DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA

Oito em cada 10 homens mortos por armas de fogo no Brasil são negros

Estudo do Instituto Sou da Paz analisou impacto da violência armada na desigualdade racial no país

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Ao sancionar o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra como feriado nacional, por meio Lei nº 3.268/2021, o Brasil avança no reconhecimento das lutas e conquistas da população negra. A data é um convite para refletir sobre a formação multicultural do brasileiro e sobre a urgência em construir uma sociedade mais justa e igualitária.

O momento traz à pauta temas que mostram, em diferentes abordagens, como os negros ainda se defrontam com problemas sérios - um deles é a violência, como ressalta levantamento que acaba de ser divulgado pelo Instituto Sou da Paz.

A pesquisa Violência armada e racismo: o papel da arma de fogo na desigualdade racial, é a terceira edição do relatório que chama atenção para o fato de a violência armada ser um problema também de causas raciais e de gênero, o que evidencia a necessidade de integrar políticas de segurança pública e políticas sociais para a solução da questão.

O estudo mostra que homens negros são desproporcionalmente impactados pela violência armada. Além da alta mortalidade por arma de fogo, eles representam 68% dos atendidos no sistema de saúde em razão de algum tipo de agressão armada. “A desigualdade racial está no cerne da mortalidade por arma de fogo no país”, afirma a diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo.

A análise revelou que as armas de fogo foram as responsáveis por quase 38 mil mortes anuais de homens no Brasil entre 2012 e 2022. Esse número indica que, para cada três homens assassinados no Brasil, dois são mortos por armas de fogo. É justamente na fase produtiva dos homens em que cresce a chances de mortes, já que 43% das mortes ocorrem na faixa de 20 a 29 anos, e 40%, entre 30 e 59 anos.

A pesquisa alerta para o sistema de desigualdade racial que também recai sobre as vítimas da violência armada. Homens negros são 79% das vítimas, sendo três vezes mais propensos a serem mortos por armas de fogo do que homens não negros - ou seja, 8 em cada 10 homens mortos por arma de fogo são negros no Brasil.

A pesquisa foi realizada entre 2012 e 2022 em todas as regiões brasileiras. Em Minas Gerais, a taxa de homens negros assassinados por arma de fogo, em 2022, mostra que, a cada 100 mil vítimas, 21,6 eram negros e 8,8 não negros, enquanto, em Belo Horizonte, esse número fica em 26 negros mortos e 12 não negros, no total de 100 mil homens vitimados  pela violência.

Para a coordenadora de projetos do Instituto Sou da Paz e uma das autoras da pesquisa, Cristina Neme, os dados mostram a permanência da desigualdade racial entre as vítimas da violência armada. "A população negra é muito mais vitimada pela violência no país, o que demonstra que a desigualdade racial segue como um problema estrutural no Brasil", afirma.

Ela reforça a constatação de que a população negra sofre com os piores índices sociais, considerando, em um espectro mais amplo, questões como maiores dificuldades quanto a  acesso a educação, saúde e renda, se comparado aos brancos.

"A violência conecta tudo isso. Mostra que os negros são mais vulneráveis socialmente e mais expostos à violência armada. E isso se mantêm ao longo do tempo. Hoje, o dia especial é um momento de falar sobre os aspectos positivos acerca da participação dos negros no país, mas também sobre a necessidade de se ter políticas públicas eficazes que possam reverter esse quadro de violência, tão grave", diz Cristina.

Os homens jovens, entre 20 e 29 anos, e os adolescentes, de 15 a 19 anos, são os que sofrem as mais altas taxas de homicídio por arma de fogo - as taxas são quase duas e três vezes superiores à taxa média de homicídios masculinos, respectivamente.

O Nordeste continua sendo a região que concentra a maior taxa de homicídios armados, com 57,9 mortes por 100 mil homens. A região é seguida pelo Norte, que tem uma participação proporcional baixa, mas uma taxa alta de 49,1. O Centro-Oeste (27) vem atrás, seguido do Sul (23,2) e do Sudeste (16,1).

As vias públicas concentram 50% das ocorrências dos homicídios, mas esse dado se altera conforme a faixa etária. Essa característica reforça a ideia de que a violência armada no Brasil é altamente visível, gerando impactos diretamente na sensação de segurança coletiva. A rua é o espaço onde ocorre a violência a partir da adolescência, passando pela juventude e vida adulta, na medida que a residência se destaca como local da agressão armada contra crianças e pessoas mais velhas.

Violência não letal

Em 2022, foram registradas 4.702 notificações de violência armada não letal contra homens no Brasil. A desigualdade racial também é notada nesse aspecto - os homens negros são a maioria das vítimas em quatro das cinco regiões do país. A análise dos números em termos relativos revela que todas as regiões apresentam taxas de notificação de violência armada não letal superiores para os homens negros.

Autoria

As informações disponíveis sobre a autoria da agressão armada indicam que a maior parte das pessoas que cometem a agressão é desconhecida, o que representa 46% dos casos. Já as pessoas conhecidas são 17% e 7% policiais. A idade das vítimas também altera o perfil dos agressores. Os autores conhecidos têm uma  maior participação nos casos de violência armada contra crianças - eles representam 32% dos algozes. Já entre os adolescentes e adultos jovens, os policiais respondem por 9% das agressões.  

Dia da Consciência Negra 

A escolha do dia 20 de novembro para reverenciar o povo negro é uma alusão à morte de Zumbi dos Palmares, líder do Quilombo dos Palmares, como resistência contra a escravidão. “A data é um símbolo de luta, resistência e orgulho. Esse é um momento para reforçar a luta contra o racismo e a necessidade de honrar as contribuições africanas na formação da sociedade brasileira”, diz o professor de história do Centro Universitário de Brasília (CEUB), Edson Violim.

Segundo o docente, as raízes africanas são uma parte essencial da identidade e da história do Brasil. “O nosso jeito de ser, enquanto brasileiros, não veio da Europa, mas sim da África. A cultura negra está presente na nossa culinária, música e esporte”, acrescenta.

Por outro lado, mesmo em tempos atuais, combater o racismo e o preconceito deve ser uma luta de todos os brasileiros, sobretudo pela herança mista da população. “Negar o racismo no Brasil é tapar o sol com a peneira. Ele existe sim e precisamos combatê-lo. Estudos apontam que, de cada cinco brasileiros que se consideram brancos, três possuem sangue africano ou indígena”, detalha Edson Violim, reforçando que o racismo é um problema estrutural e histórico. "Precisamos enfrentar essa questão com seriedade e manter a luta contra o racismo. Esse flagelo ainda marca nossa sociedade".

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