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Estado de Minas

Olimpíada Tóquio 2020: Simone Biles, a estrela da ginástica que deve fazer história nos Jogos

Quando chegou à Rio-2016, aos 19 anos de idade, sua estreia em jogos olímpicos foi marcada por quatro medalhas de ouro (salto, solo, individual geral e disputa por equipes) e uma de bronze (trave olímpica).


23/07/2021 11:07 - atualizado 23/07/2021 14:58


Tóquio é a segunda Olimpíada de Simone Biles, e talvez seja a última
Tóquio é a segunda Olimpíada de Simone Biles, e talvez seja a última (foto: Reuters)

Ela é a ginasta mais condecorada da história dos Estados Unidos e chega a Tóquio como favorita. Aos 24 anos de idade, Simone Biles é considerada uma atleta tão superior que a principal competição nestes jogos será com ela própria.

"Estou tentando ser melhor do que fui na última vez, então estou tentando vencer a mim mesma", disse Biles recentemente em entrevista à rede NBC, ao revelar como se mantém motivada, já que não há adversária à sua altura na ginástica artística.

Tóquio é a segunda Olimpíada de sua carreira, e talvez seja a última. Em 2012, aos 15 anos, ela não tinha a idade mínima de 16 anos para participar dos jogos de Londres.

Quando chegou à Rio-2016, aos 19 anos de idade, sua estreia em jogos olímpicos foi marcada por quatro medalhas de ouro (salto, solo, individual geral e disputa por equipes) e uma de bronze (trave olímpica).

Após a consagração no Rio, Biles seguiu colecionando vitórias. Ela tem 25 medalhas em campeonatos mundiais, sendo 19 de ouro, superando o recorde do ginasta Vitaly Scherbo, de Belarus, que ao longo da carreira, nos anos 1980 e 1990, somou 23 medalhas em mundiais, sendo 12 de ouro.

Neste ano, Biles conquistou seu sétimo título no Campeonato Americano, também um recorde. Mas não é apenas o número de medalhas que faz dela uma atleta única.

A combinação de precisão técnica e de atributos físicos como a baixa estatura, a força e as pernas musculosas, além do alto grau de dificuldade dos seus movimentos, fazem com que a atleta de 1,42 metros de altura consiga executar com perfeição manobras tão complexas que outras ginastas nem sequer arriscam.


Para alguns entusiastas, Biles é a maior ginasta de todos os tempos no mundo, não apenas nos EUA
Para alguns entusiastas, Biles é a maior ginasta de todos os tempos no mundo, não apenas nos EUA (foto: Reuters)

"Ela é verdadeiramente a maior ginasta de todos os tempos no mundo, não apenas nos Estados Unidos", diz à BBC News Brasil a treinadora aposentada Valorie Kondos Field, que comandou a equipe de ginástica artística feminina da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) de 1991 a 2019.

"Ela tem todos os atributos físicos para executar movimentos muito difíceis que nenhuma outra mulher conseguiu", ressalta Kondos Field, que chegou a recrutar Biles para a equipe da UCLA, antes de a ginasta decidir que, em vez de entrar na universidade, iria se dedicar inteiramente ao esporte como atleta profissional.

Em maio deste ano, depois de 18 meses sem competir devido aos cancelamentos de eventos esportivos durante a pandemia de coronavírus, Biles entrou para a história como a primeira mulher a completar o salto Yurchenko Double Pike (Yurchenko com duplo mortal carpado) em uma competição.

Essa manobra envolve um salto apoiando-se sobre as mãos, de costas, no cavalo, e impulsionando o corpo a uma altitude suficiente para completar dois giros com o corpo dobrado e as pernas esticadas, e é tão difícil e perigosa que nunca havia sido tentada por outra ginasta em uma competição.

"Sua mente é igualmente forte", observa Kondos Field, lembrando que Biles consegue performances perfeitas mesmo sob enorme pressão.

"Eu converso com ginastas homens que executaram alguns dos mesmos movimentos (de Biles) e eles dizem que é muito difícil não perder o controle quando você está vendo o chão vindo em sua direção tão rápido. A capacidade mental de Simone é tão impressionante quanto sua capacidade física."

Expectativa para Tóquio

Biles lidera a equipe de ginástica feminina dos Estados Unidos em Tóquio, composta também por Sunisa Lee, Jordan Chiles, Grace McCallum, Jade Carey e MyKayla Skinner.

Muitos analistas apostam que, nestes jogos, ela poderá repetir ou até superar o número de medalhas de ouro conquistadas no Rio.


Biles lidera a equipe de ginástica feminina dos EUA em Tóquio
Biles lidera a equipe de ginástica feminina dos EUA em Tóquio (foto: Reuters)

Se ela vencer novamente no individual geral, poderá se tornar a primeira mulher em 53 anos a conquistar o ouro na prova em duas Olimpíadas consecutivas. A última ginasta a conseguir a façanha foi Vera Caslavska, da então Tchecoslováquia, em 1964 e 1968.

