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Estado de Minas PANDEMIA

'Não posso respirar: a pandemia está agravando a situação das mulheres'

'Esse ar cheio de hipocrisia envenena minha alma e sufoca minha esperança. Um pouquinho todo dia'


postado em 14/06/2020 04:00 / atualizado em 13/06/2020 07:12

(foto: Depositphotos)
(foto: Depositphotos)
Simone de Beauvoir dizia: “Basta uma crise política, econômica e religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados”.

Mais uma criança preta morreu, um menino de 5 anos que foi despachado no elevador pela patroa da mãe, sozinho. Caiu do nono andar de um prédio enquanto sua mãe passeava com o cachorro. Uma mãe preta que, mesmo durante a pandemia, se viu obrigada a trabalhar para não perder a renda, o sustento da família.

Não tinha com quem deixar o filho, as escolas estão fechadas, precisou levar o menino para o trabalho, precisou levar o cachorro para passear, porque a dona não podia fazer esse trabalho. Só podia delegar.

E há pessoas tão hipócritas, que ainda julgaram a mãe pelo ocorrido: “Se não pode cuidar, por que teve filho?” disseram. Não devem nem considerar que a mãe é gente, nem o menino. Racismo estrutural. É assim que funciona.

Eu não posso respirar. Não tem ninguém ajoelhando no meu pescoço, mas eu não posso respirar. Esse ar cheio de hipocrisia envenena minha alma e sufoca minha esperança. Um pouquinho todo dia.

Com as escolas fechadas, as crianças em casa, as mães que estão no home office se desdobram para dar conta de tudo. Muitas patroas dispensaram suas empregadas domésticas e continuam pagando o salário; afinal, é uma crise de saúde pública, ninguém está de férias. Mas nem todo mundo tem esse cuidado com as pessoas.

E a retomada econômica? Está pensando nas mães? Termina o home office, mas as aulas não voltam, o que faremos com as crianças?

Somado ao racismo estrutural, também temos o machismo estrutural, os filhos são problema das mães. Os pais voltam ao trabalho e as mães que se virem. A preocupação da maioria das mães hoje é essa. Além de estarem lidando com a sobrecarga em casa, ainda têm medo de ter que voltar ao trabalho presencial, sem ter com quem deixar os filhos. Têm medo de perder o emprego. Têm medo do vírus. Têm medo da crise econômica. Medo de ficar doente e não ter quem cuide dos filhos. Medo da censura. Medo dos danos psicológicos que as crianças vão sofrer nesse processo.

A visão machista que não pensa na desigualdade entre os gêneros ignora a função da mulher como cuidadora da família, como provedora e mantenedora. E ignora o papel social das escolas.

A verdade é que a pandemia está agravando a situação das mulheres. Deveria haver um plano específico para nós. Um plano que evite que mulheres sejam obrigadas a voltar ao trabalho quando não têm com quem deixar os filhos, para que não tenham que terceirizar a maternidade para as avós.

A verdade é que não haverá um plano específico, porque não existe empatia, porque quem está no comando não tem capacidade de se colocar no lugar da maior parte da população.

Eu já não posso respirar. Meu ar acaba quando eu vejo um adolescente ser baleado dentro de casa, uma menina ser baleada numa van, um garotinho despencar de um prédio. Quando uma mãe perde um filho dessa forma, nós perdemos mais um pouco da humanidade.

E ainda há quem critique os protestos, quem diz que toda vida importa, não apenas as negras. Quando dizemos que vidas negras importam, quer dizer que todas as vidas importam, mas que se esquecem das vidas pretas. Não diga que as pessoas protestando vestidas de preto são violentas, se esquecendo de toda a violência que elas sofrem há séculos neste país. Mortas, escravizadas, torturadas, estupradas.

Importe-se com as vitrines estilhaçadas, e ignore as vidas. Minta. Minta para si mesmo. Acredite no que lhe convém. Viva essa mentira que você criou. Não assuma seus erros. Não se responsabilize. Mantenha sua consciência tranquila. O problema são os outros.

Enquanto você vive sua bolha eu dou minhas mãos a outras mães e busco soluções pelo coletivo. Eu não posso respirar enquanto tantas mães estão sendo sufocadas. Venha aqui, minha amiga, me dê sua mão. Não estamos sozinhas. Juntas somos mais fortes. O futuro é feminino!


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