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Estado de Minas

Frase 'Que país é este?' ganha novo contexto nos protestos de rua

Cunhada por Francelino Pereira quando comandava a Arena em 1975 e imortalizada por Renato Russo, a pergunta já dura quatro décadas


postado em 12/04/2015 06:00 / atualizado em 12/04/2015 07:38

Assessora de Francelino, Marluce Fonseca mostra o quadro com o poema de Affonso Romano de SantAnna, publicado em 1980(foto: ARQUIVO EM/D.A PRESS )
Assessora de Francelino, Marluce Fonseca mostra o quadro com o poema de Affonso Romano de SantAnna, publicado em 1980 (foto: ARQUIVO EM/D.A PRESS )

Bastante frequente em festivais de rock, a música Que país é este, composta por Renato Russo, da banda Legião Urbana, virou presença líquida e certa na cena política recente. De um mês para cá, a frase tem estampado faixas em protestos, servido de grito de guerra de manifestantes e até deu nome a uma das fases da Operação Lava-Jato, que investiga o esquema de propina na Petrobras. Mas pouca gente sabe que é justamente na política, há exatos 40 anos, e em meio à ditadura militar, que a expressão tem origem. Em 1975, três anos antes de Russo escrever a canção, o ex-governador de Minas, Francelino Pereira – então presidente nacional da Aliança Renovadora Nacional (Arena), partido ligado aos militares – fez a famosa pergunta: “Que país é este?”.

Abraçada agora por movimentos contrários ao governo da presidente Dilma Rousseff (PT), a frase surgiu num contexto totalmente diferente. O questionamento de Francelino foi uma crítica direta aos que punham em dúvida o compromisso do então presidente da República, Ernesto Geisel (1974-1979), de promover a abertura política e a transição da ditadura para a democracia. “Que país é este que o povo não acredita no calendário eleitoral estabelecido pelo próprio presidente?”, disse Francelino, na época deputado federal, em reunião com políticos.

Passadas quatro décadas e depois de 50 anos de vida pública, Francelino, que encerrou a carreira política como senador, em 2003, está recolhido em seu apartamento no Bairro de Lourdes, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte. O peso da idade – em julho, ele completa 94 anos – não lhe permite lembrar do episódio, e quem conta a história em detalhes é Marluce Fonseca, de 63, assessora do político há 44 anos. “Como era presidente nacional do partido, Francelino tinha autoridade para falar em nome de Geisel. Já estavam no período de transição, mas as pessoas não acreditavam que Geisel cumpriria com a retomada da democracia”, conta Marluce.

De fato, a redemocratização só ocorreu 10 anos depois, em 1985, e demorou mais que o prometido por Geisel, famoso por dizer que a abertura viria de forma “lenta, gradual e segura”. Mas a frase de Francelino, piauiense que construiu a maior parte da carreira em Minas, teve tanta repercussão que estampou manchetes e, usada em outras circunstâncias, inspirou charges, poemas, a música de Renato Russo e até rendeu o nome de um capítulo na biografia Francelino Pereira: o chão de Minas.


MEMÓRIA “Muita gente usou essa frase. Francelino é uma pessoa muito simples e nunca reivindicou a autoria”, afirma Marluce, para quem o chefe sempre foi um homem “com jogo de cintura para fazer política”. Recortes de jornal, fotografias, livros e tudo o que remete à história do ex-governador que, indicado por Geisel e escolhido pelo colégio eleitoral, comandou Minas de 1979 a 1983, estão reunidos em seu escritório particular em BH. É a leal assessora a responsável por organizar tudo.

Na parede da sala, um quadro traz a estampa do poema de Affonso Romano de Sant’Anna, com título Que país é este? e publicado em 1980. A frase é o fio condutor para falar da história do Brasil desde a colonização. Dois anos antes do poema de Romano, em 1978, Renato Russo compôs a letra de mesmo nome. Mas a canção foi lançada apenas em 1987, já na redemocratização, quando José Sarney governava o país. “Francelino sempre achou a música linda, tem o CD do Legião Urbana e vivia escutando”, diz a assessora.

Com a autoridade de quem trabalhou uma vida ao lado de Francelino e até hoje frequenta diariamente a casa do político, Marluce diz que, se a idade lhe permitisse compreender melhor a realidade atual, ele estaria feliz com o fato de manifestantes adotarem a frase em atos de movimentos contrários ao governo. “Tenho certeza de que ele ficaria orgulhoso”, afirma.

 

Personagem da notícia

Francelino Pereira - Ex-governador de Minas


Francelino Pereira (E) em reunião com o então presidente Geisel, na década de 1970(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A PRESS)
Francelino Pereira (E) em reunião com o então presidente Geisel, na década de 1970 (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A PRESS)

 

Advogado, formado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Francelino Pereira dos Santos, de 93 anos, construiu extensa carreira política em 50 anos dedicados à vida pública. De 1950 a 1955, foi vereador em Belo Horizonte e, na sequência, trabalhou diretamente com José de Magalhães Pinto, que governou Minas na década de 1960. Francelino também foi deputado federal, cargo que ocupou por 16 anos, de 1963 até 1979, quando se tornou governador biônico. Na época, as eleições eram indiretas. Francelino, filiado à Arena, partido que dava sustentação ao regime militar, foi indicado pelo presidente Ernesto Geisel e escolhido pelo colégio eleitoral com 1.318 votos, contra 142 de seu oponente, o deputado João Ferraz. “O maior sonho dele era ter sido eleito por voto direto no governo de Minas. Não gostava de ser ‘biônico’”, conta a assessora de Francelino, Marluce Fonseca. Depois de dirigir empresas e órgãos públicos, o político venceu as eleições para o Senado, onde ocupou cadeira de 1995 a 2003.


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