O Ministério da Saúde rebateu as acusações do governo de Minas Gerais de que haveria inconsistências nos repasses do Novo Acordo de Mariana e afirmou, em nota divulgada nesta sexta-feira (28/11), que não há “atraso, débito ou déficit”. A pasta diz ter transferido R$ 400 milhões aos municípios atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão e acusa o estado de promover “jogo político” e tentar “mudar as regras no meio do jogo”.

A manifestação rebate as críticas mineiras de que haveria um déficit acumulado de quase R$ 121 milhões nas primeiras parcelas do programa de saúde previsto no acordo, assinado e homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no ano passado.

Segundo o Ministério da Saúde, o cronograma de repasses vem sendo cumprido conforme decisões tomadas de forma unânime no Comitê Especial Tripartite (CET), instância da qual o próprio Executivo estadual participa, e que é acompanhado pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), Ministério Público e Defensorias Públicas. “Mudar as regras no meio do jogo e politizar a discussão coloca em risco a execução das ações pactuadas”, afirma o texto.

A União ainda destaca que o Novo Acordo ampliou os recursos da saúde em escala inédita e que, além das transferências diretas, estão previstos mais R$ 422 milhões para construir ao menos 60 unidades de saúde nas regiões atingidas.

A reação ocorre após o governo mineiro enviar um ofício ao Ministério Público Federal, ao Ministério Público de Minas Gerais e à Defensoria Pública, ao qual a reportagem do Estado de Minas teve acesso, sugerindo divergências nos cálculos federais.

No documento, assinado pela Secretaria de Planejamento (Seplag) e pela Secretaria de Saúde (SES-MG), o Executivo estadual sustenta que a União teria reduzido valores destinados aos municípios atingidos e ao fundo perpétuo de saúde, mecanismo de longo prazo criado para financiar medidas do Sistema Único de Saúde (SUS) nas regiões devastadas pelo rompimento da barragem.

O impasse gira em torno do Programa Especial de Saúde do Rio Doce, estruturado no Novo Acordo de Mariana. O pacto destinou R$ 12 bilhões à saúde: R$ 3,6 bilhões para ações imediatas e R$ 8,4 bilhões para formar o fundo perpétuo. Desses R$ 3,6 bilhões, parte (R$ 424 milhões) está sob gestão direta do governo mineiro, que concentra ações de vigilância, prevenção e reforço das redes locais.

A primeira divergência apontada por Minas está no cálculo do aporte ao fundo. O Estado afirma que a União considerou apenas a fração sob responsabilidade federal, e não o valor global previsto no acordo, o que teria reduzido a proporção das duas primeiras parcelas. O resultado, segundo as contas mineiras, é uma diferença de R$ 33,46 milhões. Além disso, o governo mineiro afirma que a subcapitalização inicial gera perdas permanentes, pois o valor que deixou de entrar agora não poderá ser recuperado com rendimentos futuros.

A União não reconhece essa discrepância e reforça que tudo seguiu o estabelecido em votação unânime do CET. “Foi o Governo do Brasil o responsável por garantir e realizar os primeiros repasses em apoio aos municípios impactados, após anos de espera e descaso. Inclusive, o Novo Acordo do Rio Doce, fechado pelo Governo do Brasil, estabeleceu pagamento 160 vezes maior que o anteriormente proposto para a área da saúde”, ressaltou o texto.

Há ainda outra frente de contestação: os repasses destinados às ações imediatas. A regra do acordo determina que 50% dos recursos administrados pela União devem ir diretamente aos municípios. Seguindo essa proporção, Minas calcula que, nas três primeiras parcelas, as cidades deveriam ter recebido R$ 913,75 milhões. No entanto, segundo os valores aplicados até agora pelo governo federal, foram liberados pouco mais de R$ 825,7 milhões, diferença de aproximadamente R$ 88 milhões.

Embora a União garanta que todos os recursos previstos para os 20 anos de execução do programa estão preservados, Minas afirma que a distorção inicial compromete o potencial de rendimento do fundo e a capacidade dos municípios de implementar medidas rápidas de saúde pública, especialmente em áreas onde os riscos ambientais e sanitários continuam elevados quase dez anos após o desastre.

O pacto, construído após anos de críticas ao modelo anterior, de 2016, estabeleceu R$ 170 bilhões para reparar os danos sociais, econômicos e ambientais do desastre que deixou 19 mortos, destruiu comunidades inteiras e poluiu o rio ao longo de dois estados.

As divergências também se estendem à governança do programa. O Estado relata dificuldades para acessar documentos, atas, resoluções e notas técnicas do CET, além de atrasos na publicação dos planos de ação. A União não cita esses pontos na nota, mas afirma que todo o processo é acompanhado por órgãos de controle e que os repasses já feitos representam uma mudança significativa em relação ao modelo anterior, marcado por lentidão e falhas estruturais.

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Com o acirramento da disputa, Minas pediu a realização de uma reunião extraordinária com as instituições de Justiça antes da audiência oficial marcada no TRF-6, na próxima quarta-feira (3/12). O objetivo é buscar uma interpretação comum sobre as cláusulas do acordo e evitar que a execução avance com entendimentos diferentes entre os entes.

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