Câncer colorretal em alta: congresso debate prevenção, IA e novas terapias
Evento destaca uso de inteligência artificial na colonoscopia, biópsia líquida, aumento da incidência entre jovens, cirurgia robótica e rastreamento precoce
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Com perspectiva no aumento do número de casos de câncer colorretal em mais de 20%, chegando a 71.040 até 2040, segundo a Fundação do Câncer, as novidades no diagnóstico com auxílio da inteligência artificial, no tratamento com imunoterapia e na condução da doença com o protocolo Watch and Wait serão alguns dos destaques do 73º Congresso Brasileiro de Coloproctologia, que acontece em São Paulo, de 3 a 6 de setembro, e deve reunir cerca de 1,9 mil especialistas.
Organizado anualmente pela Sociedade Brasileira de Coloproctologia (SBCP), o congresso traz também as orientações mais atualizadas de prevenção do câncer colorretal e a discussão sobre os motivos que têm levado sua incidência a aumentar em todo o mundo entre pessoas abaixo de 50 anos.
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Na quarta, dia 3, os médicos participam de cursos teóricos, teórico-práticos e assistem a cirurgias ao vivo no Hospital Israelita Albert Einstein, Unidade Morumbi. De quinta a sábado, 4 a 6, se reúnem no WTC Events Center para as plenárias, que contam com 15 palestrantes internacionais e mais de 200 experts brasileiros.
"O câncer colorretal terá bastante destaque, pois é o segundo mais prevalente na população brasileira e vem aumentando significativamente, inclusive entre os mais jovens", afirma o presidente da SBCP, Sergio Alonso Araújo, que também é diretor médico da área cirúrgica do Hospital Israelita Albert Einstein. Esse é o terceiro tipo de tumor que mais mata no país. De acordo com o INCA, são esperados 45.670 novos casos para 2025.
“Será um evento de nível muito alto, com duas plenárias robustas acontecendo ao mesmo tempo”, afirma o presidente da comissão científica, Rodrigo Oliva Perez. “A SBCP é uma sociedade bastante conhecida no mundo. Somos a segunda maior e temos uma ótima contribuição acadêmica na especialidade”, acrescenta o médico que, junto com a coloproctologista Angelita Habr-Gama, foram dois dos três únicos brasileiros incluídos na lista dos cientistas mais influentes do mundo pelo ranking Top 2% Scientists, elaborado pela Universidade de Stanford.
O congresso também abordará outras doenças prevalentes do intestino grosso e do reto. Entre elas, destacam-se a doença hemorroidária, uma das mais comuns na população; as doenças inflamatórias intestinais, como a doença de Crohn e a retocolite ulcerativa, que afetam principalmente jovens adultos e podem ser bastante incapacitantes; a incontinência fecal, condição cercada por tabus e que ainda gera vergonha em muitos pacientes; além da constipação intestinal, outro problema recorrente e impactante na qualidade de vida.
Março Azul: campanha anual realiza rastreamento sobre a doença
Um dos destaques da programação sobre o câncer colorretal será a sessão Março Azul de prevenção à doença, marcada para quinta-feira, dia 4, das 10h50 às 12h. O painel abordará as atualizações nas recomendações de prevenção primária, o papel do diagnóstico genético, a predisposição hereditária e os resultados de campanhas anuais realizadas em pequenas cidades, que incluem a aplicação de testes de sangue oculto nas fezes — exame inicial que, se positivo, leva à indicação de colonoscopia. No mutirão de 2025, realizado na Cidade de Goiás, 51% dos pacientes que fizeram colonoscopia apresentaram lesões, como pólipos, e foram identificados quatro casos de câncer colorretal em estágio avançado.
"Cerca de 60% a 70% dos casos de câncer colorretal no Brasil ainda são diagnosticados em estágio avançado. Precisamos desenvolver políticas públicas para mudar esse cenário e a campanha Março Azul joga luz sobre esse tema todos os anos. Nossos mutirões mostram que é possível prevenir realmente o câncer colorretal", ressalta o presidente da SBCP.
Na palestra Câncer colorretal de início precoce: o que sabemos, o coloproctologista Fábio Guilherme de Campos, professor da Faculdade de Medicina da USP, vai abordar o crescimento da doença entre os adultos jovens. “Nos últimos anos, existe uma tendência global em que a incidência do câncer em indivíduos abaixo de 50 anos tem aumentado de maneira significativa. O crescimento do câncer acima dos 50 anos está diminuindo ao passo que o crescimento populacional de indivíduos abaixo de 50 anos que podem desenvolver câncer de intestino está aumentando. Essa é uma preocupação muito grande porque muitos não procuram o médico e menosprezam os sintomas", afirma.
Enquanto os estudos que justifiquem as causas do aumento dessa maior incidência na população não trouxerem todas as respostas, médicos e a população devem conhecer esse fato e concentrar esforços em uma prevenção dirigida a essa faixa etária. “Conhecer sua história familiar, dar atenção a seus sintomas e realizar exames de prevenção são fundamentais”, adiciona Fábio Guilherme.
Durante o evento, haverá espaço também para discutir novidades de diagnóstico como a biópsia líquida, exame de sangue, que tem o objetivo de identificar o DNA tumoral circulante (ctDNA) na corrente sanguínea de pacientes com câncer colorretal ou com pólipos avançados, que são as lesões pré-cancerosas. Estudos apontam que o exame tem eficácia de 83%.
“A análise de ctDNA torna-se uma abordagem promissora em oncologia, pois permite que os médicos identifiquem alterações genéticas específicas associadas ao tumor, monitorem a evolução da doença e detectem recidivas precoces. Além disso, essa técnica pode ser menos invasiva do que biópsias tradicionais, já que envolve apenas a coleta de sangue”, salienta Isabela Elias, membro titular da SBCP, que participará da sessão.
