A maioria dos vereadores de Belo Horizonte votou contra o Projeto de Lei 60/2025, conhecido como PL do Busão 0800, que propunha a implantação da tarifa zero no transporte coletivo da capital. De autoria da vereadora Iza Lourença (PSOL), a proposta precisava do apoio de ao menos 28 dos 41 parlamentares para ser aprovada, mas foi derrotada com 30 votos contrários e apenas 10 favoráveis.

O projeto foi protocolado em fevereiro com o apoio de 22 vereadores de 13 partidos . quando chegou o momento da votação, apenas dez parlamentares mantiveram o compromisso inicial. Vinte e dois parlamentares estiveram presentes no plenário Amintas Barros e outros 19 participaram de forma remota.

A assinatura do PL mostrava um bloco multipartidário em torno da ideia de discutir a tarifa zero, o que aumentava a expectativa de que a proposta pudesse prosperar. Estavam presentes nomes de 13 legendas diferentes, do Psol ao Republicanos, passando por PT, PSD, MDB, União Brasil, PP e outros.

No entanto, a evolução do debate, marcada por pressões externas e posicionamentos contrários da prefeitura, levou alguns parlamentares a reverem sua posição. Na lista dos que mudaram de rumo estão Arruda (Republicanos), Cleiton Xavier (MDB), Diego Sanches (Solidariedade), Dra. Michelly Siqueira (PRD), Irlan Melo (Republicanos), Janaina Cardoso (União Brasil), Leonardo Ângelo (Cidadania), Neném da Farmácia (Mobiliza), Osvaldo Lopes (Republicanos), Rudson Paixão (Solidariedade), Tileléo (PP) e Wanderley Porto (PRD), que, mesmo figurando como coautores, votaram contra a proposta em plenário.

Na véspera da votação, Helton Júnior (PSD), um dos signatários da proposta, deixou a vice-liderança do governo na Casa em razão de divergência com a base, já que ele se posicionou a favor do projeto.

Como funciona o projeto?

O PL estabelecia que, a partir do próximo contrato de concessão do transporte, em 2028, o sistema municipal de ônibus passasse a ser gratuito para todos os passageiros. Até lá, haveria uma fase de transição de até quatro anos. Hoje, a passagem custa R$ 5,75.

O sistema municipal de ônibus passaria então a ser custeado por um fundo específico, abastecido pela criação da Taxa do Transporte Público (TTP), que recairia sobre as empresas com mais de nove funcionários e substituiria gastos com vale-transporte. A cobrança, baseada em um estudo da UFMG, estava estimada em R$ 169 por empregado.

A estimativa da universidade é de que o aporte representaria 1,65% da folha salarial das empresas com mais de nove funcionários. Experiências como a de Maricá, no Rio de Janeiro, que mantém a gratuidade há mais de dez anos, são usadas como exemplo de benefícios, incluindo crescimento populacional e aquecimento econômico.

Autora da proposta, a vereadora Iza Lourença defendeu que a tarifa zero é financeiramente viável e socialmente necessária. Segundo ela, o estudo mostra que mesmo se a demanda triplicar, argumento usado pelos opositores da proposta para criticar o texto, os custos do sistema aumentariam apenas cerca de 30%.

Ela também aponta que a maioria das empresas sairia ganhando, já que hoje gastam mais com vale-transporte do que pagariam com a TTP. Além disso, famílias de baixa renda, que comprometem até 19% da renda com transporte, teriam maior poder de consumo, o que geraria impacto positivo no comércio e na economia local. Uma análise do Cedeplar/UFMG estimou que cada R$ 1 investido retornaria R$ 3,89 em ganhos de consumo.

Com a derrota, a oposição convocou uma manifestação para domingo (5/10), em repúdio à derrubada do projeto. “Acho lamentável, mas a nossa luta não para por aqui. Ninguém aguenta mais a situação dos ônibus. Domingo estamos chamando uma manifestação para que as pessoas que se indignam com o voto dos vereadores possam ir para a rua se expressar”, declarou.

Iza afirmou ainda que o grupo responsável pelo projeto estava aberto a ajustes, mas não encontrou espaço de negociação. “Colocamos esse projeto na mesa e falamos que a gente poderia negociar qualquer outra proposta que viesse. Infelizmente, não chegou nenhuma”, criticou.

