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Estado de Minas ECONOMÊS EM BOM PORTUGUÊS

Aos pais, reflitam sobre o sofrimento psíquico de seus filhos e filhas

As gerações que endossam cada vez mais as estatísticas de suicídio estão vulneráveis a ambientes nocivos à saúde mental


09/08/2022 06:00 - atualizado 09/08/2022 07:40

Garota sentada no sofá em posição de tristeza, com a cabeça baixa e os braços abraçando os joelhos
Os grupos com maior representatividade de mortes por suicídio, no Brasil, segundo os dados extraídos do DataSUS/Ministério da Saúde, encontram-se nas faixas etárias entre 20 e 29 e 30 e 39 anos. (foto: Freepik/Divulgação)
Estatísticas de consumo e morte causadas por overdose de consumo de opioides lícitos e ilícitos vêm promovendo, finalmente, forte mudança na política norte-americana quanto ao uso desse vasto espectro de substâncias químicas. Lamenta-se o fato de o país ter alcançado níveis alarmantes de mortes por suicídio para começar a construir política pública de saúde mental que trata os interesses sociais acima dos econômicos – leia-se aqui a força da indústria
farmacêutica.


Os dados norte-americanos dos Centros para Prevenção e Controle de Doenças (CDCs), para o ano de 2020, mostram que quase 92.000 pessoas morreram de overdose de drogas - aumento de 31% em relação ao ano anterior (2019). Além disso, o que mais assusta é a principal causa mortis desse tipo de suicídio: 75% envolveram prescrição (lícita) ou opioide ilícito.


Os opioides são substâncias derivadas da papoula, tendo como origem o ópio. A partir dele, foram sendo desenvolvidas substâncias químicas sintéticas ou semissintéticas (heroína, por exemplo), sendo, dentre as mais produzidas e consumidas, atualmente, a codeína, o tramadol, oxicodona, hidrocondona, metadona, fentanil, tapendatol e loperamida, sem contar a morfina – cujo nome teve como inspiração Morfeu, o deus do sono, por seu efeito sedativo e provocador de sono.


Desenvolvidos como tratamento para o alívio da dor, vasta gama de opioides precisam de prescrição médica por compor a lista de medicamentos tarja preta, haja vista seu risco de consumo excessivo e dependência química. O fato é que, para além do uso medicamentoso, em que se destacam os casos oncológicos, os opioides têm sido cada vez mais prescritos para tratamentos psíquicos ligados a transtornos e depressão para adolescentes e jovens adultos.


O crescente uso ilícito de opioides, por jovens, decorre também da prescrição médica. É daí que também deriva-se o uso recreativo por promover sensação de alívio e prazer, transformando-se os opioides mais modernos na droga da moda da nova geração de adolescentes e jovens adultos. Em outras palavras, é nos consultórios psiquiátricos que pode começar o perigoso acesso e dependência química futura.


Contraditoriamente, a recém-política norte americana de redução de acesso aos opioides tem trazido consequências devastadoras. Pessoas dependentes de opioides e sem acesso a tais substâncias têm buscado fontes ilícitas; por conseguinte, o número de mortes aparentemente não intencional tem crescido rapidamente. O consumo recreativo e a dependência química têm favorecido o consumo ilícito e engrossado o coro das estatísticas de morte dos jovens.


Em documento especial, lançado em 2018, a Organização Mundial de Saúde (OMS) estimava que 800.000 pessoas morreram por suicídio, nos 194 países por ela estudados à época do relatório, sendo considerada essa a causa principal de morte dos jovens. Vale frisar que as estatísticas de suicídio sofrem forte subnotificação mundo afora.


No Brasil, a Classificação Internacional de Doença (CID) apresenta 25 especificações que se enquadram como suicídio, sendo distribuídas entre 10 tipos de autointoxicação e 15 de lesão autoprovocada. Entre 2006 e 2020, no Brasil, a morte por essas 25 CIDs cresceu 69,4%, passando de 17.681 para 29.959 pessoas por ano. Em termos relativos, significa um crescimento de 9,45 para 14,45 indivíduos a cada 100.000, no mesmo período.

