Dom Walmor Oliveira de Azevedo

Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte


A celebração do Dia dos Pais ilumina, no horizonte da sociedade, a marca indispensável que está na força e na missão da paternidade. Não é demais repetir que a paternidade inadequadamente exercida é um desastre com consequências altamente prejudiciais às relações e ao viver humano. Sem referência adequada à figura paterna, pela ausência de um pai, ou por seu distanciamento no cuidado dos filhos, paga-se caro, com prejuízos que abrangem desde o aumento das delinquências até o enfraquecimento de instituições. Pode causar ainda um vazio sacrificante ao coração de muitos filhos, privados de uma força essencial que poderia auxiliá-los a viver com mais altruísmo e sabedores de suas responsabilidades cidadãs. Ser pai, sabe-se, vai muito além de fatores biológicos vinculantes. Trata-se de engenhosa construção, densa de significado, de inteireza moral. A paternidade constitui substrato afetivo e espiritual indispensável para se viver com qualidade, não apenas a própria vida, mas também dedicando-se à construção de uma sociedade fraterna e solidária.


O horizonte rico, complexo e interpelante da missão de ser pai pode ser melhor compreendido a partir de diferentes ciências, particularmente da psicologia e da psicopedagogia, incluindo também as especificidades da neurociência. Igualmente valioso é buscar compreender a importância da paternidade a partir da narrativa do evangelista Lucas, no 15º capítulo de seu Evangelho – a rica metáfora teológica chamada “Parábola do Filho Pródigo”. A narrativa inclui referências às figuras do filho mais novo e do filho mais velho. Ambos retratam, por suas atitudes, o efeito estruturante da figura paterna, que incide, de modo diferente, no íntimo de cada um dos irmãos.


Na parábola, o pai retratado é figura exemplar, particularmente por sua compaixão e misericórdia, que não podem ser confundidas com fraqueza. O filho mais novo, insolente, é respeitado na sua liberdade de escolher distanciar-se de seu pai, recebendo a herança que lhe cabia. Uma herança que foi esbanjada e dissipada, pela força terrível da falta de unidade interior, levando à perda de tudo – material e afetivamente. A salvação desse filho ocorre pela força da paternidade. Depois de alcançar uma situação extrema de miséria afetiva e material – sem conseguir até mesmo a comida que era oferecida aos porcos –, foi resgatado pela referência já construída em seu coração sobre o seu pai. Desse modo, recobrou as forças para se levantar e fazer o caminho de volta. Buscou reencontrar seu pai, que já o esperava para cobrir-lhe de beijos, restaurando a sua dignidade. Deu ao filho vestimentas novas, sandálias, anel no dedo, dedicando-lhe ainda uma festa, com a presença de todos. Por sua vez, o irmão mais velho, pelo ressentimento que destrói até a estima pelo próprio pai, se perde no ódio. Contaminado por esse sentimento, não consegue experimentar alegria em seu coração. Distancia-se da fraternidade.


Na celebração do Dia dos Pais é oportuno retomar a narrativa do Evangelista Lucas para apreender o alcance da missão de ser pai, com sua força essencial para salvar a sociedade de delinquências que comprometem radicalmente a solidariedade fraterna. Da Palavra de Deus se pode reconhecer muitas importantes indicações sobre a força da paternidade qualificadamente exercida – essencial às diferentes etapas da vida, à garantia de novos rumos para a sociedade. Da rica lista de aprendizados que podem se consolidar graças à missão dos pais, sublinhe-se o reconhecimento de que todos são irmãos, inspirando o cultivo dos sentimentos de igualdade e equidade, tão importantes para superar diferentes formas de escravidão no mundo atual.


Cada pai, ao exercer adequadamente a paternidade, constitui alicerce para que os filhos estabeleçam relações inspirados na justiça, na caridade, respeitando a autonomia e a dignidade de cada semelhante, que é irmão e irmã. A direção oposta – de fragilidades no exercício da paternidade, ou da falta de respeito em relação aos pais – sedimenta a exploração do semelhante, principalmente dos pobres e vulneráveis. Celebrar a paternidade é muito mais que oportunidade para adocicadas exaltações, ou ocasião propícia para a compra de presentes. Trata-se de momento importante para alimentar a convicção da importância de cada pai, com suas lições para a vida de seus filhos e, consequentemente, para toda a sociedade.


Jesus Cristo é o filho de Deus-Pai que revela o caminho de toda a humanidade, fazendo-a se compreender como um só povo, de irmãos e irmãs. Na fidelidade ao Pai, Jesus se oferece como vítima de expiação por seus irmãos e irmãs. Esta é a sua boa-nova que deve revestir o coração humano, tornando-o repleto de fraternidade. Neste mesmo sentido, a humanidade precisa recorrer às preciosas referências que emanam da missão dos pais. Assim, a civilização contemporânea pode cair em si, a exemplo do que ocorreu com o filho mais novo, na “Parábola do Filho Pródigo”. A paternidade possa ser lembrada, promovida e celebrada como um caminho importante para fortalecer a solidariedade fraterna, contribuindo para edificar um mundo de mais justiça e paz. Parabéns aos pais, com votos de que possam exercer a sua missão de modo fecundo. Um tempo novo surja, ancorado e fecundado pela nobre missão da paternidade.