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Estado de Minas MUNICÍPIOS

Pequenas cidades de Minas sofrem com falta de médicos

Nada menos que 248 prefeituras, de um total de 339 consultadas pelo Conselho de Secretarias de Saúde, relataram que não têm profissionais suficientes


08/04/2023 04:00 - atualizado 07/04/2023 21:51

ilustração
(foto: Quinho)

Com a retomada anunciada oficialmente pelo governo federal em 20 de março, o programa Mais Médicos voltará a funcionar com novidades, mas encontrará cidades com carências antigas na oferta de serviços de saúde a seus moradores. Levantamento feito pelo Conselho de Secretarias Municipais de Saúde de Minas Gerais (Cosems-MG), a pedido do Estado de Minas, mostra que o cenário no estado é de dificuldade em suprir a demanda pela assistência básica. A sondagem realizada pelo Cosems conseguiu resposta de 339 municípios mineiros acerca da carência de profissionais para atenção básica à saúde. Das secretarias que responderam ao questionário enviado pelo conselho, 248 informaram que não há médicos suficientes para o serviço primário de atendimento, mais de 73% da amostra.

A pesquisa também revelou que 222 municípios afirmaram que há a necessidade de que médicos de outros setores se desloquem para fazer atendimentos nas Unidades Básicas de Saúde, apresentando outra face da carência de profissionais.

Os 248 municípios que alegaram médicos insuficientes também informaram que seriam necessários 611 profissionais para suprir as necessidades de atendimento primário aos moradores. O Ministério da Saúde ainda não divulgou o edital em que informa quantos profissionais serão encaminhados para cada estado, mas a previsão é de abertura de 5 mil vagas imediatas e 28 mil até o fim do ano em todo o país.

Por uma política de proteção de dados do conselho, a lista completa dos municípios respondentes não foi disponibilizada à reportagem. Vale também destacar que a amostragem do levantamento do Cosems não totaliza nem metade das 853 cidades do estado, o que sinaliza que o problema pode ser ainda mais abrangente.

Este é o cenário no qual trabalham os secretários municipais de saúde. A reportagem entrou em contato com gestores de cidades do interior mineiro que relataram a dificuldade em atrair profissionais e, mais do que isso, em mantê-los. Edivaldo Farias da Silva Filho é presidente do Cosems-MG e secretário de Saúde de Berizal, cidade de cerca de 4,8 mil habitantes no Norte de Minas. À reportagem, ele fez um panorama do cenário atual do município e também da região.

“Nós temos uma necessidade devido, principalmente, aos valores pedidos pelos profissionais. Já preenchemos o formulário solicitando um médico e estamos aguardando o edital. A maioria dos 16 municípios aqui na região do Alto Rio Pardo convive com esse problema e espera o relançamento do Mais Médicos. O que acontece é que acaba virando um leilão: as cidades vão aumentando os valores dos salários e competindo umas com as outras pelos médicos que querem trabalhar na região”, explica.

Rotatividade

 Em Fruta de Leite, também no Norte de Minas, o secretário de Saúde Elislânio Flávio Barbosa comenta que a rotatividade dos médicos em cidades do interior é um agravante à já complicada missão de conseguir contratar profissionais. “No interior existe uma rotatividade muito grande. Quando a gente tem o profissional, eles ficam no máximo um ano, fazem residência e vão embora. Poucos médicos querem vir para o interior, mesmo que o salário seja bom. Em Belo Horizonte, por exemplo, tem médico que vive de plantão, tem mais de um emprego e, em uma cidade igual a nossa, ele trabalha exclusivamente no município”, afirma. O secretário da pequena cidade de 5,2 mil habitantes completa dizendo que os altos salários também são um desafio: “Quando as cidades pequenas conseguem contratar, é preciso tirar de outras áreas e acaba onerando a nossa folha”.

Os relatos dos secretários são corroborados pela professora do Departamento de Ciência Política da UFMG Telma Menicucci. A pesquisadora especializada em políticas públicas na área da Saúde destaca que a lógica de mercado da medicina favorece uma concentração espacial de profissionais e dificulta a oferta para municípios pequenos e afastados dos grandes centros. “Temos um problema de concentração de médicos nas grandes cidades onde, além de mais recursos, eles podem acumular empregos e ter salários mais altos. A questão é que não há muitos médicos no Brasil, mesmo nas capitais, há demanda. Então é difícil que esses profissionais escolham se aventurar em locais mais pobres e mais distantes”, comenta a professora.

Outro ponto levantado pela professora é a polêmica causada pela participação de profissionais cubanos no programa, iniciado em 2013, na presidência de Dilma Rousseff (PT). Ela ressalta que a formação em Cuba é focada na atenção básica e familiar e que o país é uma referência em oferecer profissionais para outras nações. “Os médicos brasileiros sempre foram a prioridade, mas não havia oferta, por isso se apelou para os estrangeiros”, completou a pesquisadora.

Críticas 

Apontado por políticos da oposição como favorecimento do regime cubano pelos governos petistas e dos profissionais do país caribenho em detrimento dos brasileiros, o Mais Médicos foi alvo de muitas críticas e, inclusive, passou por transformações durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), que alterou o nome da iniciativa para “Médicos pelo Brasil”.