Como votou cada vereador:

Contra

  • Arruda (Republicanos)
  • Bráulio Lara (Novo)
  • Bruno Miranda (PDT)
  • Cláudio do Mundo Novo (PL)
  • Cleiton Xavier (MDB)
  • Diego Sanches (Solidariedade)
  • Dra. Michelly Siqueira (PRD)
  • Fernanda Pereira Altoé (Novo)
  • Flávia Borja (DC)
  • Helinho da Farmácia (PSD)
  • Irlan Melo (Republicanos)
  • Janaina Cardoso (União Brasil)
  • José Ferreira (Podemos)
  • Juninho Los Hermanos (Avante)
  • Leonardo Ângelo (Cidadania)
  • Loíde Gonçalves (MDB)
  • Lucas Ganem (Podemos)
  • Maninho Félix (PSD)
  • Marilda Portela (PL)
  • Neném da Farmácia (Mobiliza)
  • Osvaldo Lopes (Republicanos)
  • Pablo Almeida (PL)
  • Professora Marli (PP)
  • Rudson Paixão (Solidariedade)
  • Sargento Jalyson (PL)
  • Tileléo (PP)
  • Marcela Trópia (Novo)
  • Uner Augusto (PL)
  • Vile Santos (PL)
  • Wanderley Porto (PRD)

A Favor

  • Cida Falabella (PSOL)
  • Dr. Bruno Pedralva (PT)
  • Edmar Branco (PCdoB)
  • Helton Júnior (PSD)
  • Iza Lourença (PSOL)
  • Juhlia Santos (PSOL)
  • Luiza Dulci (PT)
  • Pedro Patrus (PT)
  • Pedro Roussef (PT)
  • Wagner Ferreira (PV)

Não votou

Professor Juliano Lopes (Podemos)

“Novo imposto”

Os números favoráveis à proposta esbarram na oposição e no próprio prefeito de BH, Álvaro Damião, do União Brasil, que deu diversas declarações contrárias ao projeto. Em coletiva de imprensa, ele chegou a classificar o PL como “utopia” e disse temer que empresas pudessem transferir suas sedes para municípios vizinhos para escapar da cobrança.

Entre os vereadores contrários à proposta, também ganhou força o argumento de que Belo Horizonte deveria adotar, em vez da gratuidade plena, uma tarifa social voltada para famílias de baixa renda. Apesar disso, nenhuma emenda com esse direcionamento foi apresentada ao longo da tramitação do projeto.

Relatora do texto na Comissão de Orçamento e Finanças Públicas, a vereadora Marcela Trópia (Novo) se posicionou contrária à proposta, citou incertezas financeiras e operacionais não esclarecidas durante o debate.

“O problema é que, se a gente coloca tarifa zero, pessoas da Região Metropolitana vão utilizar esse transporte. A gente não sabe quantas pessoas são. A gente não sabe como isso gerará uma fuga de CNPJs. Quem tem hoje 10 funcionários pode abrir duas empresas de cinco, e eu não tenho garantia de que a taxa criada para sustentar o sistema vai realmente entrar no caixa da Prefeitura. A conta que é feita hoje, na prática, pode mudar”, alertou.

A discussão, na avaliação da parlamentar, não pode ser conduzida sem clareza sobre quem seria beneficiado. “É uma tarifa social? Vamos atender a baixa renda? Seriam as pessoas inscritas no sistema único da Prefeitura? Ou aquelas que recebem Bolsa Família? Qual é o recorte dessa política pública?”, questionou.

Oposição empresarial

A Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg) e a Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL-BH) também divulgaram notas contrárias, alegando que a taxa é inconstitucional e traria impactos negativos para a geração de empregos. Estudo da Fiemg estima que, se a demanda dobrar, o custo por funcionário poderia chegar a R$ 318, comprometendo até 55 mil postos de trabalho formais.

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O SetraBH, sindicato das empresas de ônibus, adotou postura neutra, mas alertou para a necessidade de uma fonte robusta de custeio, já que a demanda poderia mais que triplicar.

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