior. Nem se trouxermos de volta os nossos saudosos maestros palestrinos-cruzeirenses Tolentino Miraglia, Jadir Ambrósio e Aldair Pinto. Com essa orquestra desafinada, tão cedo não conseguiremos chegar a um concerto sem notas atravessadas e descompassos neste Brasileiro.
Depois de mais uma derrota para os times do lindo estado de Alagoas, tornou-se evidente a razão da nossa incapacidade de engatar uma sequência de execuções dignas de um público tranquilo pela certeza de boas sinfonias seguidas. Verdade precisa ser dita, por mais doída que seja: o elenco atual, a nossa orquestra, é talvez uma das mais fracas da história centenária do Cruzeiro.
Já houve períodos de escretes com capacidade técnica limitada e longas “filas” de títulos. O Palestra Italia da década de 1930, após a perda do trio Ninão, Nininho e Niginho Fantoni. O Cruzeiro Duro dos anos de 1950, que, por mais prejudicado pelo favorecimento aos times da elite de Belo Horizonte, também não era tão competitivo. O início da década de 1980, quando alguns jogadores entraram até para o folclore da nossa própria torcida (Toby e Bendelack, que o digam). A barca de refugos brasileiros e argentinos de 2015/2016. Mas nenhum desses grupos jamais perderia para essa patota que aí está.
Mesmo o Cruzeiro sendo a minha eterna seleção, chego ao ponto ardido de me negar a dar o apelido de “escrete” ao atual elenco. Não por crítica vazia ou por me atrelar aos adeptos da sangria. Na década de 1990 havia uma tradição compartilhada por todas as torcidas. A qualquer sinal de sequência de derrotas ou times ruins, elas viravam suas faixas de ponta-cabeça nas arquibancadas. Era o simbolismo de um protesto popular e coletivo. Se pudesse, eu escreveria as próximas crônicas com as letras de cabeça para baixo.
Não é uma crítica a A ou B. Ou mesmo uma caça às bruxas, procurando culpados como se me comportasse como um alienado ou falsário ao tratar o Cruzeiro como sendo o único do campeonato com uma equipe mal montada.
Trata-se apenas de constatar que não podemos deixar de ser justos em ver avanços táticos, de clima, de variações e vontade impressos pelo atual maestro Mozart, mas que também não podemos tapar os olhos frente à fragilidade da orquestra entregue a ele.
Se em 2020 começamos com os 6 pontos de punição administrativo-financeira, desta vez são 6 pontos negativos de penitência. As derrotas para CRB e CSA estão na conta dos erros individuais da nossa sofrível orquestra.
Nossos zagueiros nos provocam saudades de Isaías, Espínola e outros brucutus. Temos um lateral-esquerdo que há dois anos não chega à linha de fundo para cruzar uma bola. Atacantes que, como diz meu amigo Nandão, de Santa Tereza, só correm olhando para a bola como se fossem o Corcunda de Notre Dame.
Os novos reforços têm cara e cheiro de barca? Sim, mas com um clube destruído financeiramente e com uma base desmantelada, nos restaria o quê? Há os que defendem sangrar o Cruzeiro por ódio ou vingança. Tenho um misto de dó, pena e desprezo por quem faz isso. Mesmos sentimentos que nutro pelos que não têm a humildade para assumir os erros ou para pedir ajuda.
Prefiro ter orgulho dos inúmeros grupos de torcedores que estão se mobilizando para arrecadar recursos para tentar diminuir o sofrimento dos salários atrasados de funcionários e jogadores, como tenho visto inúmeros amigos e apoiadores incondicionais, como o icônico Tosca, da Máfia Azul, os mestres Wilder e Renato Gomes, da AGC.
Vamos iniciar mais uma rodada hoje. E cada um se agarrando à sua crença para termos bastante paciência para assistir a esse não escrete tentar (mais uma vez) se firmar. Que a energia positiva desses torcedores inspire o inimaginável.