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Estado de Minas DA ARQUIBANCADA

O futebol brasileiro acabou (e seu time não será o Barcelona)

O xeque-mate preparado há 40 anos chegou e clubes e crônicas esportivas se mantêm inertes


postado em 30/10/2019 04:00 / atualizado em 29/10/2019 21:59

Alex marca, de letra, contra o Flamengo, no Maracanã, no primeiro jogo da final da Copa do Brasil de 2003. O Cruzeiro foi campeão do Mineiro, da Copa do Brasil e do Campeonato Brasileiro, conquistando a Tríplice Coroa(foto: Auremar de Castro/EM - 8/6/03)
Alex marca, de letra, contra o Flamengo, no Maracanã, no primeiro jogo da final da Copa do Brasil de 2003. O Cruzeiro foi campeão do Mineiro, da Copa do Brasil e do Campeonato Brasileiro, conquistando a Tríplice Coroa (foto: Auremar de Castro/EM - 8/6/03)


Imagine se Cruzeiro, At(h)leticos, Grêmio, Internacional, Bahia ou outro clube tivesse o privilégio imoral de, por 40 anos, contar com: uma rede TV massificando sua marca e formando público, a CBF segurando seu rebaixamento, políticos e dirigentes de empresas públicas impedindo sua falência. E ao longo disso, na sequência de dezenas de administrações desastrosas, uma diretoria com a oportunidade financeira de colocar em prática uma “boa gestão”. Acrescente ainda uma crônica esportiva nacional sustentando isso há 40 anos, resumindo a história de sucesso do suposto clube exclusivamente à última (e real) afirmação.

Depois do 5 a 0 sobre o Grêmio (após a “boa gestão” ficar a um gol de ser eliminada na fase inicial da Libertadores), qualquer análise dissonante do discurso de manada, questionando a santidade financeira e administrativa do Flamengo, é tratada como sacrilégio. Quando é um de nós cruzeirenses quem tenta, a pedrada é a mesma. Tratam de comparar a gestão flamenguista à situação vexatória do Cruzeiro, insinuando sordidamente que tentamos lançar cortina de fumaça sobre o caos celeste. O que é falácia, mesmo porque, quem fez esse papel por décadas não fomos nós torcedores, mas, sim, a própria mídia regional.

Por exemplo, confrontar Flamengo'2019 e Cruzeiro'2003 é como comparar uma caridade feita pelo Pablo Escobar e outra por um trabalhador assalariado. Ambos fizeram o bem, o ato é igual, mas há que se analisar qual a fonte (e volume) do dinheiro que possibilitou a cada um deles ter condições de ajudar.

Portanto, esqueçamos por ora o Cruzeiro, que nada tem com o “sucesso do Flamengo” e esse, tampouco, com a lama da gestão Wagner Nonato Pires Machado de Sá. Convido-o para nos atermos ao sistema desleal de financiamento dos clubes não só com o único gigante mineiro (ou com seu ex-rival regional), mas com todo o futebol brasileiro.

Até a década de 1970, a TV não era o meio de comunicação de massa no Brasil. O rádio ocupava esse posto. Em Minas Gerais, por exemplo, até o advento da Academia Celeste de 1966, o interior do estado mais populoso do Brasil não-praiano ainda dividia sua torcida entre clubes cariocas, paulistanos e o Santos de Pelé. Do Norte ao Sul do Brasil, flamenguistas não eram em tão grande números superiores a botafoguenses, vascaínos ou santistas.

Mas eis a década de 1980. Com ela, um canal de TV que se agigantou na ditadura militar e, assim, tornou-se onipresente nas casas brasileiras. Por sua potência política e, consequentemente, financeira, dominou as repetidoras nos rincões do país.
Não seria honesto desmerecer a sorte do Flamengo, nesse início de período, por ter no time um gênio da bola de nome Zico e uma geração de craques. Inclusive, para lembrar que antes deles o time da Gávea, em termos de conquistas, não passava de um colecionador de Beach Cups (a versão praiana da Country Cup), enquanto Santos, Cruzeiro, Palmeiras, Vasco, Botafogo e Internacional, por exemplo, já ostentavam títulos nacionais e internacionais.

Desde então, o Flamengo trilhou exatamente o mesmo caminho de todos os outros. Conquistava título num ano, beirava o rebaixamento no outro. Formava esquadrão numa temporada e se afundava numa dívida impagável na seguinte. Mas alguns sinais já demostravam que o clube escolhido por aquele canal de TV não seria tratado igualitariamente. Foi o primeiro e único, por exemplo, a ter o privilégio de estampar na sua camisa uma marca de uma estatal, sem qualquer processo licitatório ou pesquisa de mercado.

Há 40 anos, o Flamengo é irrigado com a deslealdade na distribuição de recursos e na formação de público consumidor. Nesse período, gestões irresponsáveis, fraudulentas e boas se revezaram à frente dele. O dinheiro jamais lhe faltou, mesmo sendo o maior devedor de impostos ao povo e caloteiro do futebol brasileiro.

Nesse período surgiram super times vencedores como o Bahia de Bobô; os São Paulos de Telê e Muricy; o Corinthians e o Santos de Luxemburgo; o Inter de Fernandão; Palmeiras e Grêmio da década de 1990 e os Cruzeiros de Alex e de 2013/2014. Porém, a prioridade de transmissão, espaço de mídia na TV e, consequentemente, recall para barganha de patrocinadores, cotas e consumidores não se alterou. E mesmo não sendo o clube de maiores conquistas em nenhuma das décadas do século 20 e tampouco nesse século 21, viu sua exposição midiática e, consequentemente, seu público consumidor aumentarem. “O Flamengo continuou sendo o Brasil”, diria o narrador desse canal.

Hoje, a disparidade de patrocínios é absurda, desleal e irreversível (se não houver uma rebelião dos demais clubes). O tão temido modelo “Real/Barça contra a rapa” chegou ao Brasil. Teremos sempre a Rede Flamengo de Televisão e um ou outro clube com fontes de receitas momentâneas (e duvidosas), como é o caso do Palmeiras e sua agiota apaixonada. Os demais se resumirão a beliscar uma Copa do Brasil e quiçá terão pernas para um mata-mata na Libertadores.
Os torcedores flamenguistas não têm culpa nenhuma disso. Que continuem vivendo esse momento de sonho promovido por esses 40 anos de benefícios. Já nós, cronistas regionais, e nossa visão de curta viseira, precisamos parar de usar o caos administrativo do Cruzeiro para reverberar uma meia-verdade nacional que só fará destruir a heterogeneidade dos clubes brasileiros, e, inclusive, a nós mesmos.

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