Em uma publicação nas redes sociais na véspera de Natal, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, utilizou sua tradicional mensagem festiva para mesclar desejos de boas festas com ataques políticos contundentes. A postagem, feita na plataforma Truth Social, desejou "Feliz Natal" a todos, incluindo o que ele chamou de "escória da esquerda radical", acusando esse grupo de tentar destruir o país, mas falhando nisso.
Trump aproveitou o momento para fazer um balanço de suas ações no governo, destacando conquistas como o fechamento de fronteiras, com uma oferta de bônus de US$ 3 mil para imigrantes em situação irregular que deixassem os EUA voluntariamente durante a temporada natalina, além de afirmar que os EUA são "respeitados novamente", com recordes no mercado de ações, inflação zero, PIB de 4,3% e os menores índices de criminalidade em décadas.
No entanto, uma parte significativa da mensagem foi dedicada a críticas diretas às pessoas trans. Trump afirmou ter "abolido todos os direitos de transgêneros", incluindo o corte de verbas federais para hospitais que atendem esse público e a proibição da participação de mulheres trans em competições esportivas femininas. Ele escreveu explicitamente: "Não temos mais homens em esportes femininos, direitos de transgêneros ou aplicação da lei fraca".
Essa declaração ecoa promessas anteriores de Trump, como a de "deter a loucura transgênero" em seu primeiro dia de mandato, que incluía banir soldados transgêneros do Exército e de escolas. A mensagem de 2025 segue um padrão observado em anos anteriores, como em 2024, quando Trump misturou felicitações com reclamações políticas, incluindo elogios ao seu gabinete e desejos de comprar a Groenlândia. Essa abordagem tem gerado reações polarizadas, com apoiadores vendo-a como uma defesa de valores tradicionais e críticos acusando-o de usar uma data religiosa para promover divisões.
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Por que as pessoas trans incomodam tanto?
A questão de por que as pessoas trans geram tanto desconforto e críticas, particularmente entre indivíduos e políticos alinhados à direita, é complexa e multifacetada. Ela envolve interseções de cultura, política, religião, ciência e estratégia eleitoral. Para uma análise verdadeiramente profunda e não partidária, é essencial examinar evidências históricas, sociológicas e políticas, evitando generalizações ou juízos de valor. Baseado em estudos, relatórios e debates acadêmicos, podemos identificar padrões recorrentes sem endossar ou refutar posições ideológicas.
1. Raízes culturais e religiosas: visões tradicionais de gênero
Muitos conservadores, incluindo políticos de direita, aderem a visões binárias de gênero baseadas em tradições culturais e religiosas. Para eles, o gênero é visto como imutável e determinado biologicamente ao nascimento, alinhado a interpretações de textos sagrados (como a Bíblia ou o Alcorão em contextos cristãos e islâmicos conservadores). A existência e visibilidade de pessoas trans desafia essa estrutura, sendo percebida como uma ameaça à ordem social "natural".
Por exemplo, em discursos da extrema direita, alegações de "anormalidade" ou "doença mental" relacionadas à identidade de gênero são comuns, frequentemente justificadas por argumentos religiosos ou pseudocientíficos. Isso não é exclusivo da direita, mas é mais pronunciado nesse espectro, onde a preservação de normas tradicionais é um pilar ideológico. No contexto de Trump, suas críticas frequentemente invocam a proteção de "valores familiares americanos", ecoando movimentos conservadores que veem a transição de gênero como uma erosão da família nuclear.
2. Estratégia política: criação de "inimigos" para mobilização eleitoral
Políticos de direita frequentemente usam questões trans como "questões de cunha" (wedge issues) para unir sua base e polarizar o debate. Associar direitos trans a agendas "de esquerda" cria uma narrativa de oposição binária: direita como defensora da "realidade biológica" versus esquerda como promotora de "ideologia de gênero". No Brasil, por exemplo, grupos conservadores no Congresso têm protocolado projetos de lei que visam restringir direitos trans, analisados como expressões axiológicas (baseadas em valores morais) que posicionam trans como ameaça à sociedade.
Nos EUA, Trump e aliados usam isso para energizar eleitores evangélicos e rurais, onde pesquisas mostram maior rejeição a identidades não binárias. Um relatório da ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) no Brasil destaca como políticos elegem pessoas trans como "inimigas prioritárias" para ganhar visibilidade, especialmente em contextos eleitorais. Essa tática é eficaz porque trans representam uma minoria pequena (cerca de 0,5-1% da população global), sem grande poder econômico ou político, tornando-os alvos "fáceis" para retórica inflamada sem risco de retaliação massiva.
3. Preocupações com direitos de mulheres e crianças: debates sobre esportes, banheiros e cuidados médicos
Um argumento recorrente é a defesa de espaços e direitos "exclusivos" para mulheres cisgênero. Políticos de direita, como Trump, enfatizam a proibição de atletas trans em esportes femininos, alegando vantagens biológicas injustas (por exemplo, níveis de testosterona). Isso ressoa em debates sobre "justiça esportiva" e proteção contra violência em banheiros ou vestiários. Além disso, há críticas à "ideologia de gênero" em escolas e tratamentos médicos para menores trans, vistos como "experimentos" ou "mutilações". No Brasil, a extrema direita usa discursos jurídicos para contestar políticas LGBTQI+, argumentando que elas violam direitos parentais ou infantis. Estudos mostram que essas preocupações são ampliadas por desinformação, mas para muitos conservadores, elas representam uma defesa genuína de vulneráveis, como meninas em competições ou crianças em transição.
4. Reação ao progresso social: anti-Woke e medo de mudanças rápidas
A ascensão da visibilidade trans nas últimas décadas coincide com avanços em direitos LGBTQ+, o que gera backlash em círculos conservadores. A direita frequentemente enquadra isso como parte de uma "agenda woke" imposta por elites liberais, ameaçando liberdades individuais (como liberdade de expressão ou religião).
No contexto global, movimentos de extrema direita no Brasil e EUA usam transfobia como arma contra lideranças progressistas, misturando-a com racismo e sexismo para intimidar figuras como Erika Hilton (trans e negra). Análises apontam que, apesar de avanços, políticas para trans permanecem escassas, e a exclusão histórica (como violência e desemprego) é exacerbada por essa retórica. Para alguns, o incômodo reflete um medo mais amplo de perda de hegemonia cultural em uma sociedade diversificada.
5. Fatores psicológicos e sociais: preconceito e falta de exposição
Em um nível individual, o desconforto pode vir de falta de familiaridade: estudos psicológicos mostram que contato com minorias reduz preconceitos, mas em bolhas conservadoras, narrativas midiáticas amplificam medos. Políticos exploram isso para reforçar identidades grupais, onde "nós" (tradicionalistas) versus "eles" (trans e aliados) fortalece a coesão. No entanto, há exceções, como "trans de direita" que enfrentam rejeição interna, ilustrando que o espectro político nem sempre é monolítico.
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Em resumo, o incômodo com pessoas trans entre a direita não é monolítico, mas frequentemente une conservadorismo cultural, estratégia política e preocupações específicas. Enquanto alguns veem isso como defesa de normas, outros analisam como forma de opressão. Uma abordagem truth-seeking sugere que diálogos baseados em evidências científicas (como estudos da OMS sobre identidade de gênero) e empatia poderiam mitigar divisões, mas o contexto polarizado atual perpetua o ciclo.