Durante o lançamento da retomada do Mais Médicos, o tema se fez presente no pronunciamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT): “Nesse momento, o foco está em garantir a presença de médicos brasileiros no Mais Médicos, um incentivo aos profissionais do nosso país. Se não houver quantitativo, teremos a opção de médicos brasileiros formados no exterior. E, se ainda assim não tivermos os profissionais, optaremos por médicos estrangeiros. O nosso objetivo não é saber a nacionalidade do médico, mas a nacionalidade do paciente, que é um brasileiro que precisa de saúde”, disse o petista.

Lucio Alvim, presidente do Cosems-MG na Zona da Mata e secretário de Saúde de Goianá, elogia a participação de estrangeiros no programa do governo federal. Ele também esteve à frente da Saúde de Rio Novo, mesma região do estado, e disse que teve boa experiência com profissionais cubanos. “Eu trabalhei com o programa em 2014 e recebemos três médicos cubanos, excelentes profissionais e que ficaram por mais tempo na cidade. Isso é extremamente importante porque cria um vínculo entre o médico e o paciente e isso é necessário para o atendimento primário

RESUMO DO LEVANTAMENTO DO COSEMS

339
municípios responderam ao questionário (39,7% das cidades mineiras)

222 
(65,5%) apontam necessidade de deslocar profissionais de outras áreas para a atenção básica

248 (73,2%) 
dizem não ter médicos suficientes na atenção primária

611 
médicos são necessários na soma das necessidades apontadas pelos municípios respondentes

Ação para reduzir internações

“O médico de família vai na casa das pessoas, ele trabalha com enfermeiros e agentes comunitários de saúde, faz a prevenção de doenças, a educação sanitária. Se uma atenção primária for boa, resolve a maior parte dos problemas de saúde, evita internações. A atenção primária é a porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS). O médico sozinho não resolve, mas sem médico não se resolve nada”, afirma a professora da UFMG, Telma Menicucci.

A pesquisadora aponta a atenção básica à saúde descentralizada e presente no interior do país como instrumento para que o SUS cumpra sua função constitucional de oferecer atendimento universal aos brasileiros. O objetivo central da atenção básica é fornecer orientação sobre prevenção de doenças, realizar o acompanhamento das condições dos moradores e suas famílias, fornecer atendimento para enfermidades em estágios iniciais e realizar os encaminhamentos para pacientes com quadros mais graves.

Em cidades pequenas, fornecer a atenção básica à saúde pode significar evitar casos graves de doenças pelo acompanhamento dos pacientes e iniciativas de educação sanitária. Esse efeito não é sentido apenas nos municípios, mas também em seu entorno, como explica o secretário de Saúde de Fruta de Leite,  Elislânio Flávio Barbosa.

“Um hipertenso que tem tratamento desde o início, às vezes com alimentação ou um medicamento básico, consegue resolver esse problema. Quando não há essa primeira avaliação, ele não vai saber, não vai ter acompanhamento e isso pode levar a um infarto, uma doença cardíaca. Se o problema não se resolve na atenção primária, se houver uma urgência, a gente sobrecarrega o hospital regional mais próximo, que no nosso caso é em Salinas. Pelos fatos das arboviroses, os hospitais hoje estão sobrecarregados, por exemplo”, destaca.

Edivaldo Farias da Silva Filho, secretário de Saúde de Berizal, reiterou o ponto apresentado pelo colega. Ele destaca a importância de um atendimento básico de saúde para reduzir a necessidade de encaminhar pacientes aos centros de referência regionais. Em estados de grande extensão territorial como Minas Gerais, esse trajeto pode ser crucial no tratamento de um morador.

“Os médicos da atenção básica atendem a população da área deles, em média de 2.200 pessoas por médico em nossa cidade. Além da parte clínica, fazem a prevenção de doenças, o acompanhamento de diabéticos, de hipertensos, por exemplo. Em municípios do porte de Berizal, pequenos e carentes, fazer o trabalho de prevenção é importante para não termos problemas futuros. Estamos a 65 quilômetros do centro de referência micro, em Taiobeiras, e a 320 quilômetros do centro de referência macro, em Montes Claros, então é muito importante que as questões sejam resolvidas sem precisar fazer esse encaminhamento”, destaca.

Retomada do programa

De acordo com o Ministério da Saúde, com os 28 mil médicos distribuídos pelo país até o fim do ano, a expectativa é de que mais de 96 milhões de brasileiros sejam atendidos pelo novo programa Mais Médicos. O investimento previsto neste ano é de R$ 712 milhões. No anúncio do retorno do Mais Médicos, o governo federal apresentou dados informando que 41% dos participantes anteriores do programa desistem dos postos de trabalho em busca de qualificação e capacitação. Diante do fato, o Ministério da Saúde implementou ao novo formato do projeto a possibilidade de que os participantes possam fazer especialização e mestrado. Também foram anunciadas novidades como a compensação para bolsas de estudo durante período de licença maternidade para favorecer a manutenção de mulheres nos cargos e incentivos a profissionais formados com benefício do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies).


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