Zaquia Jorge abriu salas de espetáculos em Ipanema e Madureira, fez fama na companhia de Walter Pinto e morreu afogada no mar, aos 33 anos -  (crédito: Funarte/reprodução)

Zaquia Jorge abriu salas de espetáculos em Ipanema e Madureira, fez fama na companhia de Walter Pinto e morreu afogada no mar, aos 33 anos

crédito: Funarte/reprodução

Mulher à frente de seu tempo, a atriz e empresária fluminense Zaquia Jorge (1924-1957) tem sua história resgatada pelo jornalista Marcelo Moutinho no livro “Estrela de Madureira” (Editora Record). Ícone da cultura suburbana carioca, a vedete faria 100 anos em 2024.

 


O autor soube da existência de Zaquia por meio das canções “Estrela de Madureira” (Acyr Pimentel e Cardoso), grande sucesso na voz do cantor Roberto Ribeiro, e “Madureira chorou”, de 1958, samba dedicado à artista logo depois de sua morte, composto por Júlio Monteiro, marido dela, e Carvalhinho.

 

 


“Curiosamente, nenhuma das duas canções menciona o nome de Zaquia”, observa o biógrafo. Moutinho, que morava em Madureira, conta que sempre ouviu a Zona Norte carioca falar da artista “como uma espécie de mito”, que teve a coragem de abrir teatro numa região do Rio de Janeiro onde não havia esse tipo de equipamento. Ela morreu afogada, aos 33 anos, na Barra da Tijuca.

 

Dercy Gonçalves e Zaquia Jorge no filme "A baronesa transviada"

Dercy Gonçalves e Zaquia Jorge no filme "A baronesa transviada", lançado em 1957

Reprodução

 

A estrela esquecida

 

Não foi fácil a missão de resgatar Zaquia do esquecimento. “Não achei nada sobre ela”, lamenta o jornalista.

 


“Só sabiam que era a vedete que abriu um teatro em Madureira e morreu jovem. Não sabiam que ela trabalhou na companhia de Walter Pinto, na Praça Tiradentes, no auge do teatro de revista, que contracenou com Dercy Gonçalves e Oscarito e trabalhou nos teatros de Copacabana”, observa.

 


Moutinho chama a atenção para a migração do teatro de revista. Grandes espetáculos da Praça Tiradentes, no Centro do Rio, foram para pequenas casas da Zona Sul. “Por isso chamaram de teatro de bolso”, afirma.

 


A vedete arrendou uma sala de teatro em Ipanema, onde morava, em seus primeiros passos como empresária. Surpreendeu-se com a pujança de Madureira quando foi até lá para o aniversário de uma amiga numa churrascaria. Notou que lá havia intenso comércio, duas escolas de samba (Portela e Império Serrano), agência do Banco do Brasil e filiais de lojas conhecidas. “É aí que Zaquia percebe que havia espaço para se criar um teatro em Madureira”, conta o autor.

 


A jovem empreendedora enfrentou resistência de quem não acreditava na viabilidade de teatros na Zona Norte e também de moradores conservadores do bairro, avessos a vedetes do teatro de revista.

 


“Na época, mulheres não se maquiavam e nem usavam calças compridas em Madureira, somente vestidos. As vedetes maquiadas de tamanco e calças compridas causaram espanto. Moradores acreditavam que aquelas mulheres estragariam suas famílias”, comenta o autor.

 

Zaquia Jorge e vedetes da companhia de teatro de Walter Pinto

Zaquia Jorge era uma das vedetes da companhia de teatro de Walter Pinto. Na foto ela está embaixo, à direita

Funarte/divulgação

 


Moutinho explica que Zaquia, com muita habilidade, passou a frequentar o bairro, a conversar com os moradores, a almoçar por lá, a fazer convênios com o comércio local e a frequentar a quadra da Portela. “Ela foi quebrando as resistências até transformar o teatro em um grande sucesso. Infelizmente, quando a casa estava no auge, ela morreu.”

 

Comoção na capital do Brasil

 


Em 1957, o trágico afogamento de Zaquia causou comoção. “Todos os jornais do Rio de Janeiro deram espaço de capa para falar da sua morte. Reproduzo no livro as manchetes. Mais de quatro mil pessoas foram a seu funeral, o presidente Juscelino Kubistschek mandou um representante oficial ao velório dela”, conta Moutinho.

 


De acordo com o biógrafo, Zaquia Jorge foi um exemplo de protagonismo feminino. “Esta mulher de vinte e poucos anos se aventura como empresária na área de teatro, com todo o machismo que havia na época, e consegue ser bem-sucedida. Ela teve um primeiro casamento e se desquita para seguir a carreira artística, porque o marido não aceitava a situação. Deixa a guarda do filho com ele e faz questão de retomar o nome de solteira. Já havia ali uma ideia de autonomia muito grande”, observa Moutinho.

 


Em 1975, o Império Serrano a tirou do limbo, lançando o enredo “Zaquia Jorge, vedete do subúrbio, estrela de Madureira”.

 


Zaquia Jorge participou dos filmes “Sob a luz do bairro”, “Fantasma por acaso” e “Caídos do céu”, todos lançados em 1946, “Pinguinho de gente” (1949), “A serra da aventura” (1950), “Aguenta firme, Isidoro” (1951) e “A baronesa transviada” (1957).

 

“ESTRELA DE MADUREIRA”


• De Marcelo Moutinho
• Editora Record
• 182 páginas
• R$ 84,90
• E-book: R$ 54,90