Caso Biles conquiste cinco ouros, irá igualar o feito da soviética Larisa Latynina, somando nove medalhas de ouro em jogos olímpicos.

Há grande expectativa de que Biles repita em Tóquio o Yurchenko Double Pike, o que deve consolidar a decisão de batizar o salto com seu nome.

Na ginástica artística, alguns movimentos recebem o nome do ginasta que os executou pela primeira vez em uma grande competição. Biles já tem outros quatro movimentos com seu nome.

A pontuação final de um ginasta reflete a soma de duas notas: de dificuldade, com base no valor definido pelo Código de Pontuação para cada movimento realizado, e de execução, que leva em conta elementos como a técnica apresentada pelo atleta.

Em maio, quando Biles apresentou o Yurchenko Double Pike pela primeira vez em uma competição, a Federação Internacional de Ginástica (FIG) estabeleceu uma nota de dificuldade de 6,6 pontos para a manobra.

Biles considerou a nota muito baixa, dado o enorme grau de dificuldade do salto. Não foi a primeira vez que a ginasta reclamou que a FIG estabeleceu nota injusta para um novo movimento apresentado pela primeira vez por ela.

Mas, como Biles é tão melhor que as demais competidoras e consegue executar com facilidade movimentos muito difíceis para outras atletas, um dos objetivos da decisão da FIG é evitar que ginastas menos talentosas tentem copiar manobras perigosas introduzidas por Biles e acabem se machucando.

Escândalo de abusos

A trajetória de Biles desde a Rio-2016 até chegar a Tóquio não foi marcada apenas por vitórias.

Logo após os jogos no Brasil, começaram a se tornar públicas as acusações de abuso sexual contra o ex-médico da seleção feminina de ginástica dos Estados Unidos, Larry Nassar.


Em 2018, Biles revelou que estava entre as centenas de mulheres e meninas abusadas pelo médico Larry Nassar
Em 2018, Biles revelou que estava entre as centenas de mulheres e meninas abusadas pelo médico Larry Nassar (foto: Reuters)

O escândalo ganhou força nos meses seguintes, à medida que diversas ginastas relataram a diferentes veículos de imprensa os abusos que sofreram enquanto eram tratadas por Nassar.

Em janeiro de 2018, Biles revelou no Twitter que ela também estava entre as centenas de mulheres e meninas abusadas pelo médico.

"Eu também sou uma das muitas sobreviventes que foram abusadas sexualmente por Larry Nassar", escreveu.

Biles contou que foi um longo processo até perceber que os supostos tratamentos que havia recebido nas mãos de Nassar eram iguais aos abusos relatados por tantas outras ginastas.

Ela disse que demorou a admitir o que havia acontecido, viveu períodos de depressão e temia decepcionar o público. Durante muito tempo, recusou-se a discutir o assunto mesmo com a família e amigos próximos.

Mas Biles conta que sentiu alívio ao finalmente compartilhar sua experiência. Nassar foi sentenciado a penas que somam mais de 300 anos de prisão.

As críticas de Biles à Federação de Ginástica dos Estados Unidos (USA Gymnastics) pelas falhas que permitiram que um predador como Nassar atuasse impunemente por tanto tempo tiveram um enorme impacto e levaram a renúncias no comando da organização.

Com 1,2 milhão de seguidores no Twitter, ela se firmou como voz importante não apenas no movimento #MeToo, contra assédio e agressão sexual, mas também em outras causas, como o movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam).

"Sinto que encontrei a minha voz", disse em entrevista recente à revista Sports Illustrated. "Às vezes pode ser difícil, mas eu também sei que estou ajudando outras pessoas, e é por isso que faço."

Pandemia e vida familiar

Assim como outros atletas, Biles sofreu um golpe em março do ano passado, quando o Comitê Olímpico Internacional confirmou que os jogos de Tóquio seriam adiados para 2021 por causa da pandemia de coronavírus.

Em entrevistas à imprensa americana, ela contou que caiu em lágrimas ao receber a notícia, enfrentou momentos de depressão e chegou a questionar se seu corpo poderia aguentar um ano extra do treinamento intensivo exigido para uma Olimpíada.

Sua idade, de 23 anos na época, já era considerada avançada em um esporte no qual as principais estrelas costumam ser adolescentes.


Biles viu a parada forçada por conta da pandemia como uma oportunidade para ficar mais com família e amigos
Biles viu a parada forçada por conta da pandemia como uma oportunidade para ficar mais com família e amigos (foto: Reuters)

Apesar da decepção com o adiamento dos jogos, ela diz que o descanso forçado durante sete semanas no início quarentena, quando os ginásios foram fechados, foi uma oportunidade de reexaminar sua vida fora do trabalho e passar mais tempo com a família e amigos.

