Aplicativo para condomínios permite que mulheres denunciem violência doméstica e familiar de forma sigilosa -  (crédito: Mart Production/Reprodução)

Aplicativo para condomínios permite que mulheres denunciem violência doméstica e familiar de forma sigilosa

crédito: Mart Production/Reprodução

Foi durante a pandemia da COVID-19 que a síndica profissional Bruna Cavalcante recebeu uma denúncia de violência doméstica em um dos condomínios que administra. A partir do canal de chamados do aplicativo uCondo, ela pôde tomar conhecimento de um caso de agressão constante e, assim, acionar as autoridades para uma intervenção do que poderia ter se tornado estatística de feminicídio.

 

“Ela conseguiu contar que estava sendo proibida até mesmo de sair de casa, que estava com uma criança pequena, e que não conseguia tomar nenhuma atitude para entrar em embate com o marido por ser totalmente dependente dele, inclusive financeiramente”, conta a síndica sobre um dos primeiros casos – que serve de exemplo até hoje para outras mulheres – de denúncia através do aplicativo.

 

 

“Foi assim que percebemos a importância de ter uma comunicação além do WhatsApp. O marido dela nunca pensou que ela conseguiria ajuda através do aplicativo do condomínio, porque as pessoas ainda o veem como algo muito burocrático para serviços como emissão de segunda via de boleto, conferência de documentação do condomínio etc. Mas ele também é uma forma de apoio”, complementa Cavalcante, que já chegou a receber uma denúncia de filhas que eram agredidas pelo pai.

 

Importância das denúncias

 

De acordo com dados divulgados pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais (Sejusp-MG), o número de registros de violência doméstica e familiar no estado chegou a 154.742 em 2023. Houve um aumento de 9,4% em relação ao ano anterior, quando o total foi de 141.441 denúncias.

 

O crescimento pode estar relacionado tanto ao aumento da violência quanto ao fato de que as mulheres estão denunciando mais. É o que explica a advogada especialista em Direito da Mulher e de Família e Sucessões Vanessa Paiva.

 

“Historicamente, a violência contra a mulher sempre foi uma questão naturalizada, mas isso tem mudado e, recentemente, vemos cada vez mais mulheres que sofrem com essas violências registrando, divulgando isso nas mídias e levantando a bandeira contra o silêncio”, afirma. “Ainda há o sentimento de que é muito vergonhoso passar por uma situação dessas [de violência]. O clima de uma delegacia, mesmo aquelas especializadas em Defesa da Mulher, é muito hostil, por isso muitas mulheres têm vergonha de denunciar”, complementa.

 

 

Por este motivo, a Head de Marketing do uCondo Beatriz Esteves, reforça a importância de canais de denúncia sigilosos – mas não anônimos – como o que há no aplicativo. Para ela, é importante que essas mulheres não se exponham para que não sofram mais.

 

“Hoje, quando acontece alguma coisa num condomínio, o morador vai avisar a sua gestão, seja para coisas simples, como uma lâmpada queimada, seja para assuntos mais graves. O diferencial do uCondo é que os moradores têm a privacidade conservada quando vão fazer um chamado, ao contrário daqueles livros que, antigamente, ficavam disponíveis para todos lerem o que outras pessoas escreveram”, afirma ela.

 

“Agora, as denúncias são sigilosas, mas não anônimas, o que significa que o administrador do condomínio sabe quem está fazendo a denúncia, mas que os outros moradores não precisam saber. A pessoa não precisa se expor para todo mundo e pode, inclusive, receber feedbacks do síndico sobre ações que já foram tomadas, quais os próximos passos”, acrescenta Esteves.

 

Projetos de Lei

 

Atualmente, há alguns projetos de Lei federais em tramitação que prometem garantir maior proteção às vítimas de violência doméstica e familiar dentro de condomínios, como o PL de n° 5064/20, que obriga síndicos e administradores de condomínios a comunicar às autoridades competentes os casos de violência contra mulheres, crianças, adolescentes, idosos e pessoas com deficiência (PcD).

 

Há, também, o PL de n° 2510/19, que propõe que, não apenas que gestores do condomínio efetuem a denúncia, mas também condôminos, locatários e possuidores se responsabilizem pela ação. Caso aprovado, também aumentará a pena do crime de omissão de socorro quando se tratar de mulher em situação de violência doméstica e familiar.

 

Em todos os casos, a intenção é levar mais segurança para condomínios que, para Beatriz Cavalcante, tem demanda crescente a cada ano que passa. “Cada vez mais, as pessoas tendem a ir morar em condomínios, e tecnologias como essa facilitam muito a vida dessas pessoas, seja para demandas do dia a dia, seja para uma denúncia de violência doméstica. É importante lembrar que, em briga de marido e mulher, se mete a colher, sim”, afirma.

 

Outras formas de denunciar

 

Minas Gerais tem 69 delegacias especializadas em atendimento à mulher, distribuídas na capital e interior do estado. Ligadas à Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG), essas delegacias prestam atendimento às mulheres vítimas de violência, incluindo casos de importunação ofensiva e violência doméstica e sexual.

 

Em Belo Horizonte, estão situadas a Delegacia de Plantão Especializada em Atendimento à Mulher e a Casa da Mulher Mineira, abarcando uma série de ações, como a solicitação de medidas protetivas de urgência, que contempla o acompanhamento policial até a residência da vítima para retirada de seus pertences em segurança (roupas, documentos, medicamentos etc); recebimento da guia de exame de corpo de delito; realização da representação criminal para a devida responsabilização do agressor; recebimento e encaminhamento para casas-abrigo; serviços de atendimento psicossocial; orientação jurídica na Defensoria Pública, entre outros.

 

Além disso, o governo de Minas também gerencia o Centro Risoleta Neves de Atendimento (Cerna), que presta serviços psicológicos, jurídicos e sociais às moradoras da capital e do interior de Minas, além de oferecer capacitações a outros equipamentos da rede de enfrentamento à violência contra mulheres.

 

É possível, também, fazer um registro virtual no aplicativo “MG Mulher”, do qual é possível acessar tanto a delegacia virtual quanto a outros vídeos explicativos, com endereços de delegacias de polícia também. Caso uma pessoa saiba que a mulher está sendo vítima de violência doméstica e queira fazer a denúncia de forma anônima, é possível ligar para o Disque 181. Ao fazer a ocorrência, a mulher pode pedir o requerimento da medida protetiva.