O cacique é pertencente do povo Pataxó-hã-hã-hãe e da sexta geração da família Kamakã Mongoió -  (crédito: Edesio Ferreira/EM/D.A)

O cacique é pertencente do povo Pataxó-hã-hã-hãe e da sexta geração da família Kamakã Mongoió

crédito: Edesio Ferreira/EM/D.A

Nesta quarta-feira (6/3), indígenas, deputadas mineiras e apoiadores da retomada de terras originárias se reuniram no Córrego de Areias, município de Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, em homenagem ao Cacique Merong Kamakã. Ao serem questionadas sobre a morte de Merong, que a princípio foi registrada pela PM como suicídio, pessoas presentes na homenagem associaram a causa à luta de retomada territorial que o cacique liderava.

Yaru Kamakã, primo de Merong, conta que o cacique relatou no domingo que precedeu a morte dele, que estava muito pressionado, mas não transpareceu estar em uma situação crítica. Yaru diz que havia combinado com ele de se encontrarem no início desta semana e foi pego de surpresa pela morte.

 

O primo do cacique reforçou o envolvimento e dedicação que Merong tinha na luta pela retomada das terras. “Ele se ajoelhava para deixar a aldeia de pé. É um legado a ser seguido”, disse. O Estado de Minas teve acesso à entrevista com o morador do Córrego de Areias que corroborou com o que foi contado por Yaru. “Sobre a causa, só a polícia pode falar. O que eu sei é que o cacique estava muito angustiado”, disse.

 

Frei Gilvander Moreira, participante da Comissão Pastoral da Terra de Minas Gerais e amigo de Merong, que estava presente no movimento em Brumadinho, acredita que o cacique tenha sido assassinado devido à luta que defendia. “Conversei longamente em particular com o cacique Merong no dia 24 de fevereiro, lá na Retomada Xukuru-Kariri em Brumadinho. Ele estava planejando ampliar as lutas, de cabeça erguida. Não foi suicídio, foi assassinato por perseguição”, afirmou Frei em entrevista ao Estado de Minas.

 

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Poliana de Sousa, coordenadora nacional do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), conhece Merong há 10 anos e esteve presente no evento. Ao ser questionada sobre o cacique estar sofrendo possíveis ameaças, ela ressaltou que o território Kamakã-Mongoió como um todo é ameaçado. “Desde que a retomada aqui foi feita, a Vale vem pressionando muito para a saída das famílias daqui”, disse Poliana.

 

Proibição do enterro

“Respeitem nosso luto”, entoavam os presentes na homenagem ao cacique, entre eles a deputada federal Célia Xakriabá (PSOL), a mãe de Merong e outras lideranças indígenas. Na noite dessa terça-feira (5/3), a 8ª Vara Federal Cível de Belo Horizonte acatou um pedido da mineradora Vale e proibiu o sepultamento de Merong Kamakã no Córrego de Areias de Brumadinho, onde ele vivia. A decisão foi assinada pela juíza Geneviève Grossi Orsi.

 

O pedido da mineradora foi justificado pela área do córrego estar em processo de reintegração de posse. "É certo que não foi formulado qualquer pedido dos réus afeto ao sepultamento noticiado. Outrossim, é objeto desta ação de Reintegração de Posse, a área em que se pretende realizar o alegado sepultamento a despeito da controvérsia instaurada sobre sua efetiva titularidade. Diante do exposto defiro, por ora, a tutela inibitória requerida, para que seja impedida a realização do sepultamento do Sr. Merong Kamakã, nas terras objeto desta ação, ante a notória controvérsia acerca da titularidade das terras objeto desta ação", escreveu a juíza na decisão.

 

Apesar da proibição, na madrugada dessa quarta-feira, Merong foi sepultado. “A gente não enterra porque o índio não morre, ele nasce. Então nós vamos plantar ele. Merong foi tronco de uma árvore que cortaram, mas a raiz dele está nesse território, ele vai permanecer nesse território”, disse o cacique Carlinhos Xukuru-Kariri.

Cacique Merong foi "plantado" na madrugada desta quarta-feira

Cacique Merong foi "plantado" na madrugada desta quarta-feira

Katia Torres / divulgação

A mineradora, em nota, reiterou o pesar pela morte de Merong e disse que se solidariza com a comunidade indígena. "A Vale respeita os povos indígenas e seus ritos de despedida e busca construir uma solução com a comunidade que preserve suas tradições, dentro da legalidade", afirma o comunicado.

 

A Vale também afirmou que teve conhecimento do sepultamento e que não pretende tomar outras medidas sobre o caso (Com informações da Folhapress).

 

*Estagiária sob supervisão do subeditor Gabriel Felice