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Estado de Minas EU NÃO ENXERGO COR!

Daltônicos da contemporaneidade

O racista e suas múltiplas estratégias para ultrapassar gerações se mantendo discreto, forte, atuante e aceitável socialmente


19/01/2023 09:38 - atualizado 19/01/2023 10:07

Fofo tos lábios de duas mulheres, uma branca e uma negra
Para negar a exclusão e discriminação baseada nas características corpóreas essas pessoas alegam serem daltônicas nos mais diversos setores da vida (foto: Pexels)

 
Muito mais que um conjunto de órgãos, o corpo é uma forma de estar no mundo e é através dele que as pessoas são vistas, identificadas e até mesmo lembradas. Quantas vezes, em um ambiente com diversas pessoas, ao apontar alguém a gente utiliza dos aspectos corpóreos para que o nosso interlocutor saiba de quem estamos falando? Aquela moça alta, aquela senhora negra, aquele moço moreno, dentre  inúmeros outros adjetivos, não é mesmo? 

Tanto é através do corpo que somos identificadas e identificados, que além da nossa digital a fotografia do rosto é anexada aos nossos documentos para trazer uma legitimidade na identificação. Bem naquele esquema “cara crachá”. O maior órgão do corpo humano, a pele, também compõe esse processo e a forma como esse corpo é visto e até mesmo tratado no mundo. Mas, sempre tem um mas, de um tempo pra cá tenho ouvido de forma recorrente de algumas pessoas frases do tipo: “eu não enxergo cor”, “eu nem percebi que ele é negro” seguidas da seguinte afirmação “eu enxergo a competência”.

Pois é, para negar a exclusão e discriminação baseada nas características corpóreas essas pessoas alegam serem daltônicas nos mais diversos setores da vida. Nunca perceberam que ao abrir a porta de um consultório, por exemplo, nunca ou quase nunca se depararam com profissional negro ou indígena como médico. Também não se dão conta que nos espaços culturais e nos restaurantes que  frequentam, as pessoas que usufruem são brancas e as que servem são negras. E como não enxergam cor nas pessoas, nunca observaram que na empresa em que trabalham os cargos com maiores salários são ocupados somente por profissionais brancos.


Em um país formado por uma população de pessoas tão coloridas como é o Brasil esse daltonismo recorrente surge sempre em que a pauta de políticas de promoção da igualdade é elencada. E se essa política for para oferecer um suporte que proporcione pessoas excluídas e discriminadas consigam mostrar suas capacidades, competências e formações é vista como uma ofensa pelos daltônicos.
 
Porque como eles, estrategicamente, não enxergam cor, ninguém mais enxerga, e se ninguém enxerga, ninguém é discriminado e a política de promoção da igualdade não tem razão de existir. E assim sendo tudo continua hierarquicamente como é, um povo colorido em que quanto mais “alva” a pele mais a máxima que basta se esforçar para chegar lá se torna verdade absoluta e quanto mais escura a pele não há esforço que baste.

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