Centro de convivência da Cidade Administrativa vazio: nos "bons tempos", segundo servidores, o local era um formigueiro -  (crédito: Leandro Couri/EM/D.A Press)

Centro de convivência da Cidade Administrativa vazio: nos "bons tempos", segundo servidores, o local era um formigueiro

crédito: Leandro Couri/EM/D.A Press

Era meio-dia de ontem quando o restaurante da Dona Iraci, próximo à Cidade Administrativa de Minas Gerais, começou a servir o almoço. Diferentemente do que ocorria até a semana passada, desta vez havia poucos clientes nas mesas, efeito do decreto do governador Romeu Zema (Novo), que colocou milhares de servidores em home office até que seja resolvido o problema dos elevadores nos prédios Minas e Gerais. Sem servidores, havia bem menos clientes no restaurante.

 

Iraci Ferreira Rodrigues, proprietária e cozinheira, contou à reportagem que a Cidade Administrativa foi fundamental para o seu negócio no Bairro Serra Verde, região de Venda Nova, uma vez que dos 100 clientes que ela atende nos “melhores dias”, a maioria é de servidores.

 

O estabelecimento existe há 24 anos, bem antes do início da construção do complexo desenhado pelo arquiteto Oscar Niemeyer, e está em um ponto privilegiado para os servidores. “Eu peguei o ponto desde o início e a gente sempre teve um movimento bom”, disse.

 

Iraci ressalta que, nos três primeiros dias sem os servidores, a queda no movimento já foi acentuada, mas espera que os problemas sejam resolvidos com agilidade. “Desde que pessoal me descobriu vem muitos clientes de lá (Cidade Administrativa), mas agora só resta esperar em Deus e no nosso governador”, emendou.

Quem trabalha na Cidade Administrativa consegue chegar no restaurante em menos de 10 minutos. A linha 02 do ônibus interno, que faz o transporte gratuito de servidores e visitantes, tem um ponto a menos de 100 metros de distância do estabelecimento. Em dias comuns, os trabalhadores do estado costumam ir em grupos almoçar no self-service “à vontade” por R$ 18, ou podem optar por uma feijoada a R$ 20.

 

Ainda a poucos metros dali, o restaurante Rancho Mineiro, na avenida principal do Serra Verde, também recebe um fluxo significativo de servidores do estado. A dona do estabelecimento, Alessandra Aparecida de Oliveira Santos, soube recentemente que os elevadores dos prédios Minas e Gerais tiveram problemas.

 

“Com o pessoal trabalhando em casa, o movimento dos restaurantes e do comércio cai, eu não diria que caiu bastante, mas deu para sentir a falta de alguns clientes. O número de marmitex entregues lá também caiu, não foi muito, mas era o suficiente para me deixar feliz”, explicou a comerciante, ainda com bom-humor.


Alessandra trabalha na região há sete anos. Antes de abrir o seu restaurante, há três anos, era cozinheira no estabelecimento vizinho, que foi inaugurado pouco tempo depois da Cidade Administrativa. “Não é porque eu trabalhava lá, mas uns quatro anos atrás era o melhor restaurante do bairro. Lotado, inclusive atendia muito a Cidade Administrativa”, contou.

 


A expectativa da gestão do governador Romeu Zema (Novo) é de que as obras de reparo nos elevadores interditados nos prédios Minas e Gerais sejam concluídas no fim do segundo semestre deste ano. Assim, é possível que a totalidade dos servidores só volte ao trabalho presencial em 2025.

 

Até lá, Alessandra demonstra otimismo para que o problema seja resolvido com celeridade. “Vamos romper na fé e acreditar que vai mudar, que vão resolver o problema dos elevadores e o povo vai voltar. Além de todo mundo precisar trabalhar, acredito que não é todo mundo que gosta de ficar em casa resolvendo um monte de pepino”, completou.

 

Apesar de a região ser majoritariamente residencial, com muitos prédios, condomínios populares e casas, outros serviços também são impactados pela queda no fluxo de pessoas transitando.

