Morte de gari: Renê conversou com delegada dois minutos após disparo
Inquérito policial revela que ligação durou cerca 6 minutos. Outras chamadas com Ana Paula Lamego Balbino Nogueira foram realizadas no dia do crime
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Renê da Silva Nogueira Júnior, autor confesso do disparo que matou o gari Laudemir de Souza Fernandes, conversou por telefone com a esposa e delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira cerca de dois minutos após o trabalhador ser baleado. A informação foi revelada na conclusão do inquérito policial, ao qual o Estado de Minas teve acesso.
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As investigações da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) apontam que as câmeras de segurança registraram o momento que o gari foi atingido às 9h09 do dia 11 de agosto. Antes dele ser baleado, às 9h04, Renê ligou para esposa, mas ela não atendeu.
Às 9h11, Ana Paula retornou a ligação pelo Whatsapp, ele aceitou e a chamada durou 6 minutos e 24 segundos. O inquérito policial informa que não é possível acessar o conteúdo da ligação entre os dois porque foi realizada pelo Whatsapp.
Mais ligações e pesquisas
Em seguida, às 9h22, o suspeito de matar o gari Laudemir enviou um áudio ao seu superior na empresa onde trabalhava. “Renê aparenta estar de alto astral e justifica seu atraso ao chefe, em razão de ‘retenção no trânsito’”, constata o inquérito da PCMG.
Ainda de acordo com as investigações policiais, Renê da Silva Nogueira Júnior seguiu com sua rotina normalmente e realizou outras ligações com a esposa ao longo do dia. Em imagens já reveladas que mostram o suspeito na área pet do prédio onde mora, foi registrado um dos momentos, às 14h39, em que ele conversou por ligação com Ana Paula.
Renê também fez pesquisas relacionadas com o acontecimento, como a busca no Instagram às 12h11 com os dizeres: “gari é morto em Betim”.
Delegada permitia uso de armas
O inquérito também revelou que a delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira permitia que o esposo utilizasse as armas dela. “Tanto a pistola glock calibre .380, usada para a prática de crime, como também a pistola glock, calibre 9 mm pertencente à carga da PCMG”, consta no documento.
Ana Paula foi indiciada por porte ilegal de arma de fogo, conforme previsto na Lei de Desarmamento, por ter cedido ou emprestado sua pistola de uso pessoal para o companheiro. Exames periciais realizados entre duas munições apreendidas no local do crime tiveram compatibilidade com a pistola calibre .380 apreendida na casa da servidora pública.
Desde 11 de agosto, a Corregedoria da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) instaurou um procedimento administrativo para investigar a participação da delegada no crime. No dia, Ana Paula foi levada até a sede do órgão correcional para ser ouvida em relação ao uso de sua arma pessoal no possível crime e teve seu aparelho celular e armas apreendidos.
Na ocasião, segundo repassado à imprensa pelo porta-voz da corporação, o delegado Saulo Castro, a servidora afirmou que o marido não tinha acesso aos dois artefatos. Além disso, a delegada afirmou que não tinha nenhuma informação em relação ao crime em que o companheiro foi preso por suspeita de participação.
Dois dias depois da morte do gari Laudemir, a delegada Ana Paula foi afastada de suas funções para tratamento de saúde no Hospital da Polícia Civil, por 60 dias. O pedido, conforme a PCMG, segue “os termos da lei”.
A decisão foi publicada no Diário Oficial do Estado no sábado (23/8), sob assinatura do diretor-geral da unidade médica da corporação e pode ter o prazo prorrogado por mais dois meses, conforme avaliação médica. O documento não especifica a condição de saúde da servidora.
Renê indiciado
Renê foi indiciado por homicídio duplamente qualificado — por motivo fútil e meio que dificultou a defesa da vítima —, ameaça à motorista do caminhão de coleta e porte ilegal de arma de fogo. A pena pode chegar a até 35 anos.
