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Convite à reflexão: estamos em meio a um passeio ao acaso desde muito antes da pandemia

Teto de gasto não existe para desossar o Estado, mas para rever sua governança e prioridades


09/08/2020 04:00 - atualizado 08/08/2020 21:38

O presidente Bolsonaro zombou da COVID-19 e seu governo demonstra total incapacidade de enfrentar a crise(foto: Evaristo Sá/AFP )
O presidente Bolsonaro zombou da COVID-19 e seu governo demonstra total incapacidade de enfrentar a crise (foto: Evaristo Sá/AFP )

A cacofonia de versões sobre os rumos da economia, potencializada pela dessintonia entre as necessidades do país e a incapacidade do governo em atendê-las, exacerba o sentimento de que estamos em meio a um passeio ao acaso desde muito antes da calamidade da pandemia.

Com 100 mil mortes em cinco meses causadas pelo vírus, que não era “gripezinha” como quis mitigar o presidente Jair Bolsonaro e, sim, uma tragédia que revelou a miséria da governança pública e a baixa estima nacional, a questão de fundo vai muito além de uma vacina salvadora para “tocar a vida e buscar uma maneira de se safar desse problema”, conforme a sua última manifestação de indiferença.

Esse descaminho aflorou mais uma vez com as pressões de setores do governo, em conluio com políticos e grupos empresariais acostumados a ordenhar o Tesouro, para explodir o dispositivo inserido em 2016 na Constituição pelo Congresso, limitando a expansão anual do gasto público federal à inflação de 12 meses. O mecanismo foi a forma de conter o crescimento automático e desordenado da despesa fiscal, de modo a forçar a discussão sobre a governança do Estado brasileiro.

Como medida de gestão da macroeconomia foi ruim, especialmente ao enfiar o investimento público numa camisa de força por 20 anos, com revisão em 2026. Grupos contrários à atuação estatal na organização social a interpretaram literalmente, fazendo do “teto do gasto” uma ordem para a liberalização absoluta da economia, não para induzir a discussão sobre a gestão e as prioridades do setor público.

Esse é o contexto dos que vêm forçando desde o começo do segundo mandato de Dilma Rousseff o chamado “ajuste fiscal” – na prática, o corte linear de despesas. É conveniente que assim seja para quem se arroga detentor de direitos e regalias, como a elite da burocracia e os grupos empresariais favorecidos com desonerações de impostos e tarifas protecionistas sem avaliação de seu custo e benefício.

Ao confundir a sociedade sobre as razões de o déficit público ter se tornado recorrente desde 2014, os lobbies fiscalistas desidratam as rubricas dos fundos que suprem os programas e políticas em favor dos mais fracos para salvar suas prebendas graças ao juízo validado pelo STF do direito adquirido. Essa é a discussão que urge fazer.

Estado fraco é besteirol

A discussão relevante é a da governança do Estado, sem a qual não se terá jamais a subordinação dos interesses de seus gestores e dos políticos acumpliciados, o que inclui o presidente da República, às prioridades da sociedade, ajustadas às tendências tecnológicas e da geopolítica. Não há país nenhum bem-sucedido com o Estado fraco, o que não implica Estado grande, mas governança forte e controlada.

Esse é o conflito que se põe no momento. A ala dita neoliberal do governo conflita com os ditames de proteção social da Constituição ao pretender o ajuste fiscal sem propor outra governança, enquanto a maioria do Congresso, que se move pelos valores sociais-liberais, reivindica reformas como a administrativa e a tributária.

A votação avassaladora de 499 votos entre 513 deputados do fundo da educação básica, o Fundeb, mostrou que tal parte da Constituição é inegociável. Tanto que se começa a estudar a conversão do auxílio emergencial provisório numa renda básica permanente. Antes há muito empecilho a reformar, menos pela eventual trajetória de risco que o gasto público possa assumir, mas pela necessidade crucial da volta do crescimento econômico. Ele não virá pela confiança do mercado.

Como tirar o bode da sala

Em algum tempo, e quanto antes melhor, o teto de gasto terá de ser removido. Mas antes o RH do funcionalismo terá de ser modernizado, com restrição da garantia de emprego a carreiras de Estado, fim dos aumentos automáticos de salários e gratificações, criação de regras de desempenho, aproximando-as das aplicadas ao resto da sociedade.

Será preciso também outro regime de concessão de serviços e obras à iniciativa privada. Hoje, agências de controle e os ministérios contratantes carecem de quadros aptos e dissociados de interesses políticos. Foi mais inépcia dos gestores que um desejo atávico de delinquir que levou aos crimes apurados pela Lava-Jato.

E não será o senso do lavajatismo, criminalizando a política, que enfrentará a corrupção no Estado. É com tecnologia e a governança renovada, que inclui reaver as hierarquias das cadeias de comando do Estado, que se combate a corrupção, além de muita transparência.

Outra coalizão à vista

No fim, o que se assiste no país, isso quando deixamos de lado as folias de Bolsonaro e seus cruzados da “guerra cultural”, é à falta de um sistema de planejamento adaptado a um mundo em que mudanças e ameaças são contínuas. Nada a ver com o planejamento criado no pós-guerra para regular economias de comando e controle. Isso acabou.
Também é preciso ir além da estratificação entre os modelos fiscal e monetário apartados. O teto de gasto não tem de ser mantido para algemar o ativismo fiscal, é para levar o Congresso a rever, como recomenda o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, o orçamento refém de lobbies públicos e privados. Mas aí, o Banco Central elevará os juros, dirão os tementes da seita fiscalista. Não necessariamente.

A taxa de juro é a que deseja o BC, como o Fed ensina, e o risco de inflação pode ser controlado com imposto para reduzir pressões de demanda (por isso a flexibilidade tributária é essencial), além de indicar oportunidades de investimento para contemplar a oferta.

É outra política econômica. E é outra coalizão política, mais sintonizada com a maioria moderada do país e os anseios sociais.

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