'Minas' fez de Bituca um astro cada vez mais luminoso, diz Márcio Borges
Compositor da faixa 'Gran circo', a última do Lado A do LP 'Minas', revela os bastidores da gravação do álbum que completa 50 anos em 2025
compartilhe
SIGA
MÁRCIO BORGES*
Há 50 anos, Bituca e nossa turma entrávamos mais uma vez no estúdio da EMI Odeon para imprimir nossa inesquecível digital no universo analógico daqueles dias. Anteriormente, já havíamos incendiado as plateias estudantis do Brasil por duas ocasiões, com o ‘Clube da esquina’ (1972) e ‘Milagre dos peixes’ (1974). No ano de 1975, nenhum de nós estava a fim de deixar por menos. Nossa luta desde muito deixara de ser meramente de vanguarda artística e estética, para assumirmos o compromisso cada vez mais claro e visceral com as bandeiras de liberdade, revolução e progressismo que nossas canções empunhavam (e iam virando hinos da juventude).
Bituca, no musical, e Ronaldo Bastos, no executivo, lideravam o bagunçado processo de gravação e criação de arranjos e letras para o disco “Minas”, com aquela quantidade de gente, Wagner Tiso, Beto Guedes, Toninho Horta, Nelson Angelo, Novelli, Nivaldo Ornelas.
Leia Mais
E pra ficar tudo ainda mais impressionante, Paulinho Braga dos tempos do Maletta, em BH, Tenório Jr., que o destino tornaria avô das minhas mesmas netas (meu filho se casou com a filha dele), o mitológico batera Edson Machado, mais Tavinho Moura, Fernando Leporace, Golden Boys, Nana Caymmi, Joyce, Lizzie Bravo e Fafá de Belém apresentando suas belezuras apenas para fazer os mais luxuosos backing vocals da história da MPB.
Cadê o Lô?
E todo mundo perguntando: ‘Cadê o Lô?’. O Lô, aos 20 anos de idade e sentindo-se exaurido criativamente, depois de ter criado o disco ‘Clube da esquina’ com Bituca e o 'Disco do Tênis' comigo, aos 18 anos, estava deliberadamente fora dos estúdios, curtindo a juventude em Arembepe (BA). Por isso não tem ele nesse ‘Minas’.
Enquanto Lô passeava e reagrupava energias criativas para sua 'Via-Láctea', as obras-primas do ‘Minas’ iam se perfazendo com Bituca, Fernando Brant, Ronaldo e eu: ‘Ponta de Areia’, ‘Fé cega, faca amolada’, ‘Saudades dos aviões da Panair’, ‘Gran Circo’, ‘Idolatrada’, ‘Beijo partido’ (essa do Toninho), etc. Esse etcétera inclui ‘Paula e Bebeto’ e eu me permito aqui contar uma historinha bem rápida.
Certa tarde, Bituca me convocou na casa dele e me disse sem introduções: ‘Sabe aquela canção que te dei semana passada pra você botar letra? Aquela pra falar de Paula e Bebeto (casal de namorados amigos nossos)? Precisa mais não. Caetano adorou ela e vai fazer a letra. Fala aqui com ele’. E colocou Caetano na linha.
Nós três rachamos de dar risada e saí dali mais honrado do que havia entrado. Assim, mais uma obra-prima se perfez, ‘Paula e Bebeto’, de Bituca e Caetano, aliás, na minha opinião, a maior de todas daquele disco.
E o que mais? Os técnicos Toninho e Darcy, mais nosso costumeiro engenheiro de som, Nivaldo Duarte, com uma dedicação e profissionalismo que sobressaíam naqueles dias.
Com aquele ‘Minas’, Bituca se tornava definitivamente um astro cada vez mais luminoso, de grande poderio gravitacional na constelação musical brasileira.
O futuro só fez dar grandeza e luz ao meu querido irmão de fé, Milmemptus, Vituperatus, Scariottis, Béfrius, tantos apelidos, tanto humor, tanta verve, meu palhaço, meu herói, minha alma gêmea, meu melhor amigo, meu ídolo e guru.
A bênção, meu Bituquinha amado de meu coração. Mais um feliz cinquentenário pra nossa obra, de tantos que ainda restam.
* Márcio Borges, poeta, escritor e compositor, fez a letra de 'Gran Circo', faixa do disco 'Minas'