Por Júlio Moreira
Em meio aos escombros da capital alemã, devastada por bombardeios e cercada pelas tropas soviéticas, Adolf Hitler passou seus últimos dias recluso no Führerbunker, um abrigo subterrâneo construído sob o jardim da Nova Chancelaria do Reich. Isolado do mundo real, afundado em delírios de vitória e cercado apenas por seus fiéis mais próximos, o ditador alemão viu desmoronar o império que havia erguido.
No interior abafado do bunker, restava um pequeno grupo de auxiliares que optaram por permanecer ao lado de Hitler até o fim. “Hitler deixou claro que, se não houvesse vitória, ele morreria em Berlim”, lembraria anos depois sua secretária pessoal, Traudl Junge. Muitos receberam cápsulas de cianeto, entregues para o caso de preferirem a morte à rendição. Junge relatou que, ao ser liberada para deixar Berlim, recusou. “Eva Braun se recusou a sair. E eu fiz o mesmo”, disse.
Nos dias finais, com o avanço soviético consumando a derrota, Hitler decidiu testar a eficácia do veneno. Ordenou que seu cachorro Blondi, um pastor-alemão, fosse envenenado com cianeto. “Hitler não confiava em Himmler, que fornecera o veneno, então ele testou em Blondi”, contou Junge. O cão morreu instantaneamente.
No dia 30 de abril, por volta das 15h30, um disparo interrompeu o silêncio do bunker. “De repente… ouve-se o som de um tiro, tão alto, tão próximo, que todos ficamos em silêncio. Ele ecoa por todos os cômodos”, descreveu Junge. Na antessala, alguém chamou o camareiro Heinz Linge: “Acho que aconteceu!”. Linge e se dirigiu ao local. “Tudo em mim resistia a abrir a porta”, escreveu Linge mais tarde. Ao destrancarem o escritório, foram recebidos por um cheiro forte de pólvora e amêndoas amargas — sinal inconfundível do cianeto.
A cena confirmou o que todos imaginavam. Hitler estava morto, caído sobre o sofá, com a cabeça inclinada para a direita, sangue escorrendo de sua têmpora. Ao lado, sua pistola Walther PPK. Eva Braun, sem ferimentos visíveis, estava reclinada no sofá, morta pelo veneno. “Seu rosto contraído traía como ela havia morrido”, disse Linge. Günsche, outro assistente, confirmou: “O cadáver de Eva exalava o cheiro de cianeto. No de Hitler, apenas pólvora”. Linge saiu e anunciou, em voz baixa: “O Führer está morto.” Poucas horas depois, a rádio de Hamburgo divulgou a morte de Adolf Hitler ao povo alemão, dizendo que ele havia “caído lutando contra o bolchevismo”. O almirante Karl Dönitz foi nomeado seu sucessor. Dönitz pediu luto nacional e tentou retratar Hitler como um mártir — mas o Terceiro Reich já estava em frangalhos.
No Ocidente, a notícia foi recebida com ceticismo. Nos Estados Unidos, ninguém celebrou abertamente. Em Londres, Churchill disse apenas que a situação era “mais satisfatória do que há cinco anos”. Boatos começaram a circular: Hitler teria realmente morrido? Ou fugido? A confusão foi alimentada pelos soviéticos, que inicialmente negaram ter encontrado o corpo. Só depois foi confirmado: os restos de Hitler haviam sido enterrados secretamente, e, em 1970, foram cremados.
No prédio da Chancelaria do Reich, em 2 de maio de 1945, Soldados soviéticos encontraram um homem morto muito parecido com Hitler. O corpo foi fotografado e identificado como o do líder nazista. Até hoje, essa foto é falsamente apontada como a última imagem do ditador
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Hitler havia se mudado definitivamente para o bunker em março de 1945. Cercado por mapas e assessores como Goebbels e Albert Speer, tentava comandar o que restava do exército, já praticamente derrotado. Em 9 de março, ordenou a defesa rua por rua de Berlim, concentrando forças no setor chamado “Cidadela”.
No dia 20 de abril, seu 56º aniversário, recebeu a cúpula nazista pela última vez. Göring, Himmler, Ribbentrop e outros estiveram presentes. Após a cerimônia, todos partiram — menos Hitler.
Em Berlim, Winston Churchill se senta em uma das cadeiras danificadas do bunker de Hitler, rodeado por soldados britânicos e soviéticos
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A morte do presidente Roosevelt, em 12 de abril, chegou a ser comemorada por Goebbels como uma chance de virada. Hitler também se iludiu: acreditava que Berlim resistiria, talvez até reconquistando Viena. Mas, enquanto sonhava, os Aliados avançavam. Em Uelzen, uma última contraofensiva falhou.
No dia 28, Hitler descobriu que Himmler tentava negociar com os Aliados. Revoltado, mandou prendê-lo. Na mesma noite, casou-se com Eva Braun. Dois dias depois, cumpriu sua promessa: morreu em Berlim.
Em 2 de maio, Berlim rendeu-se oficialmente. No dia 8, veio a rendição total da Alemanha. A Europa, devastada, encerrava ali o capítulo mais sombrio de sua história moderna — uma guerra que matou mais de 50 milhões de pessoas, incluindo seis milhões de judeus no Holocausto. Um novo mundo emergia: a Guerra Fria e a divisão entre Estados Unidos e União Soviética.
Fragmento do crânio com um orifício de bala que supostamente era do cadáver de Hitler
reproduçãoOs despojos de Hitler
Quando o Exército Soviético chegou ao bunker de Adolf Hitler, iniciou uma busca intensa por seu corpo, mas encontrou apenas alguns restos nos jardins da Chancelaria. Entre os vestígios localizados estavam a ponte dentária superior, parte do osso maxilar inferior, outra ponte dentária, além de uma ponte de resina e uma coroa de ouro pertencente a Eva Braun. A identificação desses itens foi possível graças à colaboração de Käthe Heusemann, assistente do dentista pessoal de Hitler. Todo esse material foi levado para Moscou e mantido sob rigoroso sigilo.
Eva Braun
reproduçãoEva Braun
Eva Braun se casou com Hitler pouco antes de ambos se suicidarem no bunker. Filha de um professor da Baviera, trabalhou em 1929 para Heinrich Hoffmann, fotógrafo oficial do Partido Nacional-Socialista, em cujo estúdio conheceu Hitler. Tornou-se sua amante, mas escondida dos olhos do povo, obrigada a manter uma rotina entediante de cinema e festas e recebendo visitas ocasionais do Führer. Graças a Eva Braun, há muitas cenas de Hitler filmadas em Berchtesgaden. Ela não tinha influência aparente sobre as decisões políticas do líder nazista, que gostava de relaxar na companhia da amante sempre que possível. Em abril de 1945, Eva viajou de Munique a Berlim para encontrá-lo no bunker e, na noite do dia 28, eles se casaram. Dois dias depois, ela se suicidou com cianeto.