Os grupos com maior representatividade de mortes por suicídio, no Brasil, segundo os dados extraídos do DataSUS/Ministério da Saúde, encontram-se nas faixas etárias entre 20 e 29 e 30 e 39 anos, ambas respondendo, individualmente, por aproximadamente 20 mortes a cada 100.000 pessoas. O suicídio, mesmo subnotificado, indica o quanto o adoecimento psíquico tem assolado jovens adultos.

 

Nos Estados Unidos, os CDCs têm promovido, por meio de sua Divisão de Saúde do Adolescente e Escola, ações para que os jovens possam adquirir conhecimentos e habilidades fundamentais sobre saúde. No Brasil, essa discussão é ainda tabu. As escolas costumam convidar alunos usuários de drogas a “retirarem-se” – leia-se serem expulsos – ao invés de buscar reintegrá-los e apoiá-los na busca por vida saudável, em conjunto com pais e equipes de saúde mental.


Há alguns anos, o filme “Meu nome não é Johnny”, grande sucesso de bilheteria, narrava a história verídica de João Guilherme Estrela, rapaz da alta sociedade carioca que se tornou traficante internacional e acabou sendo preso pela polícia. João, à época do lançamento do filme, foi convidado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro para falar sobre sua história.


A forma como João narrou sua vida de dependente químico e traficante, entre os anos de 1989 e 1995, suscitou críticas por sugerir que estaria incentivando os jovens a transgredir sem medo. No entanto, sua narrativa e outras entrevistas que deu à época de sua libertação e também do lançamento do filme indicam que seus pais faziam vista grossa e não mantinham diálogo sobre seu consumo de drogas. Esse abandono o levou ao consumo e tráfico de drogas,
algo cada vez mais comum nos meios de classe média e alta.

 

Nos deparamos, cada dia mais, com uma sociedade que não quer reconhecer seu adoecimento. Com pais sabendo que seus filhos e filhas bebem, ainda menores de idade, em festas de 15 anos promovidas por eles próprios; que seus filhos e filhas começam vida sexual aos 12/13 anos de idade sem orientação sexual e estrutura corporal; que desde criança suas filhas são expostas e estimuladas à sensualização de seus corpos; e que filhos e filhas, em sua maioria, não encontram espaço, nem em casa, nem na escola, para discutirem questões como drogas, sexo, álcool e abandono afetivo.


Os jovens não precisam do depoimento de ex-traficante da classe alta para saber como consumir drogas, esconder de seus pais e ter acesso ilícito. Tudo isso eles fazem com destreza em sociedade permissiva e com omissão dos pais, escolas e governos. Os jovens precisam de pais que sejam atentos a seus filhos e filhas e percebam seus sinais de mudanças de hábitos, companhias, rotinas e alimentação. Precisam de escolas que discutam abertamente sexo,
drogas, violência doméstica, assédio e abandono.


As gerações que endossam cada vez mais as estatísticas de suicídio estão vulneráveis a ambientes extremamente nocivos à saúde mental. Que a dor desses filhos e filhas seja capaz de mover e sensibilizar médicos psiquiatras e psicólogos, escolas e pedagogos, governos, mas, em especial, pais e mães que deram à luz seres humanos que, por circunstâncias diversas, perdem seu brilho ao adentrarem em jornadas tão escuras. O suicídio é dor que não se repara.

Mensagem aos Pais

No próximo domingo, comemora-se, no Brasil, o dia dos pais. Parabenizo, antecipadamente, os pais que conseguem encarar de frente os desafios exigidos pela paternidade; deixo também o meu apelo para aqueles que ainda não conseguiram entender e assumir a dimensão do seu papel.

A todos os filhos e filhas que se encontram em situação de sofrimento psíquico, seja qual for sua origem, que o cuidado, a atenção, o amor e o zelo de seus pais se faça presente na superação desse sofrimento dilacerante.

Em tempo, agradeço ao jovem, talentoso e empático economista Daniel Nogueira pelo trabalho de extração dos dados nacionais fundamentais para elaboração dessa coluna.

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