
As desgraças anunciadas são tantas, tão constantes e tão conhecidas que acabam se transformando em acontecimentos corriqueiros, comuns. Diante disso, as boas notícias se tornam fontes de esperança, de luz, de agradecimento. Na semana que passou, recebi boas notícias de amigas minhas, uma mensagem de que viver, mesmo passando por tantas agonias, continua muito bom.
Uma delas relatou quase um ano de sofrimento para recuperar movimentos, fala, a vida. O marido foi comunicado por três vezes de que devia correr para o hospital, porque ela estava morre não morre. Passou raspando e está aí, pronta para viver alegremente com a família, comemorar com os amigos, agradecer a lição de vida que ganhou. E para comemorar o aniversário, estava seguindo com a família para passar um fim de semana na praia.
A outra conta que vai vencer a cadeira de rodas, onde está graças ao tratamento que recebeu do respeitado e famoso Frederico Tadeu, seu médico de longa data, que conseguiu resgatá-la com vida e muita esperança das profundezas da vida hospitalar, onde ficou por mais de mês. Como a cabeça está boa, conversamos por longo tempo e a vontade dela é encontrar-se de novo com os amigos, reunir-se para almoços em restaurantes, onde a prosa é colocada em dia, assim como os acontecimentos – mesmo os poucos.
Esses casos levantam o humor de quem os escuta. O meu, familiar, é também um exemplo de que nem tudo está perdido, que a esperança e os cuidados conseguem, muitas e muitas vezes, vencer a desgraceira que foi jogada sobre o mundo. Já contei aqui o caso de meu sobrinho, que chegou morrendo ao Mater Dei, saiu de lá recuperado, voltou depois com uma pneumonia e voltou a sair novamente sem nenhum problema. Seu caso é único, porque, mesmo no hospital, não perdeu a vontade de provar ótimos pratos, canja de galinha do restaurante do Minas Tênis, mais esse ou aquele prato, conseguido nesse ou naquele restaurante.
Sonhar com isso também ajuda a curar. Meu sobrinho está absolutamente em forma de novo, recebendo parentes para um churrasco que ele mesmo prepara e contando que está nadando todo santo dia 40 metros de mergulho, 20 para cada lado da piscina. Como a sua necessidade é reforçar o pulmão, tem conseguido ir muito bem. E por causa disso, viaja, já foi algumas vezes para a praia com a família, faz exercícios todo santo dia.
Vou contando essas coisas porque já estou mais do que farta de casos em que o fim dos personagens é o definitivo. Engraçado é notar que o interesse da maioria é escutar fatos letais, casos de esperança e recuperação causam pouco sucesso. Nem chego a saber se é para exorcizar o que pode acontecer com quem escuta, com a família ou com amigos queridos. Momentos de alegria, mesmo poucos, são uma terapia muito melhor para qualquer doença do que só coisa ruim. Mas esse clima de terror ocupa todos os meios de comunicação, públicos ou particulares – coisa boa ninguém gosta de contar.
Os crimes e mortes daqui e do exterior adquiriram importância vital para os noticiários – crianças morrendo na Faixa de Gaza é um fato dramático, que não passa em branco. Mas se formos trazer esse extermínio infantil para nosso lado, quantas crianças morrem por aqui? Nem só de bala perdida, mas de fome, de doenças não tratadas, de abandono no próprio lar.
Vacinada que estou, tomo meus cuidados. Mesmo assim, minha casa nunca deixou de funcionar como sempre. Cumpro minhas obrigações domésticas sem nenhum medo ou apavorada, com o medo de a COVID estar fora dos meus portões, esperando para me pegar tão logo coloque o nariz na rua. No fundo mesmo, acredito que esse pavor de adoecer durante tanto tempo provoque mais ou igual mal que a pandemia. Afinal, ninguém aguenta ficar tanto tempo vivendo com terror.
