
“Conversas com Cézanne” foi lançado originalmente em 1978 pela editora francesa Macula, e já foi traduzido para o inglês, italiano e espanhol. Ele é dividido em duas partes, chamadas de “Documentos” e “Interpretações”, com textos que mostram o comportamento paradoxal do pintor em sua fase final da vida, entre 1894 e 1906, quando o humor de Cézanne alternava entre um nervosismo amargurado e uma autenticidade apaixonante. Na primeira seção, os testemunhos estão classificados por ordem cronológica conforme a data da visita ou dos encontros que descrevem. Já na segunda, Maurice Denis, Émile Bernard e Joachim Gasquet procuram estabelecer um perfil do artista.
O professor, pintor e desenhista Paulo Pasta, doutor em artes visuais, afirma no posfácio do livro: “O Cézanne que emerge dessas conversas e testemunhos é, sem dúvida alguma, a figura excepcional da pintura moderna, a um tempo sábio, resoluto e profundamente desconfiado de si e dos outros. ‘Sou o mais infeliz dos homens’, chega mesmo a declarar [...]. Talvez o teor dessa confissão se deva, sobretudo, à percepção de sua tarefa sem fim, da permanente dúvida que o acompanhava, e que seria, ela também, princípio formador da modernidade”, destaca.
Considerado um dos maiores especialistas na obra de Cézanne, Michael Doran explica que o objetivo do trabalho não é rivalizar com as biografias feitas por Gerstle Mack e John Rewald, e inclusive diz que o leitor deve tê-las à mão, mas “simplesmente oferecer ao verdadeiro apreciador de Cézanne um acesso fácil a documentos importantes”. O volume inclui notas introdutórias e explicações curtas a respeito de alguns pontos que podem despertar a curiosidade durante a leitura. Além disso, detalha questões de ordem teórica ou estética que são levantadas por Cézanne ou mesmo por seus interlocutores.
As cartas enviadas ao pintor pós-impressionista Émile Bernard, por exemplo, mostram um lado excêntrico e inquieto de Cézanne, oferecendo, mesmo para quem não conhece a fundo sua obra, as perspectivas de um homem com uma grande maturidade artística. As concepções estéticas e a geometrização de suas composições, através da técnica dos cilindros, cones e esferas, estão presentes nas conversas do pintor francês. O livro prova que, se o trabalho de Cézanne foi incompreendido durante muitos anos, seu entusiasmo e amor pela arte o colocaram definitivamente entre os maiores nomes da arte moderna.
TRECHO DO LIVRO
“Assim, dentre os pintores que são grandes, Paul Cézanne pode ser colocado como um místico, pois é lição de arte o que nos dá, ele vê as coisas por si mesmas, mas por sua relação direta com a pintura, ou seja, com a expressão concreta de sua beleza. Ele é um contemplativo, observa esteticamente, não objetivamente; exprime-se pela sensibilidade, ou seja, pela percepção instintiva e sentimental das relações e acordes. E como assim sua obra faz fronteira com a música, podemos repetir de maneira irrefutável que é um místico, sendo esse último meio o supremo, o do céu. Toda arte que se musicaliza está no caminho de sua absoluta perfeição. Na linguagem ele se torna poesia, na pintura torna-se beleza.”

“Conversas com Cézanne”
Michael Doran (org.)
Editora 34
320 páginas
R$ 66