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Estado de Minas ENTREVISTA

Leninha (PT): 'Conseguimos romper muitas barreiras'

Primeira mulher negra a ocupar a vice-presidência da ALMG fala dos desafios que enfrentará no cargo


06/03/2023 04:00 - atualizado 07/03/2023 08:33

deputada Leninha do PT na Assembleia Legislativa de Minas Gerais
Deputada Leninha (PT) fala dos desafios de ser a primeira mulher negra a ocupar a vice-presidência da ALMG (foto: SARAH TORRES/ALMG)

Primeira mulher negra a ocupar a Mesa Diretora da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Marilene Alves de Souza, mais conhecida como Leninha (PT), é a nova vice-presidente do parlamento mineiro e carrega consigo o desafio de conciliar a gestão política da Casa com a oposição ao governo Romeu Zema (Novo).

 

Nesta entrevista ao Estado de Minas, ela garante que não vai ficar neutra. Mesmo considerando que o tom dessa nova gestão da Assembleia será de conciliação e moderação, a deputada destaca que vai continuar expressando sua opinião e posicionamento enquanto oposição a Zema.

Ela afirma não se sentir representada pelo atual governador do estado. Diz que não vê nas Minas Gerais de Romeu Zema um “modelo de desenvolvimento que tenha o ser humano como centro” das decisões.

 

Para Leninha, ser a primeira mulher negra a ocupar a vice-presidência da Assembleia de Minas em seus 133 anos é muito simbólico. “Significa que conseguimos romper muitas barreiras. Significa que queremos, precisamos e merecemos ter reconhecidos os nossos méritos na construção, na proposição e na consolidação de políticas públicas que garantam a nós mulheres condições de igualdade em todos os espaços da vida social”, diz.

 
Como foi o processo até que a senhora se tornasse vice-presidente da ALMG? Foi preciso muita negociação?
Eu costumo dizer que não ando só. Que cheguei onde cheguei porque tenho, e sempre, contei com o apoio de muitas pessoas. Eu me formei como cidadã e ser político pela participação popular. Na militância e engajamento social. Eu me formei na construção coletiva, que nunca é homogênea.

Lidar com as divergências é práxis dos movimentos sociais. E não foi diferente na Assembleia. Construí o primeiro mandato com muita seriedade, presidi a Comissão de Direitos Humanos e liderei pela primeira vez a bancada feminina da Casa. Creio que tudo isso, mais a forma como me coloco tenha corroborado para a sustentação do meu nome na chapa com o Tadeuzinho, com quem, além de ser conterrânea, construí laços fortes de amizade e respeito.

Penso que a maior dificuldade foi caminharmos para a construção de uma chapa que, mesmo com suas divergências, tivesse como balizador a consolidação do papel do legislativo no dia a dia dos mineiros e mineiras.

A senhora divide a Mesa com partidos que não fazem oposição ao governo e não estão no mesmo lado ideológico que o seu. Como é o diálogo com os diferentes?
Com respeito às nossas divergências, buscando pelo diálogo, caminhos que nos permitam, enquanto poder independente, sermos atuantes, combativos e assertivos na construção de políticas públicas que favoreçam a nossa gente, de modo especial, aqueles e aquelas a quem o estado precisa amparar com maior agilidade e força.

As siglas partidárias, os posicionamentos ideológicos não podem, não devem, impedir que façamos o que é necessário e urgente para o bem-estar da população do nosso estado.

Como conciliar a função, supostamente, mais neutra de vice-presidente da Casa, com a oposição ao Executivo?
Não existe uma posição de neutralidade no meu caso. Nunca deixei de expressar a minha opinião e o meu posicionamento. Existe um perfil moderado, conciliador, mediador, que não só a posição na Mesa Diretora pede, como é de fato a minha personalidade.

Cordialidade não é sinônimo de neutralidade. Serei na Mesa e no parlamento uma oposição responsável ao governo. Meu compromisso em defender o povo das Minas e dos Gerais é o meu balizador. A defesa da vida, dos direitos e garantias conquistados é inegociável em qualquer lugar ou posição que eu ocupo.

Qual o principal desafio que a bancada do PT vai enfrentar nesses próximos quatro anos enquanto oposição ao governo Zema?
Esse é um ponto interessante. O governador foi reeleito em primeiro turno, mas o presidente Lula venceu as eleições em Minas Gerais. Significa que os mineiros e mineiras conseguem separar bem as coisas, Minas Gerais precisa estar inserido, enquanto estado, nas políticas sociais que o presidente Lula já começa a implementar.

Temos, enquanto bancada, o compromisso que o próprio presidente instituiu: combate à fome, investir na educação básica e investir na saúde pública, reconhecendo as urgências desses três pontos.

