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Bolsonaro e o Congresso estão na contramão das urgências do país

Além de ignorarem a gravidade dos efeitos da COVID sobre a população, ainda propõem medidas que só vão piorar a crise sanitária e social


28/02/2021 04:00 - atualizado 28/02/2021 07:43

(foto: AFP)
(foto: AFP)
Mesmo os mais otimistas começam a concluir que do jeito que vão os acontecimentos no país não há nem haverá como esperar algo de bom. Os movimentos do presidente Bolsonaro e do Congresso estão longe de convergir para as transformações nem atendem aos anseios gerais.

Com 1.582 mortes pela COVID na quinta-feira, recorde na pandemia, 36 dias com a média móvel acima de mil vítimas diárias, a rede hospitalar nos estados colapsando, nem 4% da população vacinada... O caos de Manaus contaminou o Brasil.

E... sim, o presidente voltou a criticar em sua live semanal, na quinta-feira, prefeitos e governadores pelo fechamento do comércio e, noutra atitude surreal, letal, a bem da verdade, discorreu sobre supostos “efeitos colaterais” do uso de máscara – outra violação ao bom senso, como prescrever cloroquina e vermífugos como tratamento precoce que não há para o vírus, insensível às sequelas do que diz.

“A população quer voltar a trabalhar, mas, infelizmente, um ou outro governador, um ou outro prefeito, ainda teima em baixar decretos obrigando essas pessoas a ficar em casa”, afirmou, dizendo defender “a volta à normalidade”. Como assim? Normalidade, constatam estudos do FMI, só voltará com mais de 70% da população vacinada.

O presidente está ansioso em pôr a economia para andar e aplacar a irritação social com a bagunça da pandemia. Isso é função da falta de vacinas, do descaso com o plano de imunização e seu jeito blasé com as medidas preventivas, além do crescimento estagnado.

E o Congresso? Mais do mesmo. Na retórica, toda a prioridade é com a aquisição de vacinas onde quer que existam. Na prática, a Câmara corre para proteger os seus, após a prisão em flagrante pelo STF do deputado rufião Daniel Silveira. No dia em que a conta macabra da COVID passou de 250 mil mortes, Arthur Lira, presidente da Câmara, pôs para votar emenda constitucional sobre a imunidade parlamentar, apelidada de “PEC da impunidade”. Sinto dizer: não é advogando em causa própria que os políticos serão respeitados pela população.

Desumanismo dos ortodoxos

Dos temas que importam neste início de ano nada supera a reedição do auxílio emergencial, que venceu em dezembro, dando R$ 300 a cada trabalhador informal. O imbróglio é que os senhores do governo e do Senado, onde se dá a discussão, esqueceram-se do que levou o Congresso a criar o auxílio, inicialmente com valor de R$ 600.

Garantir uma renda mínima a trabalhadores subitamente precarizados pelas medidas de distanciamento social e o fechamento de atividades foi uma das motivações. Mas havia outra tão relevante quanto: dar a essa população, cujo contingente é o dobro da mão de obra formal, uma proteção para também se proteger e a seus familiares.

O auxílio salvou vidas e voltará a salvar quanto antes o Congresso o reedite, ainda que em valor e prazo menores (Bolsonaro falou em R$ 250 por quatro meses). Uma ação sanitária e humanitária não tem de ter condicionalidades, mas foi o que o ministro Paulo Guedes exigiu e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, acatou. Pelo clima entre seus pares, terá de mudar de ideia, sequela do fiscalismo delirante que há 40 anos exaure o crescimento econômico e amplia a pobreza.

Desprezo dos libertários

Guedes alega que o mercado financeiro está tenso com a evolução da dívida pública, que tem sido a forma de o governo bancar qualquer gasto novo, já que o orçamento federal é deficitário desde 2014. Ok, cabe discussão, mas não propor ao Congresso que quebre consensos do pacto social inserido na Constituição para liberar recursos fiscais e com eles bancar parte do custo do novo auxílio.

Faz sentido, se há teto de expansão do gasto público (que só pode crescer desde 2016 pela inflação anual), congelar aumento salarial do funcionalismo e concursos públicos. Isso está na PEC Emergencial – plano de Guedes enviado ao Senado para manter o teto do gasto e reverter o déficit orçamentário. Mas há também ranço ideológico no plano.

Ele acredita que a economia estagnada decorre do Estado inchado e de transferências de renda instituídas por governos de esquerda, ou social-democratas, já que sua visão ideológica é libertária, segundo a qual o Estado é sempre problema, não parte da solução. E é assim que a PEC que o Senado quer votar em troca do auxílio emergencial extingue com os mínimos constitucionais aplicados na educação e na saúde, duas das áreas mais desassistidas e prioritárias do país.

Sandice tecnocrática

A tendência do Senado é deixar de lado essa sandice tecnocrática, ao apreciar a volta em versão compacta do auxílio aos informais, e é bom que o faça. A gravidade da pandemia escalou, não há vacinas em quantidade e o Ministério da Saúde não consegue negociar com os laboratórios nem sabe articular o SUS, que sempre foi competente nos planos de imunização. Ou seja, a desídia vai seguir matando. Mas melhor ainda será o Congresso considerar qual o sentido de uma política econômica que trata o Estado como obstáculo do crescimento e não agente da solução. Imagine um condomínio sem administração: vira pardieiro e quebra rapidinho. Liberdade individual é da porta para dentro. Da porta para fora, prevalece o interesse comum.

Precisamos de criatividade

Mais que de um plano, a saída do enrosco em que nos enfiamos há 40 anos exige governantes aptos, políticos pragmáticos e voltados ao bem comum, nem que seja um pouquinho, e empresários conscientes de que a motivação dos gestores de títulos não traduz as necessidades nem as prioridades da economia real e de seus constituintes.

A verdade, como diz a economista chefe do francês Crédit Agricole, Isabelle Job-Bazille, é que a pandemia realçou “a importância da intervenção do Estado, de um lado, com pacotes de emergência para proteger empregos e capacidade produtiva, para evitar destruição excessiva e, de outro, estímulos para apoiar realocação setorial e adaptar as competências aos empregos do futuro”.
Em suma: precisamos de criatividade, não da ortodoxia que nos fez um país interrompido. A pandemia só agravou o que já estava ruim.

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