"Fiz coisas que (antes) não podia por causa da ginástica", disse Biles em entrevista à revista Glamour.

Biles terminou um relacionamento de três anos com o também ginasta Stacey Ervin Jr. e começou a namorar o jogador de futebol americano Jonathan Owens.

"Eu consegui passar tempo de qualidade com meu namorado, meus amigos e minha família, o que eu nunca teria tido tempo para fazer se a Olimpíada fosse no ano passado", revelou à revista online Bustle.

Durante a quarentena ela também adotou um segundo buldogue francês, Rambo, para fazer companhia a Lilo, seu animal de estimação desde 2018, e se mudou para uma casa nova, em Spring, no Texas, a poucos minutos de distância de onde vivem seus pais, Nellie e Ron.

Ron é o avô materno de Biles. A atleta nasceu em Columbus, no Estado de Ohio, e sua mãe biológica, Shanon, era dependente de álcool e drogas e não tinha condições de criar Biles e seus três irmãos: Adria, Ashley e Tevin.

Recentemente, a ginasta revelou na série Simone vs. Herself ("Simone versus Ela Mesma"), exibida pelo Facebook Watch, serviço de vídeo sob demanda do Facebook, que chegou a passar fome na infância, quando vivia com a mãe biológica.

"Eu e meus irmãos éramos tão focados em comida, porque não tínhamos muita comida", disse.

Algum tempo depois de os quatro irmãos terem sido colocados em lares provisórios, Ron e sua segunda mulher, Nellie, levaram as duas crianças mais novas, Simone e Adria, para viver com eles no Texas. Elas foram oficialmente adotadas pelo casal em 2003, quando Biles tinha seis anos de idade. Ashley e Tevin foram viver com uma tia.

Foi nessa época, aos seis anos de idade, que Biles teve seu primeiro contato com a ginástica artística. Seu talento logo ficaria claro, e ela começou a trabalhar com uma treinadora, dando início a anos ininterruptos de treinamento.

Futuro

Passado o breve intervalo durante a quarentena, Biles voltou a treinar com energia redobrada. Foi nesse período, no ano passado, que aperfeiçoou o Yurchenko Double Pike.

Biles é reconhecida como uma atleta que está constantemente assumindo novos riscos e desafiando seus próprios limites.

"Seus treinadores (atuais e passados) fizeram um bom trabalho em ajudá-la a sempre se manter desafiada no esporte", afirma Kondos Field.

Os atuais treinadores de Biles são os franceses Cecile e Laurent Landi, e a ginasta já disse em entrevistas à imprensa americana que eles estão tentando convencê-la a competir em alguns eventos nos Jogos Olímpicos de Paris, em 2024.

Mas Tóquio deverá ser a última Olimpíada na qual Biles irá brilhar em todas as provas. Em entrevistas recentes, a atleta revelou que, com a idade e os anos de esforço intenso, seu corpo sente dor, e que sabe que não poderá seguir competindo para sempre.


Os atuais treinadores Cecile e Laurent Landi (nas pontas) tentam convencer Biles a competir nos Jogos Olímpicos de Paris, em 2024
Os atuais treinadores Cecile e Laurent Landi (nas pontas) tentam convencer Biles a competir nos Jogos Olímpicos de Paris, em 2024 (foto: Reuters)

"Eu aprendi, à medida que fui ficando mais velha, que a ginástica não é toda a minha vida, é apenas uma parte da minha vida", disse Biles na entrevista à Sports Illustrated.

"Você sempre tem que abrir mão de algo que ama no seu próprio tempo, e eu acho que é por isso que eu decidiria parar (de competir). Porque não gostaria que alguém decidisse por mim, que um médico me dissesse que eu não posso fazer isso. Você tem que saber quando chega a sua hora."

Mas Biles disse que acha melhor não saber qual será a sua última grande competição.

No embarque para Tóquio ao lado das companheiras de seleção, Biles falou sobre seu papel atual como veterana da equipe e sobre como estes jogos serão diferentes de sua experiência no Rio.

"Eu sou uma veterana, não sou mais uma novata, então será muito diferente. Eu meio que guio as meninas, porque para todas elas será a primeira Olimpíada", observou.

Biles também falou sobre as dificuldades de competir em meio às restrições por causa da pandemia.

"Acho que vai ser realmente difícil. Porque eu nunca competi sem público e nunca competi sem minha família presente, então vai ser diferente. Mas sei que eles estarão lá em espírito", disse.

Quando voltar de Tóquio, ela não pretende participar do circuito de eventos comemorativos promovido pela USA Gymnastics e planeja embarcar em uma turnê própria por 35 cidades, em celebração a atletas femininas.

O roteiro terá o nome de Gold Over America Tour ("Turnê Ouro Sobre a America", em tradução livre), ou GOAT. A sigla é a mesma do apelido pelo qual Biles é chamada pelos fãs: Greatest Of All Time, ou A Melhor de Todos os Tempos.

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