"Cordialidade não é sinônimo de neutralidade. Serei na Mesa e no parlamento uma oposição responsável ao governo"


Portanto, enquanto bancada, essa é a nossa grande tarefa. Inserir nosso estado em todos os programas e políticas que permitam retirar a nossa gente da extrema miséria, vulnerabilidade e fome e ampliar os investimentos na educação e na saúde.

Você se sente representada, enquanto cidadã, pelo governador Zema e pelo seu governo?
Não me sinto representada pelo governador e nem pelo seu governo. Minha concepção de modelo de desenvolvimento tem o ser humano em sua centralidade e não é o que temos visto em Minas Gerais. Combato, sempre combati todo tipo de empreendimento que exaure terra, água e gente e esses empreendimentos estão avançando por todo o estado.

Primeiro vejo uma grande distopia nesse modelo de gestão. Retirar de forma deletéria do nosso solo, das nossas águas e da nossa sociobiodiversidade o que o temos de mais precioso implica em reduzir a possibilidade de futuro logo adiante. Sou autora de um projeto de lei que reconhece os direitos da natureza como uma prerrogativa para a instalação de empreendimentos como a mineração, silvicultura do eucalipto, entre outros.

O que nós propomos é que haja instrumentos norteadores para que não tenhamos que negociar, barganhar compensações, atenuantes depois dos desastres, como aconteceu em Mariana e Brumadinho. Além disso, vejo o estado muito distante, mínimo mesmo, na vida das pessoas, principalmente daquelas a quem ele precisa acudir. No campo e na cidade, não temos a presença forte e marcante do estado no sentido de fomentar e fortalecer aqueles que precisam da mão do estado.

Para a senhora, o que significa ser a primeira mulher na vice-presidência da ALMG?
Uma honra e uma responsabilidade muito grande. Ser a primeira mulher negra, periférica a estar na vice-presidência da Assembleia de Minas em seus 133 anos é muito simbólico. Significa que conseguimos romper muitas barreiras. Significa que queremos e podemos muito mais do que lugar de fala.

Queremos, precisamos e merecemos ter reconhecidos os nossos méritos na construção, na proposição e na consolidação de políticas públicas que garantam a nós mulheres condições de igualdade em todos os espaços da vida social. Significa muito para mim, uma bióloga, professora, sindicalista, militante dos direitos humanos e da natureza.

Significa que a trajetória de lutas de uma vida inteira, não só minha, mas de tantas milhares de mulheres estado adentro e afora está representada neste assento. Quando me coloco neste lugar, essas mulheres todas dividem comigo essa tarefa que aceitei desempenhar.

E qual é o seu maior objetivo enquanto vice-presidente da Mesa Diretora? Há algo específico?
São muitos os desafios que temos na Casa. Penso que avançamos muito, e quero aqui pontuar o mérito da legislatura anterior, de modo especial o trabalho do deputado Agostinho Patrus na condução da Assembleia. Penso que a luta pela independência da Casa tenha começado com ele, que foi firme no sentido de não permitir que houvesse um atrelamento, um aparelhamento do parlamento junto ao executivo estadual.

A luta pela liberdade é componente do nosso DNA. Então, desse modo, penso que temos como missão contribuir para a proposição de projetos, ações mais efetivas, práticas e resolutivas para o dia a dia das pessoas. Isso para mim é um ponto de ordem.

A política precisa fazer sentido na vida das pessoas, do transporte público à ida no sacolão, a compra do remédio, tudo é política e tudo pede a presença de um estado que cuide das pessoas. A representação política também precisa ser pautada por esse viés. Colocarmos em discussão um novo modelo de desenvolvimento do estado é para mim essencial.

Não podemos continuar fadados à mineração predatória. Fortalecer as instituições e não sucumbir o estado à iniciativa privada. Minha luta enquanto vice-presidente da Assembleia é a defesa e a consolidação de um estado forte na melhoria da qualidade de vida da nossa gente.

Como única mulher negra na Mesa Diretora, a senhora se sente um pouco isolada? 
Não me sinto isolada na Mesa. Ao contrário. Estou na Mesa porque questões como o combate ao racismo, a misoginia e transfobia precisam ser debatidas exaustivamente. Somos um país e um estado conservador, violento com o povo negro, com as mulheres e com a comunidade LGBTQIA+.

Precisamos vencer o preconceito e a violência em todos os espaços da vida, inclusive, no parlamento e não estou só nessa luta. Precisamos de políticas públicas de proteção e, sobretudo, de apoio às mulheres, ao povo negro e à comunidade LGBTQIA.

Inclusive, penso que um primeiro e importante passo é parar de colocar esses grandes grupos como minorias. Não são. São sujeitos de direitos e deveres para os quais o estado ainda tem muito o que fazer.


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