Ataques homofóbicos aconteceram nas dependências do Cascatinha Country Club -  (crédito: Google Street View)

Ataques homofóbicos aconteceram nas dependências do Cascatinha Country Club

crédito: Google Street View

Um funcionário do Cascatinha Country Club, em Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira, procurou a Polícia Militar para denunciar que foi vítima de homofobia praticada por um dos sócios, de 57 anos. Marlow Sobral Lima, de 29, diz ter sido chamado, entre outros termos, de “viado” — uma gíria de tom pejorativo comumente utilizada para se referir à sexualidade de alguém. O departamento jurídico do clube confirmou a suspensão temporária do sócio. Um procedimento administrativo também está em curso.

As agressões verbais, conforme registro da ocorrência, foram confirmadas por outros funcionários, como um garçom e uma auxiliar de cozinha. O gerente do espaço precisou intervir para cessar a investida do sócio contra o atendente. O caso aconteceu no domingo (28/1). No mesmo dia, Marlow, depois de acionar a PM, relatou aos militares que o homem foi ao balcão e entregou três fichas de cerveja. Ao receber as bebidas, o cliente passou a questionar se não seriam quatro. A partir daí, afirmando que o correto seria receber uma bebida a mais, ele começou a ficar irritado por não ter seus argumentos acolhidos.

“Ele foi até o caixa, quando a funcionária fez um sinal para mim e disse ter vendido quatro fichas. Aí, respondi que ele só me entregou três, e ela rebateu dizendo não saber o que o sócio fez com a quarta ficha. Então, ele voltou ao balcão e começou a se exaltar, insistindo que faltava entregar mais uma. Pra resolver, peguei outra cerveja e coloquei no balde de gelo dele, mas precisei fazer força para a garrafa entrar. Com isso, parte do gelo derramou no balcão, e ele começou a perguntar se eu estava ‘putinho’”, conta Marlow em entrevista ao Estado de Minas.

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Conforme o atendente, a tentativa de pôr fim à insatisfação do cliente ao ceder mais uma cerveja não deu certo. Ao contrário: o sócio ficou ainda mais irritado. “Ele começou a imitar o jeito que eu estava tentando arrumar as bebidas e acabou quebrando a garrafa ao batê-la no balde. Reclamei na hora. Disse que não tinha necessidade disso. Daí, ele foi à loucura e começou a me xingar de tudo quanto é nome. Começou a me atacar por conta da minha sexualidade, dizendo que não sou homem de verdade, além de me chamar de ‘viadinho de merda’, ‘viado de bosta’ e ‘viado filho da puta’”, afirma.

Gerente interrompe agressões

Marlow afirma que o sócio tentou pular o balcão, mas foi impedido pelo gerente do espaço. “Nesse momento, todo mundo veio me acalmar, falando para eu ficar tranquilo. A todo momento, os amigos dele tentaram me intimidar”, lembra.

No boletim de ocorrência, a PM diz que o suspeito negou ter proferido as ofensas ao atendente, mas confirmou ter quebrado a garrafa ao se irritar com a “má prestação” do serviço.

O homem deu entrada no Presídio de Matias Barbosa na manhã de 30 de janeiro, mas, no mesmo dia, ganhou a liberdade por meio de alvará de soltura expedido pela Justiça, confirmou ao Estado de Minas a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp). Com isso, o juiz fixou algumas medidas cautelares — entre elas a proibição do suspeito de ficar a menos de 100 metros da vítima.

Sensação de medo

Marlow conta que já enfrentou outros episódios de homofobia, mas o último foi o que mais o deixou abalado. “Eu tive uma consulta com um psiquiatra, que decidiu me afastar do serviço por 14 dias para que eu possa assimilar tudo. Mesmo havendo uma ordem de restrição, tenho receio de ele me procurar ou alguém ‘comprar’ a briga por ele. Por outro lado, acho importante denunciar e falar sobre esse tipo de crime. Por isso, aceitei dar entrevista. Não deve haver mais espaço para comportamentos homofóbicos na sociedade. O que está me trazendo um pouco de paz no momento é pensar que estou tendo um ato de coragem”, avalia.

Sócio pode ser expulso do clube

Também em conversa com a reportagem, o diretor jurídico do clube, Lucas Dutra, explica que a comissão de disciplina do espaço votou pela suspensão do sócio pelo período de 90 dias. “Além de determinarmos que ele fique impedido de frequentar o clube nesse período, instauramos um procedimento administrativo no qual ouviremos todas as partes. Por fim, vamos decidir se ele será expulso ou se aplicaremos outro tipo de penalidade”, relata.

O que diz a lei?

Em 21 de agosto, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que atos de homofobia e transfobia poderiam ser punidos como injúria racial. Em 2019, o STF já havia equiparado esses dois crimes com o de racismo, o que permitiu punir ofensas discriminatórias contra um grupo ou coletividade. Ao equiparar com a injúria racial, o Supremo estabeleceu que ofensas individuais também sejam punidas.

Cabe lembrar que, desde janeiro de 2023, a injúria racial é equiparada ao racismo. Ambos os crimes são imprescritíveis e inafiançáveis. A pena varia de dois a cinco anos de prisão.