O empresário está preso desde o dia do crime, 11 de agosto, e seguirá detido no Presídio de Caeté, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O resultado das investigações foi divulgado 18 dias depois do homicídio, registrado na Rua Modestina de Souza, no Bairro Vista Alegre, na Região Oeste de Belo Horizonte.
Em um primeiro momento, Renê negou ter cometido o crime e passado pelo local na manhã de 11 de agosto. Ele chegou a dizer que saiu de casa, no Bairro Vila da Serra, em Nova Lima, na Região Metropolitana, direto para o trabalho em Betim, também na Grande BH. No entanto, o álibi foi derrubado pelas investigações, que obtiveram imagens nítidas do carro do suspeito e dele guardando a arma de sua esposa, delegada da PCMG, em uma mochila.
Após a divulgação das gravações, na última segunda-feira (18/8), o investigado, em novo depoimento, confessou que estava no local e disparou a arma da esposa. Conforme registrado no termo de declaração da oitiva pela PCMG, Renê afirmou que essa teria sido a primeira vez que pegou a pistola .380, de uso particular da mulher. Ainda segundo a nova versão, ele teria feito isso para se proteger, por “estar indo para um local perigoso” e por não conhecer o caminho. A arma, então, seria “para proteção”.
Fascínio por armas
À imprensa, o delegado responsável pelo caso, Evandro Radaelli, explicou que, além da comprovação do envolvimento do empresário na morte de Laudemir, as investigações indicaram que Renê tem "fascínio" por armas de fogo e o "poder" que o armamento lhe concedia.
Radaelli explicou que, durante análises feitas no aparelho celular do investigado, foram encontradas imagens em que ele exibe diversas armas. Em alguns vídeos, o homem aparece fazendo disparos. Ainda segundo o chefe da investigação, o artefato não é o mesmo usado no crime registrado no Bairro Vista Alegre.
Como foi o crime?
No dia 11 de agosto, Laudemir trabalhava, junto com outras quatro pessoas, na Rua Modestina de Souza, por volta das 8h55, quando a motorista do caminhão, uma mulher de 42 anos, parou e encostou o veículo para que uma fila de dez carros pudesse passar. A via de mão dupla, segundo relato de testemunhas, fica próxima da Avenida Tereza Cristina. Em determinado momento, o último veículo, identificado como um carro modelo BYD, da cor cinza, teria enfrentado dificuldades para passar pelo caminhão e, por isso, a motorista e um dos garis teriam indicado ao motorista que o espaço seria suficiente.
Em depoimento à Polícia Civil, a condutora do caminhão de coleta, identificada como Eledias Aparecida Rodrigues, afirmou que, enquanto recebia as instruções dos funcionários, o motorista do BYD pegou uma arma preta, fez movimento para engatilhar a arma e, apontando para ela, disse: “Se você esbarrar no meu carro, eu vou dar um tiro na sua cara, dúvida?”.
Diante das ameaças feitas à colega, uma segunda testemunha afirmou que os demais trabalhadores tentaram acalmar o suspeito e pediram que ele seguisse seu caminho. Mesmo assim, segundo o boletim de ocorrência, o homem desembarcou com a arma em punho, deixando o carregador cair. Ele então o recolocou, manobrou a arma e efetuou um disparo em direção à vítima. Laudemir chegou a ser socorrido e encaminhado para o Hospital Santa Rita, no Bairro Jardim Industrial, em Contagem, mas morreu.
O que acontece agora?
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O resultado das investigações e o indiciamento do suspeito serão enviados ao Ministério Público de Minas Gerais;
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Após o recebimento dos documentos, o MPMG tem até dez dias para denunciar, ou não, o indiciado à Justiça;
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Além dos crimes relatados na conclusão do inquérito, o MPMG pode acusar o homem por outros delitos;
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A delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira continuará afastada, por motivos de saúde;
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A Corregedoria da PCMG continua as investigações administrativas contra a servidora.