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Estado de Minas

Donos de Lava a jato aprendem a conviver com piadas sobre a operação da Polícia Federal

Eles só não acham graça da crise econômica que os negócios enfrentam


postado em 27/03/2016 06:00 / atualizado em 27/03/2016 07:47

"Já vi o pessoal falando, 'muda o nome aí. Esse negócio de lava a jato parece que você está sendo investigado'" Daniel Caixeta Nogueira, dono de lava a jato no Bairro Floresta (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
“Oh, Paulinho, você está no lava a jato? Então toma cuidado que a polícia está indo aí.” Responsável há uma no e quatro meses pelo Lava a Jato do Paulinho, no Bairro Floramar, Região Norte de Belo Horizonte, Paulo Lima, de 36 anos, já está acostumado com as brincadeiras que misturam seu negócio com a Operação Lava-Jato da Polícia Federal, responsável por revelar enorme esquema de corrupção que assola o país. “Ah, rapaz, eu estou aqui trabalhando e você me ligando para falar besteira”, retruca Paulo ao amigo, que não é o único a fazer piadas relacionando a operação policial com o comércio especializado em limpeza de carros.


Mas as consequências da Lava-Jato, que agravam a crise política no Brasil sem dar trégua à economia, que vai mal, são sentidas diretamente no Lava a Jato do Paulinho e em muitos outros da cidade. “Estava agora mesmo falando com o meu contador sobre isso. Estou há três meses no vermelho”, afirma Paulo Lima. “Bem que esse pessoal da Lava-Jato poderia mandar um pouco de dinheiro aqui para a minha conta”, brinca. Ao contrário da intensa movimentação política provocada pela Lava-Jato, o movimento no lava a jato do Paulo caiu cerca de 60% este ano. Se antes ele recebia de 10 a 12 carros por dia para serem limpos, atualmente são quatro ou cinco. “Cliente que lavava o carro três vezes por semana, agora só lava uma”, lamenta, acrescentando: “Acho que é falta de dinheiro mesmo”.


“O pessoal zoa de vez em quando, mas o dinheiro dos desvios não aparece. Aqui não chegou”, se diverte com as piadas Glen Miller de Carvalho Júnior, de 25 anos, que há três trabalha no Lava a Jato do Dinho, no Bairro Tupi, também na Região Norte. O estabelecimento funciona há cerca de sete anos e vive atualmente seu pior momento. Até a crise hídrica foi superada com o uso da água de uma cisterna, que até hoje é a fonte de lavagem dos carros. “Está fraco. Caiu muito. Essa crise pegou todo mundo”, continua Glen, conhecido como Juninho. Ele conta que o lava a jato chegou a receber cerca de 10 carros por dia durante a semana, mas atualmente atende de três a cinco. “No sábado, que é o melhor dia, às vezes chega a 15, mas antes eram 25, 30”, afirma. “Queria saber pra onde está indo esse dinheiro”, acrescenta, fazendo referência novamente à operação da Polícia Federal.

“Já vi o pessoal falando ‘muda o nome aí. Esse negócio de lava a jato parece que você está sendo investigado’”, afirma Daniel Caixeta Nogueira, dono do Lava a Jato Floresta Car Wash, na Região Leste de BH. Ele está há quatro anos neste ramo de serviço e, em vez de mudar o nome da empresa, precisou foi mexer no quadro de pessoal. Dos cinco funcionários, chegou a ficar com apenas dois no fim do ano passado. Este ano contratou mais um para poder pessoalmente dar mais atenção aos clientes, e, por enquanto, não pensa em voltar a compor a folha. “Um ano excelente foi 2014. Mas tudo que ganhei em 2014, perdi em 2015. Antigamente, aos sábados, quando eu lavava pouco eram 15 carros. Hoje, quando lavo muito, são 10”, compara. “E este ano, janeiro, que tradicionalmente é um mês bom, também foi muito ruim por causa da chuva”, explica Daniel, dizendo que seu faturamento caiu cerca de 25%.

INTEMPÉRIES Sim, a chuva. Se a Polícia Federal não para, São Pedro também não. E não aceita propina. Se o período de seca prolongada foi complicado para os lava a jato devido à ameaça de falta de água, o de chuvas prolongadas também não é bom. “O movimento caiu. Por causa da crise na economia, da crise hídrica e da chuva, que afugenta os clientes. Este mês está muito fraco”, afirma Reginaldo Rocha, sócio do Lava a Jato Bandeirantes Car Service, no Bairro Mangabeiras, na Região Centro-Sul. “Estamos esperando voltar o sol para melhorar. Para os outros problemas, não tem jeito, não dependem da natureza, mas da política”, comenta, considerando que o movimento no lava a jato caiu de 30% a 40%. O que compensa são os outros serviços oferecidos pelo estabelecimento, como revitalização da pintura e polimento. “São serviços mais caros e que, com a chuva, o pessoal acaba fazendo”, explica.
"Na crise hídrica, muita gente deixou de lavar por causa da consciência em relação à água. Mas, agora, está pior" João Galhardo, dono de lava a jato no Bairro Nova Floresta (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)

“Na crise hídrica, muita gente deixou de lavar por causa da consciência em relação à água. Mas, agora, está pior”, relata João Galhardo, dono do Lava a Jato AutoCenter Nova Floresta, na Região Leste. Ao falar sobre a crise no Brasil, diz que não aguenta mais ouvir sobre a Operação Lava-Jato. No ramo de limpeza de carros há um ano e meio, ele conta que seu movimento caiu 40%. “Até que 2015 foi bom; 2016 está pior. Caiu muito”, afirma. Há cerca de um ano, a demanda aos sábados chegava a 30 carros, hoje é de 18. E nem promoção resolve. “Em dezembro, fiz uma promoção, mas não adiantou. A gente até desanima. Está tudo muito estranho”, comenta.

REAPROVEITAMENTO

Enquanto a Operação Lava-Jato vai atrás de quem lava dinheiro, parte do sucesso do Lava a Jato Sion está na “lavagem da água”. Na contramão da crise, o lava a jato foi inaugurado em setembro de 2015. O gerente Ricardo Teixeira de Paiva, de 23, que trabalha no ramo desde os 16 com o dono do estabelecimento – que tem outros lava a jato na cidade –, acredita que um dos motivos de a empresa não sentir os efeitos da crise no país é o fato de ter investido no tratamento da água. Ele explica que toda o líquido usado na limpeza dos carros é tratado e cerca de 90% são reaproveitados. Depois que o carro é lavado, a água entra por canos subterrâneos e vai até uma caixa. De lá é puxada para galões de tratamento, onde é literalmente lavada com produtos químicos. Já limpa, passa por mangueiras e sai novamente na máquina de pressão usada para remover a sujeira dos carros. Mesmo com todo esse trabalho, Ricardo não está livre das piadas. “Teve uma pessoa que disse uma vez: ‘Fica esperto que senão a polícia vai aí porque aí tem lava a jato’”, lembra ele.

 

A origem da lavagem

 

A Operação Lava-Jato, maior investigação de desvio e lavagem de dinheiro da história do Brasil, completou dois anos este mês. Ela recebeu este nome porque o esquema suspeito que deflagrou a ação usava rede de postos de combustíveis e lava a jato de automóveis para movimentar recursos ilícitos pertencentes a uma das organizações criminosas inicialmente investigadas, comandadas por doleiros. O posto que deu origem às investigações fica no Distrito Federal e, apesar de as ações da Polícia Federal terem avançado para a política e para grandes empresas, como a Petrobras e as maiores construtoras do país, o nome inicial se consagrou.


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