Andréa Beltrão, Atriz 
 -  (crédito: Curta/Divulgação)

Andréa Beltrão, Atriz 

crédito: Curta/Divulgação


Uma experiência realizada durante a pandemia resultou no filme “Antígona 442 a.C.”, protagonizado por Andrea Beltrão e dirigido por Maurício Farias, que estreia no Canal Curta! no Dia Mundial do Teatro, celebrado nesta quarta-feira (27/3). O longa combina as linguagens teatral e cinematográfica, a partir da peça “Antígona”, que a atriz estreou em 2016 e com a qual rodou o país, tendo sido vista por mais de 40 mil pessoas.


Na tragédia de Sófocles, Antígona desafia uma ordem do rei Creonte e decide sepultar o corpo do irmão Polinices. Por julgá-lo um traidor, o rei decidiu desonrá-lo, impedindo seu enterro. A desobediência seria punida com a morte, o que não impediu Antígona de enfrentar sozinha o tirano.

 


Na peça, dirigida por Amir Haddad, Andréa Beltrão vive não somente a protagonista, mas todos os demais personagens, além de se colocar como uma espécie de comentarista do texto e da própria montagem. Essa dinâmica foi transposta para o filme, que traz registros dos preparativos e bastidores da peça. Excetuando-se a sequência inicial, quando a equipe é mostrada, somente Andrea aparece na tela – ora maquiada no palco, representando, ora de cara limpa, tecendo considerações sobre a obra.


“Quando veio a pandemia, aquele momento tão difícil, o governo Bolsonaro, todas aquelas notícias tristes, aquela desolação total, eu ficava louca para falar o texto de 'Antígona', por conta das sandices ditas pelos poderosos na peça. Fomos, eu, Maurício, meu filho José e mais um pequeno grupo de pessoas para o Poeirinha, que é um teatro que tenho aqui no Rio de Janeiro com Marieta Severo, e começamos a experimentar coisas”, conta a atriz.

 


Ao anseio de Andrea, somou-se o desejo do diretor, alimentado há muitos anos, de trabalhar uma linguagem híbrida. Ele diz que sempre teve vontade de filmar teatro, inspirado por diretores como Carlos Saura ou Ettore Scola. “Foi dessa vontade que surgiu a ideia de a gente filmar 'Antígona', mas não fazendo um mero registro da peça e, sim, interpretando aquilo, sem dispensar os recursos teatrais”, diz.

 


Andrea reforça esse aspecto de “Antígona 442 a.C.” – o de não ser simplesmente uma peça gravada, o que ela acha “terrível” e “anacrônico”, por ficar num limbo que não é nem uma coisa nem outra. “Por estarmos sozinhos dentro do teatro, com tempo para pensar e repensar, fazer e refazer, foi ficando uma coisa legal, que a gente curtia. Maurício editou, sonorizou e outras pessoas também se juntaram, como o próprio Amir”, conta.


FECUNDA IGNORÂNCIA

Tanto a dramaturgia da peça quanto o roteiro do filme foram pensados de forma a revelar as muitas facetas e questões presentes no texto de Sófocles. A atriz afirma que tanto a peça quanto o filme nasceram da ignorância. “Amir me fazia várias perguntas sobre a história e eu não sabia responder. Isso foi o que nutriu o espetáculo, no sentido de entender os personagens e suas ligações.”


Ela conta que combinou com Haddad que a plateia deveria saber identificar imediatamente cada personagem que aparecesse em cena. “Na Grécia, todo mundo sabia quem era Édipo, Laio, Hera, Penteu. Hoje em dia, a gente tem que falar quem são essas pessoas e como se relacionam, porque senão vira só um texto antigo. O clássico é maravilhoso, mas o antigo é chato. Afasta muito você não saber de quem se está falando”, comenta.

 


Esse pensamento foi o mote para a criação de uma espécie de diagrama com os nomes dos personagens da tragédia e suas ligações. Assim, o público (ou o espectador) tem acesso a uma árvore genealógica que começa com Zeus, onde pode “consultar” quem é cada personagem. “No teatro parecia um jogo de tênis. Se eu falava em Eurídice, a plateia desviava a atenção de mim, ia checar nesse mapa mental quem era e retornava sabendo”, diz.


Maurício ressalta que “o roteiro mistura o texto de Sófocles traduzido por Millôr com as colocações de Andrea relacionadas à Trilogia Tebana (“Edipo Rei”, “Édipo em Colono”, “Antígona”). O que fiz foi trazer um pouco a preparação, o bastidor, a sala de ensaio para uma estrutura que a peça já propunha, da atriz conversando com o público e interpretando ao mesmo tempo”.


TERCEIRA PESSOA

 

Andrea Beltrão diz que as diferentes camadas da peça e do filme nasceram de provocações do diretor Amir Haddad. Ela observa que, numa montagem teatral, existe a primeira pessoa, que é o narrador, e a segunda, que são os personagens. O dramaturgo ficava lhe perguntando pela terceira pessoa. “Ele dizia que enquanto não tivesse a terceira pessoa, o espetáculo não estaria completo. A terceira pessoa chegou na medida em que consegui dar minha opinião, como atriz, sobre o que estava acontecendo. Foi um processo meio caótico, mas, quando encontrei esse lugar, do meu jeito, foi maravilhoso”, afirma.


“ANTÍGONA 442 A.C.”
Direção: Maurício Farias. Com Andrea Beltrão. Dramaturgia de Andrea Beltrão e Amir Haddad. Estreia nesta quarta (27/3), às 22h30, no Canal Curta.! Duração: 70 min. Classificação: 14 anos. Horários alternativos: quinta (28/3), às 2h30 e às 16h30; sexta (30/3), às 16h15; e sábado (31/3), às 22h30. “Antígona 442 a.C.” também estará disponível no CurtaOn, no especial “Gente de teatro”.