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Estado de Minas RAUL VELLOSO

Como sair do impasse fiscal

Os déficits previdenciários explodiram e continuarão no mesmo tipo de trajetória até o momento em que os investimentos pura e simplesmente ameaçarem zerar


17/10/2023 04:00 - atualizado 17/10/2023 08:43
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Avenida Paulista, em São Paulo
Chama a atenção o caso do estado de São Paulo (foto: Ser Lunar/Flickr)
Ao examinar a execução orçamentária de algum ente subnacional, disponível pelo menos para os três últimos quinquênios seguidos nos conhecidos relatórios RREO, o que se vê é que os déficits previdenciários passaram a assumir uma clara tendência ascendente, a se manter inalterada quando se adicionarem projeções das variáveis oriundas de estudos atuariais disponíveis. Ou seja, os déficits explodiram e continuarão no mesmo tipo de trajetória até o momento em que os investimentos pura e simplesmente ameaçarem zerar (quando, obviamente, se caracterizará um certo impasse na gestão pública respectiva), ou a menos de medidas adotadas em tempo para evitar isso.

A citada desabada dos investimentos em infraestrutura decorre, em adição, de a capacidade de endividamento dos entes públicos brasileiros ter simplesmente desaparecido nos últimos tempos. Ou seja, uma curva sobe e a outra desaba bastante, em que pese o empenho na direção oposta que se note de parte de dirigentes, simplesmente porque o investimento em infraestrutura costuma ser o item mais flexível dos orçamentos públicos...Uma óbvia consequência disso é a queda das possibilidades de crescimento do PIB no mesmo período considerado. Sem disposição privada para substituir a parcela pública da taxa de investimento à altura, quanto menos infraestrutura pública, bem menor o crescimento do PIB, e tudo de ruim que isso implica.

Chama a atenção o caso do estado de São Paulo. Perguntou-se em que ano os investimentos tenderiam, ali, a zerar, supondo dois cenários de evolução da receita, tudo o mais constante ou conforme projetado em estudos acreditados. No primeiro, não haveria receitas extraordinárias, enquanto no segundo, realizado dois anos depois, haveria uma receita extraordinária em São Paulo de R$ 30,3 bilhões em 2021, que de fato aconteceu no exercício realizado. Nessas condições, sem receita extra, os investimentos zerariam em 2025, e, com o bônus de R$ 30,3 bilhões, se reduziriam de um máximo de R$ 27 bilhões, em 2022, para R$ 10,8 bilhões em 2032, mas sem chegar a zerá-los em um período de uma década.

Ocorre que esse último valor representaria cerca de um terço do valor máximo obtido anteriormente, algo difícil de imaginar como viável em um estado com as demandas de São Paulo. Diante disso, sem acesso a crédito público farto, realmente não há saída: os entes subnacionais precisam equacionar seus déficits previdenciários! (Ou seja, resumidamente, zerá-los ano a ano, e também o passivo atuarial, este calculado para o final de um certo período).

O roteiro completo de como fazê-lo, hoje na verdade obrigatório pela Constituição, supera o espaço aqui disponível. Nada obstante, a chamada segregação de massas surgiu como a grande solução de transição, e envolvia a criação de dois fundos. O primeiro seria um fundo capitalizado jovem que se constrói para já nascer equilibrado financeira e atuarialmente, bastando fixar as contribuições patronal e dos servidores com alíquotas adequadas, calculadas atuarialmente, e adotando regras de benefícios próximas das que são adotadas atualmente pela União. O segundo seria um fundo financeiro temporário, em repartição simples, que nasceria deficitário, mas, na sequência, por não absorver novos entrantes, entraria automaticamente em extinção dentro de algumas décadas, completando a sinalização da busca do equacionamento do problema previdenciário que sempre se afiguraria desejável.

Em resumo, tudo se passaria como se estivesse sendo feita a transição gradual do velho regime de repartição simples, tipicamente desequilibrado, que entraria em extinção, para um novo regime capitalizado e equilibrado, que assumiria o seu lugar. Só que o custo dessa transição, relativamente à situação sem mudança, poderia ficar bastante elevado durante um certo período inicial, pois o ente público em causa teria que arcar com montantes equivalentes aos das receitas dos servidores ativos e das suas próprias que migrariam para o fundo previdenciário e não mais seriam usadas no pagamento dos benefícios do fundo financeiro.

A dificuldade de administrar essa situação – daí a desistência de muitos – levou à ideia de se fazer uma transferência dinâmica de vidas, pela transferência de pessoas que até então tivessem seus benefícios pagos pelo fundo financeiro para o fundo previdenciário, de preferência os mais idosos. Com isso, parte dos recursos financeiros acumulados no fundo receptor, então em excesso no curto prazo, visando a cobrir necessidades futuras de pagamentos de benefícios desse fundo, seria redirecionada para arcar com esse ônus, tirando-o das costas do tesouro do ente. Todavia, essa transferência geraria um déficit atuarial do fundo capitalizado e faltaria dinheiro no futuro para pagar as aposentadorias dos mais jovens. Para resolver esse problema, faz-se necessário, de forma concomitante com a transferência de vidas,  promover um aporte de ativos e, posteriormente, promover sua monetização. Daí a transição passar a ser algo simples de fazer.

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