Destaques internacionais
“Entre os destaques internacionais, Julio Garcia Aguilar, do Memorial Sloan Kettering, de Nova York, que está envolvido no principal estudo e ensaios clínicos de preservação do intestino no caso de câncer”, conta Rodrigo Oliva Perez.
Julio Garcia Aguilar é autor do OPRA (Organ Preservation in Patients With Rectal Adenocarcinoma Treated With Total Neoadjuvant Therapy), que discorre sobre o protocolo Watch and Wait, no qual se ministra quimioterapia e/ou radioterapia, sem cirurgia para retirada do reto.
Chefe do Serviço de Cirurgia Colorretal do Memorial Sloan Kettering, também vai compartilhar dados do seu estudo sobre o uso de imunoterapia para tratar o câncer colorretal. A imunoterapia dá ao paciente ferramentas para que seu sistema imune lute contra o câncer, sem a necessidade de quimioterapia, radioterapia ou cirurgia.
Rocco Ricciardi, autor da meta-análise recém-publicada COMPARE, a mais importante ao comparar as diferenças e benefícios entre as cirurgias robóticas, laparoscópicas e aberta no tratamento do câncer, vem ao evento apresentar as conclusões do estudo. O COMPARE incluiu cerca de 230 trabalhos (estudos randomizados, coortes prospectivas e análise de bancos de dados) com mais de 3,9 milhões de casos operados em 22 países em sete tipos diferentes de cirurgias oncológicas (pulmão, próstata, cólon, rim, útero, pâncreas e reto).
“O estudo mostra uma evidência de alto nível que gera um alto grau de recomendação da cirurgia robótica no tratamento do câncer de intestino entre outros”, pontua Sérgio Araujo. O Brasil é o país com mais sistemas robóticos na América Latina - são cerca de 160, sendo o México o segundo, com 40. Em agosto deste ano, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) aprovou a cirurgia robótica para a retirada da próstata no SUS, abrindo o caminho para que outras doenças também sejam contempladas.
Outro tema de relevância será a incontinência fecal, problema que acomete mais pessoas em idade avançada, principalmente mulheres. Especialista em neuromodulação sacral, Franco Marinello, de Barcelona, falará sobre o dispositivo que tem devolvido qualidade de vida a essa população.
Um problema que também acomete a terceira idade é o prolapso do reto. O autor da principal técnica cirúrgica no tratamento dessa condição estará no país - André D'Hoore, da Bélgica.
Inteligência artificial na colonoscopia
Outro tema em evidência é o uso da inteligência artificial na colonoscopia para facilitar a identificação de lesões. “A IA na colonoscopia traz ao menos três importantes benefícios: ajuda a ver mais lesões ao identificar padrões; auxilia no diagnóstico diferencial de um pólipo que precisa ser removido de uma lesão já cancerosa; e gera menos risco para o paciente e menos custo para fonte pagadora, ao selecionar melhor o que precisa ser retirado", explica Sergio Alonso Araújo, complementando que a tecnologia já está disponível em alguns centros do Brasil.
A colonoscopia é padrão-ouro no diagnóstico do câncer colorretal e na prevenção da doença, visto que é possível detectar um pólipo que pode virar câncer e retirá-lo durante o exame. A SBCP indica a realização da colonoscopia a partir dos 45 anos e, se houver casos na família, a idade de início do rastreamento deve ser conversada com o especialista.
Doenças inflamatórias intestinais: problema do século 21
As doenças inflamatórias intestinais, que nos últimos dez anos tiveram um aumento de 61% no número de internações no SUS, de acordo com dados do Ministério da Saúde, também terão destaque. Estarão no Brasil três principais cirurgiões acadêmicos do assunto: André D'Hoore, da Bélgica, Willem Bemelman, da Holanda, e Phillip Fleshner, dos Estados Unidos.
“Os três são participantes ativos dos guidelines americanos e europeus sobre o tratamento cirúrgico das doenças inflamatórias intestinais. São grandes formadores de opinião nessa área”, diz o coloproctologista Paulo Kotze, que modera a sessão sobre doença de Crohn.
Entre as principais manifestações das doenças inflamatórias intestinais estão a doença de Crohn e a retocolite ulcerativa. Uma das novidades em tratamento é a realização de cirurgia precoce na doença de Crohn. Elas têm como característica comum a inflamação do trato gastrointestinal, que pode comprometer qualquer segmento, da boca ao ânus.
“Cerca de 20% a 30% dos pacientes são elegíveis para a cirurgia precoce. Entre seus benefícios está controlar a doença por período prolongado sem o uso de medicamentos, que apresentam custo elevado e podem estar associados a efeitos colaterais”, explica Paulo Kotze.
O congresso
O 73º Congresso Brasileiro de Coloproctologia é o maior congresso da especialidade na América Latina, o segundo maior do mundo e é organizado pela Sociedade Brasileira de Coloproctologia anualmente. Este ano, o evento contará com 240 palestrantes e principais pesquisadores internacionais na área de coloproctologia. O congresso discutirá as principais novidades em câncer colorretal, doenças inflamatórias intestinais (doença de Crohn e retocolite ulcerativa), hemorroidas, incontinência fecal, prolapso retal, fístula, cirurgia robótica, entre outros.
73º Congresso Brasileiro de Coloproctologia
De 3 a 6 de setembro
Das 8h às 18h30
No WTC Events Center
Avenida das Nações Unidas, 12551
Programação completa: www.coloprocto2025.com.br
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