 

A Cidade Administrativa fica de frente para a MG-010, uma das principais rodovias de Belo Horizonte e que liga a capital a Lagoa Santa, na Região Metropolitana. No posto de combustíveis Jockey, que fica em frente ao complexo administrativo e ainda carrega o nome do antigo Jockey Club que funcionava antes da inauguração dos prédios, em 2010, a queda no movimento é estimada entre 10% e 15%. “Eu tinha um gargalo no horário de almoço, mas perdi um pouco", afirmou Reinaldo Leite de Souza, gerente do estabelecimento.


A mesma queda exerce influência no Mercadinho Mineiro, um restaurante que fica na parada do posto, e que também funciona como um empório de doces, queijos e outros produtos mineiros. "Notamos sim uma diminuição da movimentação, principalmente no horário de almoço", lamentou a gerente Bianca Larissa Lima.

 

Dentro da Cidade

Quando foi idealizada ainda durante o governo de Aécio Neves (PSDB), a Cidade Administrativa contava com um Centro de Convivência que servia para atender a população de servidores e terceirizados que trabalham no espaço. Hoje, o espaço tem restaurantes, sorveterias, mercadinhos, salões de beleza, lojas de roupa adulta e infantil, lojas de doce, farmácia e até agências bancárias e dos correios.


Entre os prédios Minas e Gerais, o clima de apreensão é ainda maior. Na avaliação dos trabalhadores que conversaram com a reportagem, ainda há muita incerteza e poucas informações concretas sobre como vai funcionar o expediente na Cidade Administrativa, o que limita as possibilidades de estratégias comerciais.

 

Um dos lojistas, que preferiu não se identificar temendo problemas contratuais, relatou que o movimento de servidores no espaço já caiu desde a pandemia de COVID-19, quando o governo teve que instituir um regime de trabalho remoto devido à crise sanitária. Agora, ele teme que o novo problema se estenda por muito tempo. “Antes da pandemia, dava meio dia e isso aqui parecia um formigueiro de tanta gente. O movimento já vem fraco faz um tempo, a impressão é que muitas pessoas não retornaram ao trabalho na Cidade Administrativa. Agora, espero que esse problema dos elevadores não dure muito, mas a perspectiva é ruim”, disse.

 

Pane

Na verdade, o problema dos elevadores veio à tona em novembro de 2023, quando um servidor de 66 anos, lotado na Secretaria de Estado de Saúde (SES), teve um mal súbito e morreu ao subir 13 andares de escada do edifício Minas, após uma pane elétrica danificar os equipamentos. “Antes era só um prédio com problema, agora são os dois, imagine só. Até licitarem e fazerem as obras de reparo vai demorar muito”, completou o trabalhador.

 

Um laudo da perícia que vistoriou os elevadores apontou que, na construção da sede do poder Executivo mineiro, os pilares metálicos dos contrapesos dos elevadores não foram chumbados conforme projeto. Isso resultou em um espaço vazio entre a viga de concreto armado e as chapas de fixação dos pilares, provocando um efeito “pino”. Por isso, é preciso reforçar todos os pilares metálicos dos contrapesos dos elevadores.

 

Segundo o governo de Minas, os órgãos sediados no complexo foram convocados a responder um questionário, no menor prazo possível, informando as logísticas e rotinas dos servidores, incluindo a necessidade ou não do trabalho presencial. O levantamento vai orientar o teletrabalho, além de ajudar a Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag) a avaliar um novo layout de trabalho nos primeiros andares dos prédios.

 

A Seplag ainda informou que mantêm contato com os prestadores de serviço do Centro de Convivência para avaliar as condições de funcionamento das atividades, mas somente após o levantamento que serão traçadas “diretrizes relativas a eventuais alterações no funcionamento dos comércios instalados no complexo – bem como do transporte coletivo que atende o local. Quaisquer possíveis mudanças devem seguir as previsões contratuais”. (Colaborou: Thiago Bonna)