LC
Luiz Carlos Azedo
ENTRE LINHAS

Diretor da PF põe saia justa no STF ao explicar sigilo do caso Master

Durante a Operação Compliance Zero, deflagrada para apurar um esquema bilionário de fraudes bancárias, a PF identificou possível conexão com autoridade detentor

Publicidade

Mais lidas

O caso do Banco Master assombra o Supremo Tribunal federal (STF). A explicação pública do diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, sobre a adoção do sigilo ampliado no caso Master colocou o Supremo Tribunal Federal numa saia justa institucional. Ao detalhar, com cautela técnica, que a PF interrompe investigações sempre que surge um “achado” envolvendo autoridade com prerrogativa de foro para evitar nulidades processuais, Rodrigues expôs um ponto sensível: o STF passou a concentrar integralmente o controle do inquérito por força de um modelo jurídico que vem ampliando, de forma contínua, o raio de ação da Corte.

Fique por dentro das notícias que importam para você!

SIGA O ESTADO DE MINAS NO Google Discover Icon Google Discover SIGA O EM NO Google Discover Icon Google Discover

O procedimento adotado pela PF é formalmente correto e segue jurisprudência consolidada. O problema não está no rito, mas no efeito político e institucional produzido pela transferência automática de todas as ações ao Supremo e pela decisão do relator de impor sigilo máximo ao caso. Ao explicar o processo com transparência, Rodrigues deixou claro que a iniciativa não partiu da corporação, mas de uma obrigação institucional que concentra no STF o comando de investigações sensíveis. O foco do escândalo financeiro agora está no colo do próprio Supremo.

O chamado foro por prerrogativa de função, previsto na Constituição, determina que determinadas autoridades – como ministros de Estado, parlamentares federais e ministros de tribunais superiores – sejam investigadas e julgadas diretamente pelo STF. Na prática, sempre que surge um indício concreto de envolvimento de alguém com foro especial no curso de uma investigação, a Polícia Federal e o Ministério Público são obrigados a suspender as apurações na primeira instância e remeter os autos ao tribunal competente.

Qualquer diligência realizada sem essa cautela pode gerar nulidade processual e comprometer todo o inquérito. É tudo o que desejam os advogados do banqueiro Daniel Vorcaro, principal envolvido no escândalo. Durante a Operação Compliance Zero, deflagrada para apurar um esquema bilionário de fraudes bancárias, a PF identificou um “achado” que indicaria possível conexão do caso com autoridade detentora de foro.

Diante disso, as investigações foram temporariamente interrompidas e encaminhadas ao STF. A operação investiga a atuação do Banco Master em operações irregulares, principalmente com o Banco de Brasília (BRB). Segundo a PF, o Master teria vendido carteiras de crédito sem lastro ao banco estatal, com a anuência do então presidente do BRB, Paulo Henrique Costa, que acabou afastado. Vorcaro, controlador do banco, chegou a ser preso preventivamente, mas foi solto posteriormente.

No material apreendido, a Polícia Federal encontrou um contrato de prestação de serviços jurídicos entre o Banco Master e o escritório de advocacia de Viviane Barci de Moraes, esposa do ministro do STF Alexandre de Moraes. O contrato previa pagamentos de até R$ 129 milhões em três anos, com remuneração mensal de R$ 3,6 milhões, e tinha escopo genérico de consultoria e assessoria jurídica. O suposto acordo não foi executado integralmente em razão da liquidação extrajudicial do banco, decretada pelo Banco Central.


Espelho incômodo

A identificação desse contrato, somada à localização de documentos que mencionavam um deputado federal, levou o caso ao Supremo. Sorteado relator, o ministro Dias Toffoli determinou que todas as ações relacionadas ao inquérito passassem a tramitar exclusivamente no STF e impôs sigilo ampliado aos autos. Com isso, a 10ª Vara Federal de Brasília suspendeu o inquérito e remeteu todos os pedidos pendentes à Corte. Essa revelação criou grande constrangimento para o ministro, sua esposa e o próprio Supremo.

Desde a tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023, o STF teve suas prerrogativas significativamente ampliadas, assumindo protagonismo central na defesa da ordem constitucional. Autorizou investigações de ofício, validou instrumentos atípicos e concentrou decisões estratégicas para conter a ruptura democrática. Essa ampliação foi amplamente legitimada pelo contexto excepcional.

Ocorre que poder excepcional não pode se converter em regra permanente. A frequência de decisões monocráticas de grande alcance, a ampliação do sigilo sem balizas claras e a concentração de processos sensíveis em relatorias individuais desgastam a legitimidade simbólica do Supremo, sobretudo nos meios jurídicos. A legalidade formal permanece preservada, mas a percepção pública de equilíbrio, impessoalidade e autocontenção começa a se deteriorar.

A fala de Andrei Rodrigues funcionou como um espelho incômodo. Deslocou a responsabilidade política para o foro competente, porém, ao não revelar o nome da autoridade envolvida, corretamente, deixou no ar uma tensão que recai diretamente sobre o Supremo, sobretudo quando fatos paralelos ganham repercussão pública. O momento exige algo além da estrita observância da lei: o cuidado extremo com a imagem da instituição.

A confiança pública é um ativo tão relevante quanto a autoridade jurídica. Quando essa confiança se fragiliza, mesmo decisões corretas passam a ser contestadas. A saia justa criada pela fala do diretor da PF decorre da própria condição institucional que hoje coloca o Supremo no centro das crises. Por isso, cresce a necessidade de um ponto de equilíbrio entre decisões monocráticas e colegiadas e da discussão de um código de conduta com regras explícitas sobre comportamentos que, mesmo legais, possam comprometer a aparência de imparcialidade.

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

Tópicos relacionados:

foro-privilegiado master policia-federal stf

Acesse o Clube do Assinante

Clique aqui para finalizar a ativação.

Acesse sua conta

Se você já possui cadastro no Estado de Minas, informe e-mail/matrícula e senha. Se ainda não tem,

Informe seus dados para criar uma conta:

Digite seu e-mail da conta para enviarmos os passos para a recuperação de senha:

Faça a sua assinatura

Estado de Minas

Estado de Minas

de R$ 9,90 por apenas

R$ 1,90

nos 2 primeiros meses

Aproveite o melhor do Estado de Minas: conteúdos exclusivos, colunistas renomados e muitos benefícios para você

Assine agora
overflay