Adolescente jogando vídeo game

Os pais não devem apresentar os jogos eletrônicos, mídias sociais e outros dispositivos eletrônicos sempre como vilões. Os adultos precisam ajudar, se fazendo presentes, para explicar o que são situações e representações fictícias em comparação com as expectativas sociais da vida real

Freepik
Supervisionar o consumo dos jogos on-line e avaliar a maturidade do adolescente frente a essa prática são hábitos indispensáveis que pais e responsáveis precisam adotar para extrair o potencial positivo do universo dos games. Quando utilizados indiscriminadamente, os jogos podem causar distúrbios do sono, inatividade física, transtornos de humor e até a 'gaming disorder', caracterizada como dependência de uso recorrente e persistente da internet para games.

Recentemente, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) divulgou a pesquisa "Adolescentes, Jogos Eletrônicos e Gaming Disorder". No estudo, a entidade recomenda fortalecer as conexões familiares para tornar os jogos mais seguros. O cuidado é importante, já que, por vezes, os filhos, principalmente os pré-adolescentes, não têm capacidade de contextualizar o conteúdo de alguns games. 

“Alertamos para que os pais não assumam uma postura maniqueísta, apresentando jogos eletrônicos, mídias sociais e outros dispositivos eletrônicos sempre como vilões. Os adultos precisam ajudar, se fazendo presentes, para explicar o que são situações e representações fictícias em comparação com as expectativas sociais da vida real, ressaltando sempre a importância do respeito aos valores éticos”, recomendam os especialistas do Departamento de Medicina do Adolescente da SBP, responsáveis pelo estudo. 

Efeitos benéficos 

É fundamental entender que os instrumentos tecnológicos são, em princípio, “neutros”; e que adquirem significado “positivo ou negativo” conforme seu uso. 

Diferentes pesquisas relacionam os jogos digitais com uma série de desfechos positivos: estímulo ao desenvolvimento cognitivo e motor; aprimoramento de habilidades sociais, como trabalho em equipe, liderança, negociação, comunicação e autossuperação; além dos sentimentos de satisfação e lazer oriundos do entretenimento. Também não há evidências de que os games, quando utilizados de forma adequada, afetem negativamente a proximidade familiar e o engajamento escolar.

“Ao invés da passividade proposta pela tela que exibe um programa de TV ou uma série, no jogo o indivíduo faz parte de uma experiência ativa, compartilhada, em que toma decisões o tempo todo e arca com as consequências delas. Os chamados "exergames", junção dos conceitos de exercício físico e games, são um exemplo promissor para a promoção de comportamentos benéficos. Os "exergames" de dança já são altamente populares entre os jovens e têm potencial para aumentar a prática de atividade física em pacientes previamente sedentários”, destacam os pediatras.

Perigos 

Entre as repercussões negativas, a mais recorrente é a diminuição da quantidade e da qualidade do sono em função do uso dos jogos durante a noite. Jogar nesse horário está relacionado a uma diminuição do sono total e a alterações arquitetônicas no sono. Essa privação do sono, por sua vez, acarreta uma infinidade de outros efeitos indesejáveis à saúde, entre eles, diminuição do desempenho acadêmico, irritabilidade, transtornos de humor e inatividade física. 

Outra questão central tem sido o estímulo dos jogos ao comportamento agressivo. Segundo a SBP, as evidências são suficientes para sugerir que, ao reproduzir vídeos violentos, os jogos podem contribuir para atitudes mais agressivas. No entanto, atribuir violência a videogames violentos desvia a atenção de outros fatores, enraizados em nossa sociedade, que contribuem para a violência.

“Os games reúnem condições para o comportamento tóxico: o anonimato e o elemento competitivo, desenhado para que haja o desejo de vencer, de aniquilar o adversário. Num contexto de excitação dos jogadores, por vezes há gritos, xingamentos e desaforos. Em algumas comunidades, essa agressividade segue sendo um problema, bem como questões como machismo, racismo, homofobia e xenofobia”, ponderam.

Gaming disorder 

A dependência em jogos eletrônicos (gaming disorder) é oficialmente reconhecida como um distúrbio de saúde mental pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O problema é caracterizado quando há, obrigatoriamente, a existência de três fatores centrais, por pelo menos 12 meses, num padrão persistente ou recorrente, sendo eles:

  • Perda de controle (frequência, intensidade e duração) sobre o jogar. Nesses casos, o adolescente joga por mais tempo do que tinha planejado e não consegue parar de jogar na hora estabelecida;
  • Aumento de prioridade dada ao jogar, que se sobrepõe a outros interesses e atividades diárias (sono, alimentação, estudo e relacionamentos);
  • Continuidade ou mesmo aumento da atividade de jogar apesar da ocorrência de consequências negativas. Esse padrão é de intensidade suficiente para resultar em prejuízo significativo em nível pessoal, familiar, social, educacional, ocupacional ou em outras áreas da vida.

Diante desse cenário, é fundamental a qualificação de um pediatra para a correta avaliação do adolescente, pois, a despeito das queixas muitas vezes repetidas pelos pais sobre “filhos que jogam exageradamente”, a maioria deles não vivencia consequências negativas.