DOENÇA INFECCIOSA

Bactérias, entre elas 'Salmonella', dizimaram exército de Napoleão

Descoberta ocorreu a partir de fragmentos do DNA dos patógenos presentes nos dentes de 13 soldados do exército napoleônico

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SÃO CARLOS, SP (FOLHAPRESS) - O exército de meio milhão de soldados reunido pelo imperador francês Napoleão Bonaparte (1769-1821) para invadir a Rússia foi praticamente exterminado durante sua retirada, e uma das razões para o desastre foram doenças infecciosas causadas por bactérias, entre elas a Salmonella enterica, temida até hoje por sua presença em certos alimentos.

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A conclusão vem de um estudo que obteve fragmentos do DNA dos patógenos (causadores de doença) nos dentes de 13 soldados do exército napoleônico, os quais foram sepultados na Lituânia durante o recuo do imperador em dezembro de 1812. Além da Salmonella, pesquisadores do Instituto Pasteur, em Paris, identificaram também o material genético do micróbio Borrelia recurrentis.

Essa segunda espécie bacteriana é causadora da chamada febre recorrente epidêmica, transmitida por um tipo de piolho que se abriga na roupa e no corpo das vítimas, e não na cabeça, como o piolho mais comum que conhecemos. Não por acaso, restos desse bicho tinham sido achados junto ao corpo dos soldados.

Detalhes da análise foram publicadas nesta sexta-feira (24/10) na revista especializada Current Biology. A equipe francesa, liderada por Rémi Barbieri, da Unidade de Paleogenômica Microbiana do Pasteur, trabalhou em parceria com colegas do Reino Unido e da Estônia. O grupo analisou uma vala comum da época da invasão napoleônica que foi descoberta em Vilnius, a capital lituana, em 2001. Após várias fases de escavação, a estimativa é que ao menos 3.269 indivíduos tenham sido sepultados ali.

Já se sabia que cerca de 70 mil homens do exército imperial tinham chegado à região no começo de dezembro de 1812, fugindo do território russo propriamente dito. As escavações mostraram que soldados e cavalos, em muitos casos, tinham sido enterrados juntos, com os homens ainda usando seus uniformes, mas sem armas. "Homens", aqui, é a descrição exata, porque quase 99% dos esqueletos foram identificados como pertencentes ao sexo masculino. Cerca de 85% deles têm idade estimada entre os 20 e os 50 anos.

Além disso, não foram identificados sinais de morte violenta, causada por instrumentos cortantes e perfurantes ou por armas de fogo, em nenhum dos corpos. Tudo isso se encaixa nos relatos históricos segundo os quais a imensa maioria dos soldados de Napoleão não pereceu em combate, mas sim por causa das condições brutais do inverno russo, que trouxe fome, exaustão e, provavelmente, diversas doenças associadas às condições precárias dos acampamentos.

As forças lideradas por Napoleão, conhecidas como "Grande Armée" em francês, tinham invadido a Rússia em junho daquele mesmo ano (portanto, no começo do verão no hemisfério Norte). De início, apesar de já sofrer muitas baixas, Napoleão conseguiu avançar até 110 quilômetros de distância de Moscou, onde enfrentou as forças do Império Russo na batalha de Borodino no começo de setembro. O combate, porém, terminou num impasse, e forças substanciais da Rússia conseguiram escapar.

Sem se render, os russos abandonaram e incendiaram Moscou, e, com poucos suprimentos e abrigos, Napoleão se viu forçado a iniciar a retirada. Seus homens passaram a sofrer com as condições climáticas e com ataques de guerrilha do inimigo, perecendo numa proporção ainda maior do que na jornada de ida.

Ao obter amostras dos dentes dos soldados, a equipe do Instituto Pasteur verificou que havia fragmentos do DNA das bactérias com tamanho e danos moleculares compatíveis com material genético de origem antiga, e não contemporânea (o que acontece é que, com o passar do tempo, as moléculas de DNA sofrem alterações já conhecidas em outros estudos de paleogenômica, o que ajuda a confirmar que não se trata de uma contaminação dos esqueletos com micróbios atuais).

Havia várias hipóteses sobre doenças que poderiam ter vitimado as forças napoleônicas com base em relatos de médicos que acompanharam a expedição, estando no topo da lista o tifo, também associado a infecções bacterianas. Com base na análise, porém, os pesquisadores chegaram à conclusão que, além da febre recorrente epidêmica, as tropas de Napoleão sofreram também com a chamada febre paratifoide, causada pelo subtipo de Salmonella pertencente à linhagem Paratyphi C.

A doença é transmitida por meio de comida ou água contaminada por fezes de doentes e traz sintomas não muito específicos, como febre, dor de cabeça, manchas na pele, fraqueza, perda de apetite, diarreia e vômito. O relato de um dos médicos do exército indica uma possível causa para a transmissão da doença em Vilnius. Ele relata que, em muitas casas da cidade, os soldados acharam grandes barris de beterraba salgada em conserva, e, famintos, devoraram o vegetal, além de beber o líquido da conserva.

Os autores da pesquisa destacam ainda que provavelmente outras doenças devem ter contribuído para a mortandade das forças napoleônicas.

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